Com o objetivo de destacar a necessidade de reforçar a atenção do governo federal junto aos povos originários da Venezuela que estão no Brasil, uma comitiva formada por lideranças indígenas transfronteiriças de Roraima entregou uma carta aberta à ministra dos Povos Indígenas Sônia Guajajara. A entrega ocorreu nessa quinta-feira (25), durante o II Seminário sobre Direitos dos Povos Indígenas, na Câmara dos Deputados, em Brasília.
“Hoje entreguei a carta da minha comunidade Warao Ajanoko nas mãos da Ministra Sônia Guajajara com a expectativa de que nos dê uma resposta positiva sobre as demandas que apresentamos na carta. Dentre elas, que a nossa comunidade seja reconhecida como comunidade brasileira, para que tenhamos todos os benefícios enquanto indígenas que somos e ter o reconhecimento da Funai [Fundação Nacional dos Povos Indígenas]”, comentou Diolimar Tempo, vice-presidenta da comunidade.
O documento entregue à ministra é assinado pelas lideranças de Tarau Paru e Sakaomota, localizadas na Terra Indígena São Marcos, em Pacaraima; e da comunidade Warao Ajonoko, no município de Cantá. Essas comunidades somam uma população de ao menos 1,5 mil pessoas, entre brasileiras e venezuelanas.
A dificuldade de acesso a direitos é uma realidade de indígenas naturais do Brasil, mas é sentida de maneira mais intensa pelos povos em processo de deslocamento forçado, devido à lacunas legais e ausências de políticas públicas pensadas para esses sujeitos, como é o caso da população que vive nessas comunidades transfronteiriças localizadas em Roraima.
A carta reúne as cartas escritas por cada região representada, com demandas das comunidades indígenas locais que enfrentam desafios complexos, incluindo ameaças à preservação de suas tradições culturais e à garantia de acesso a serviços básicos, como saúde e educação.
“Precisamos seguir firmes, defendendo todos os nossos direitos, trazendo sempre a demarcação das terras indígenas como essa prioridade que garante a dignidade, a segurança e a vida dos povos indígenas. Seguimos juntos para que a gente traga a proteção para os territórios indígenas e a segurança para as nossas lideranças”, reforçou Guajajara.
Acampamento Terra Livre
Desde segunda-feira (22), assessores da Cáritas Brasileira acompanham as lideranças das comunidades indígenas transfronteiriças, durante o 20° Acampamento Terra Livre, em Brasília. Na agenda, Diolimar Tempo (Warao Ajanoko), Dixon Tello (Tarau Paru) e Selva Taurepang (Sakaomota) participam de plenárias e entregam as cartas elaboradas pelas próprias comunidades representadas para autoridades públicas.
Além da ministra Sônia Guajajara, receberam as cartas a deputada federal Célia Xakriabá e o deputado federal Zé Haroldo Cathedral. Na terça-feira (23), o deputado federal Túlio Gadelha convidou as lideranças para espaço de fala na plenária sobre a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental, na Câmara dos Deputados.
O processo para encaminhamento desses diálogos junto ao poder público federal, se iniciou com ação de incidência nas comunidades indígenas, como forma de mediar a construção de uma Carta Aberta para que essas pudessem trazer as suas demandas.
Na comunidade indígena Tarau Paru, na região do Alto São Marcos, município de Pacaraima, a carta cita que proteger as terras ancestrais não é apenas sobre preservar recursos naturais. “Na verdade, é a melhor maneira que todo governo pode contribuir aos esforços globais de combate às mudanças climáticas, conservação da biodiversidade e promoção do desenvolvimento sustentável”.
Também em Alto São Marcos, a comunidade Sakaomota pontua sobre a falta de assistência à saúde pública à população. “Atualmente, a comunidade conta com um posto de saúde feito pelos membros da comunidade, em parceria com o Unicef, que deu a contrapartida realizar o posto de saúde que não está reconhecida pela instituição governamental competente na área. Diante disso, desejamos que o posto de saúde seja reconhecido [requeremos médico e medicamentos necessários]”.
Em Warao Ajanoko, no município de Cantá, a comunidade que foi consolidada por povos Warao e Kariña, solicita assistência social, para que “tenhamos um lugar digno para viver, espaço para realizar práticas tradicionais e culturais – gerando retornos e emprego digno – que tenhamos recursos naturais para satisfazer as nossas necessidades, que tenhamos uma educação específica e saúde diferenciada – que reconheçam nossos medicamentos tradicionais da etnia Warao”.
A diretora-executiva da Cáritas Brasileira, Valquíria Lima, comenta que a participação da entidade no Abril Indígena, no ATL, reforça o fortalecimento das lutas, das construções das estratégias, da incidência política e na busca por uma sociedade que cada vez mais reconheça a importância dos povos originários.
“Acreditar na cultura do bem viver é acreditar na história, na importância da vida dos povos originários e é por isso que nós estamos aqui, participando do ATL [Acampamento Terra Livre]. No ano em que nossa Constituição Federal completa 35 anos, a gente ainda tem muito o que lutar”, concluiu.