Cotidiano

Venezuelanos podem pedir refúgio e residência temporária em Pacaraima

Antes imigrantes precisavam viajar até Boa Vista para solicitar regularização no país, na sede da Superintendência da Polícia Federal

Está em funcionamento, desde o início da semana em Pacaraima, o Posto Ampliado de Triagem para identificação, regularização e imunização de imigrantes venezuelanos. A estrutura renovada e ampliada foi uma das muitas cenas que o presidente da República, Michel Temer (MDB), não viu por não ter ido à fronteira com a Venezuela durante visita a Roraima.

Temer não viu, por exemplo, que um imigrante venezuelano, de 28 anos, aguardava há uma semana atendimento no Posto de Triagem. O estrangeiro trabalhava em um hotel de Caracas, onde deixou o pai e a mãe, e cruzou a fronteira em busca de emprego. “Vim de ônibus até a fronteira. Tenho dinheiro para chegar até Boa Vista. Depois não sei”, contou.

Assim como o jovem venezuelano, outras dezenas de conterrâneos chegam todos os dias à Pacaraima e são atendidos no Posto de Identificação, da Polícia Federal, e depois no de Triagem, onde o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), agência da ONU para Refugiados, atua em parceria com o Exército Brasileiro.

Segundo o assistente sênior de proteção e responsável pelo Acnur no Posto de Triagem em Pacaraima, Rafael Viana Levy, a agência têm três principais atividades na fronteira. “A primeira é prestar informações às pessoas que chegam sobre quais as possibilidades que têm no Brasil, tanto para regularização migratória quanto para solicitar o refúgio. Explicamos quais os direitos e os deveres ali no Posto de Identificação, onde a Polícia Federal autoriza a entrada das pessoas, sejam turistas, refugiados ou para residência temporária”, explicou.

A segunda função do Acnur, conforme Rafael, é registrar os imigrantes em um banco de dados global do Acnur. “A gente registra essas pessoas com objetivo de identificar se elas têm alguma necessidade de proteção, alguma vulnerabilidade que precise de encaminhamento imediato. Caso ela vá a Boa Vista ou a qualquer outro país e precise de abrigamento, nós já teremos essa informação”, comentou.

Auxiliar a Polícia Federal na emissão da documentação é o terceiro pilar do Acnur em Pacaraima. “Um solicitante de refúgio no Brasil precisa preencher um formulário do Conare [Comitê Nacional para os Refugiados]. É um documento em espanhol, de 12 páginas. Temos equipe para auxiliar no preenchimento do formulário e facilitar todo o processo”, disse Rafael se referindo à equipe de 15 a 20 pessoas que o Acnur mantém na fronteira.

Em média, a Polícia Federal atende 150 pessoas por dia. Até o mês passado, todo esse processo – de solicitar refúgio ou residência temporária – era feito em Boa Vista, na sede da Superintendência da Polícia Federal. “O Posto de Identificação é uma ampliação do antigo posto da PF. Agora ficou mais fácil para a autoridade migratória trabalhar, pois a capacidade foi ampliada, e ela pode focar no processo, enquanto nós apoiamos com informação e orientação, reforçou Rafael.

O ACNUR – Para o assistente sênior de proteção do Acnur em Pacaraima, o trabalho da agência é, sobretudo, de proteção. “Nosso mandato principal é de proteção aos refugiados. Estamos aqui para apoiar as autoridades brasileiras e garantir que todas as pessoas que estão chegando, que já estão aqui em Pacaraima e que precisem de alguma atenção recebam o encaminhamento adequado. Estamos tentando apoiar o governo brasileiro junto com as outras agências da ONU – Organização Internacional de Migração, Fundo de População das Nações Unidas e Fundo das Nações Unidas para a Infância – para responder de forma eficiente tanto às necessidades da população que está chegando quanto também da população que está acolhendo. Cuidar para que esse fluxo seja controlado e a gente consiga atender as demandas de ambos”, afirmou.

 

Rejeitar vacina não impede entrada no Brasil

 

No Posto de Identificação, os imigrantes são orientados a ser vacinados, caso não apresentem o cartão de vacina, o que não é obrigatório. O responsável pelo Acnur no Posto de Triagem em Pacaraima, Rafael Viana Levy, explicou que a legislação brasileira não impede a entrada do solicitante de refúgio caso ele não queira ser vacinado.

“A legislação brasileira é um ótimo exemplo, baseada nas melhores práticas internacionais. O solicitante de refúgio está fugindo de uma situação que o impossibilita de continuar no país de origem. Quando ele chega ao Brasil, a principal garantia é a da não devolução. Por isso que a lei brasileira permite que ele faça o pedido, mesmo que não tenha nenhum documento em mãos”, frisou Rafael.

O assistente sênior de proteção do Acnur comentou ainda que o estrangeiro pode ter uma crença e não querer a vacina, mas isso não vai impedir a solicitação de refúgio. “Nossa equipe apoia e esclarece a essas pessoas a importância da vacinação. O que a gente vê na prática é que a maioria das pessoas toma a vacina. São excepcionais os casos de a pessoa se recusar”, disse.

 

Imigrantes formam filas em busca de atendimento

 

A demanda reprimida é um dos desafios do Acnur em Pacaraima. São pessoas que já moram na cidade e, antes da abertura do Posto de Triagem, não tinham como viajar até Boa Vista para solicitar o refúgio ou a residência temporária. “A gente fez um acordo com a população de que a atenderia em três dias da semana: segunda, quinta e sábado. Esta quinta foi um dia com grande demanda. Então tivemos que conversar com eles para buscar uma solução e atendê-los de forma eficiente”, explicou o responsável pelo Acnur no Posto de Triagem em Pacaraima, Rafael Viana Levy.

O foco do Acnur é que a pessoa que chegou da Venezuela consiga dar entrada no documento no mesmo dia. “O imigrante já vai fazer o pedido de refúgio, o CPF para pedir carteira de trabalho posteriormente, o registro no Acnur e, se tiver alguma vulnerabilidade, já vamos saber. Mas ainda precisamos resolver a demanda reprimida, o que chamamos de passivo”, disse.

Cerca de 500 indígenas Warao estão no abrigo Janokoida

Indígenas Warao de todas as idades vivem desde o ano passado no abrigo Janokoida (Casa Grande, no dialeto Warao), em Pacaraima. São cerca de 500 crianças e adultos dividindo um grande galpão, onde foi instalado um redário, e algumas barracas da Defesa Civil nacional.

A Fraternidade – Federação Humanitária Internacional é responsável pelo abrigo, que conta com auxílio do Exército Brasileiro e do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, agência da ONU para Refugiados. O Janokoida é o único abrigo existente em Pacaraima, mas há nos planos do Exército a intenção de criar um novo abrigo.

Pela manhã, as crianças vão à escola, ali perto. De tarde, passam o tempo jogando vôlei ou assistindo TV. Os adultos são responsáveis por fazer a própria comida, com alimentos doados pelo Exército, em fogo à lenha improvisado no chão de terra, espalhando fumaça pelo céu. A sujeira é uma das principais reclamações dos militares. “Temos que falar três ou quatro vezes para que os indígenas atendam ao nosso pedido de jogar o lixo na lixeira”, comentou um dos militares. (V.V)