Quem anda por Boa Vista pode facilmente notar uma preocupante realidade envolvendo os imigrantes venezuelanos com crianças. Nos semáforos, está voltando a presença de estrangeiros limpando para-brisas de carros, inclusive acompanhados de mulheres com bebês nos braços que oferecem algum produtor para vender, a exemplo de panos de prato.
Nas lanchonetes e bares do Centro, especialmente no Complexo Ayrton Senna, é cada vez maior o número de mulheres venezuelanas com crianças vendendo algo durante à noite. São famílias inteiras que, na negativa de compra dos seus produtos, pedem dinheiro dos clientes desses estabelecimentos.
Até no shopping mais movimentado da cidade iniciou recentemente uma movimentação de jovens venezuelanas com bebês – inclusive adolescentes com recém-nascidos – pedindo dinheiro. Para driblar a intervenção de seguranças, elas usam carrinhos de bebês para simular que estão apenas passeando, mas elas abordam as pessoas pedindo qualquer tipo de ajuda financeira.
Significa que está em andamento a ampliação de um problema social que parecia estar sob controle depois da explosão da migração venezuelana, alguns anos atrás. Novamente surgem crianças no cenário de rua e de pedintes utilizando crianças nos locais movimentados da Capital, que inclusive também é uma preocupação sob a perspectiva da legislação brasileira de defesa da infância.
Crianças em situação de rua significam que desde cedo elas passam a viver uma situação de permissividade absoluta, o que significa estarem sujeitas a todos os tipos de exploração, inclusive uma possível porta de entrada para o mundo das drogas em um Estado onde prolifera o narcogarimpo controlado pelo crime organizado internacional.
É preciso que entidades e autoridades estejam atentas a esta realidade. Inclusive existe um estudo divulgado por pesquisadores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que alertaram, ainda no ano passado, para a persistente crise migratória na fronteira de Roraima com a Venezuela e que apontam ações emergenciais a serem implementadas pelo poder público e pela sociedade civil.
Esse relatório é intitulado “Fronteira em Crise: uma Avaliação da Situação Migratória em Roraima”, produzido pelo Núcleo de Estudos de Pesquisa em Direito Internacional da Uerj (Nepedi-Uerj) em parceria com a Universidade Federal de Roraima (UFRR), o qual foi encaminhado aos ministérios da Justiça e Segurança Pública e dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Um dos pontos importantes trata da saúde sexual das mulheres e meninas venezuelanas, as quais fazem pouco ou nenhum uso de métodos contraceptivos, têm muitos filhos e vieram em busca de serviços de assistência à saúde, motivação para migrar que perde apenas para a fome. Trata-se de um problema que pode ser visto no cotidiano de Boa Vista.
O relatório cita outra questão, que é a ausência completa da comunicação das informações sobre cadastros penais da Venezuela com o Brasil, em que as autoridades não têm um controle na fronteira de pessoas que são solicitantes de refúgio ou migrantes que podem estar fugindo de uma situação penal na Venezuela. Tal controle precisa ser feito a partir de uma relação diplomática do Brasil com a Venezuela, conforme os pesquisadores.
O que estamos assistindo é o avanço de problemas que deveriam preocupar as autoridades locais, antes que seja tarde demais. Na mesma medida em que crianças são usadas para pedir dinheiro, essas famílias estão sujeitas a serem usadas por criminosos que atravessam a fronteira sem controle.
O Município de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, perdeu qualquer controle e virou um completo caos, inclusive com policiais pedindo redistribuição porque sentem-se inseguros em trabalhar na fronteira. Vão esperar que isso aconteça em Boa Vista?
*Colunista