Cotidiano

Mais de 60% dos refugiados estão fora de sala de aula, diz Unicef

Também sem acesso à água tratada, crianças e adolescentes não conseguem fazer a higiene pessoal e tiveram diarreia no último mês

Sessenta por cento das crianças e adolescentes venezuelanos que estão em Roraima por conta da crise no país vizinho não têm acesso à água tratada para consumo. Além disso, 63,5% não possuem acesso à educação no estado. Estes são alguns dos dados frutos de levantamento realizado pelo Fundo Infantil das Nações Unidas (Unicef) e pela Organização Internacional de Migração (OIM) que indica algumas das principais problemáticas geradas pela vulnerabilidade de crianças e adolescentes venezuelanas em Roraima. 

O estudo foi realizado em três categorias de localidades: bairros de Pacaraima, bairros de Boa Vista e Rodoviária da Capital, no Pricumã. Ao todo, 726 crianças e adolescentes foram objetos de estudo. A pesquisa entrevistou 3.875 imigrantes, com a grande maioria sendo venezuelanos com mais de 18 anos acompanhados de crianças ou adolescentes. Somente 27 dos entrevistados eram, de fato, menores desacompanhados. 

Olhando apenas a idade escolar obrigatória, 59% das crianças e adolescentes venezuelanos entre cinco e 17 anos não frequentam nenhuma instituição de ensino. Na faixa etária de 15 a 17 anos, esse percentual é de 76%. Em relação ao acesso à água, além dos 60% que disseram não possuir acesso à água mineral, 45% não têm acesso regular à água para cozinhar e para garantir sua higiene pessoal. Além disso, 28% das pessoas menores de 18 anos disseram ter tido diarreia no último mês. 

Apesar dos dados negativos, a cobertura vacinal é boa, com 87,1% das crianças e adolescentes com as vacinas atualizadas. Além disso, 70% afirmam ter acesso aos serviços de saúde pública. 

Falando de fome, 115 crianças e adolescentes venezuelanos, o que representa 16% dos casos analisados, passaram por algum momento em que não tiveram comida suficiente desde que chegaram no Brasil. Ao menos 128 tiveram que reduzir o número de refeições diárias, 93 sentiram fome e não conseguiram alimentos e 84 disseram ter passado por um dia em que comeram uma vez ou não comeram.

ESPECIALISTA DIZ QUE PESQUISA REFORÇA DESATENÇÃO DO GOVERNO

De acordo com o economista e cientista social, Eloi Senhoras, a pesquisa realizada pela Unicef não apresenta nenhum problema inédito, mas destaca que, dentre as políticas adotadas pelas esferas públicas, ainda existem áreas com pouca atuação, principalmente por parte do Governo Federal.

 

Ele cita que, mesmo com o cruzamento diário de 700 venezuelanos pela fronteira de Pacaraima, o Governo Federal interiorizou 2 mil imigrantes, e atende, através da Operação Acolhida, somente 5 mil. 

“Essa pesquisa não possui uma relevância estatística, mas não obstante, identifica os direcionamentos de políticas públicas que vêm sendo adotados. As prefeituras e o Governo do Estado possuem o papel de aproximação do imigrante aos serviços públicos. Apesar disso, vemos que a principal omissão ainda é do Governo Federal, que materializa muito pouco do que propõe. Isso é extremamente grave quando você leva em consideração que é ele que possui o monopólio perante as políticas de fronteira e diplomacia”, explicou. 

Senhoras também destacou que essa pesquisa serve como mecanismo de conscientização populacional, para que os cidadãos também possam realizar cobranças na melhoria de serviços educacionais e de disponibilização de água potável. 

“A temática é sentida pela população de forma diária, só que de forma indireta e superficial. Por isso, pesquisas como essas são importantes para diagnosticar quais os impactos desse fluxo migratório, levando em conta o perfil dessas pessoas, e assim a sugestão de políticas públicas. Essa pesquisa vem a colaborar com tantas outras, como por exemplo os dados que são dados pela Polícia Federal e o Governo do Estado, para que haja um direcionamento de políticas públicas”, concluiu. (P.B)