Cotidiano

Remoção de corpos está sendo feita com ajuda de funerárias

Com viaturas sucateadas por falta de manutenção, servidores procuram meios de continuar serviços, mas garantem que não há mais condições de locomoção para municípios do interior

O atraso nos pagamentos dos servidores estaduais tem causado impactos diretos nos serviços prestados à população. No único Instituto Médico Legal de Roraima (IML), os funcionários descrevem a situação como caótica. Sem materiais para limpeza, sem dinheiro para custear insumos básicos para o trabalho e viaturas totalmente sucateadas, o ritmo de trabalho no local teve mudanças.

Em uma denúncia feita anonimamente à Folha, um servidor relatou que por conta de falta de manutenção nas viaturas, o IML está há dez dias sem condições de fazer a remoção de corpos em municípios do interior. De pneus carecas até a falta de óleo diesel estão entre os motivos para que fosse tomada a medida de evitar a locomoção para lugares distantes.

O denunciante pontuou que desde fevereiro o local está sendo mantido por meio de ajuda dos próprios servidores, seja com a compra de materiais e até a realização da limpeza do ambiente porque não há mais o contrato com uma empresa terceirizada para que o serviço seja feito.

“Passou um tempo que a gestão conseguiu colocar a limpeza uma vez por semana, mas isso não supre a necessidade do IML que recebe corpos todos os dias. Nós que damos um jeito de ficar num ambiente minimamente possível de trabalhar. Mas com a falta de pagamento de todos os policiais civis, a gente não tem como ajudar mais”, lamentou.

Mesmo em meio ao caos, o servidor apontou que os funcionários não deixam de realizar os trabalhos, já que não possui qualquer possibilidade de greve porque é um serviço necessário à população. “Estamos tentando continuar o serviço diante de toda nossa indignidade que vivemos no trabalho, estamos tentando não paralisar, mesmo sem condição”, ressaltou.

A falta de pagamento chegou ao ponto dos servidores não conseguirem comprar água ou comida durante as viagens feitas para remoção de corpos em locais mais distantes, que pode chegar a durar um dia inteiro de trabalho. A questão de segurança dos servidores foi debatida, e decidido que, a melhor opção era manter o uso das viaturas dentro do perímetro urbano de Boa Vista.

“Entramos em colapso. Vamos continuar trabalhando, mas que haja um entendimento que estamos fazendo mais que o máximo que um servidor pode fazer para justamente não paralisar e prejudicar ainda mais a população”, prosseguiu o denunciante. Atualmente são duas viaturas utilizadas pelos médicos-legistas, ambas em condições escassas de serem utilizadas.

ACORDO COM FUNERÁRIAS – A proposta sugerida pelo IML foi de conversar com os delegados dos municípios do interior para que seja feito um acordo com as funerárias para a transferência de corpos até Boa Vista e seja feito a autópsia normalmente.

Esse acordo não é o único visado pela gestão do Instituto, que em meio à falta de recursos, chega a solicitar que as funerárias façam doações de caixões para famílias de baixa-renda, já que o serviço funerário ofertado pela Secretaria Estadual do Trabalho e Bem-Estar (Setrabes) foi suspenso. Durante a entrevista, o denunciante revelou que o tonner da impressora acabou e não tem condições de ser reposto, podendo causar problemas na impressão de diversos documentos e que os próximos passos consistem em conseguir doações para que esse trabalho seja continuado.

“Entramos em contato com a própria polícia, que é nosso gestor direto, e deram uma resposta que não tem como resolver. É material essencial ou não vamos ter como emitir os laudos. Além disso, a internet foi cortada”, lamentou.

HORÁRIO REDUZIDO – Sem salários, os servidores estão também com dificuldades de se locomoverem até o trabalho, o que produziu uma redução no horário de atendimento para realização das necropsias. Anteriormente, o trabalho era feito até as 18h diariamente, agora o foco está em atender durante seis horas seguidas, das 7h às 13h.

Atualmente são 14 médicos-peritos que realizam o trabalho de necropsia no IML que passaram a utilizar tocas de proteção dos pés na cabeça porque a específica acabou. O material para realização da autópsia ainda está com estoque bom, mas a previsão é que durem somente até o final do ano.

GOVERNO – A equipe de reportagem procurou o Governo de Estado questionando sobre a situação relatada na denúncia, principalmente sobre a falta de manutenção das viaturas para locomoção nos municípios do interior.

Questionou se havia a possibilidade de melhorias e quando essas ações seriam aplicadas, contudo, não foi obtido resposta até o fechamento desta matéria.