Hutukara Associação Yanomami celebra 20 anos com encontro de xamãs

O evento será de 9 a 11 de novembro, na comunidade Yakeplaopi, região de Palimiu, em Alto Alegre

A Hutukara explicou que o local da festa foi escolhido por ser umas das regiões mais emblemáticas do território (Foto: Divulgação)
A Hutukara explicou que o local da festa foi escolhido por ser umas das regiões mais emblemáticas do território (Foto: Divulgação)

Uma das dez associações da Terra Indígena Yanomami (TIY), a Hutukara Associação Yanomami (HAY) celebra 20 anos de criação. A organização vai realizar o Encontro dos Xamãs, de 9 a 11 de novembro, na comunidade Yakeplaopi, região de Palimiu, em Alto Alegre.

A Hutukara explicou que o local da festa foi escolhido por ser umas das regiões mais emblemáticas do território. Palimiu é um dos pontos estratégicos das invasões dos garimpeiros, sendo passagem de entrada e saída de forma fluvial de Boa Vista para o território, na calha do Rio Uraricoera. Em 2021, os Yanomami dessa região foram vítimas de vários dias de ataques a balas pelos invasores e até tiroteios entre garimpeiros e policiais.

Atualmente, Palimiu recebe uma estrutura montada pelo Governo Federal, com a restruturação da Base da Funai, que recebe contingentes das Forças Armadas para operações de desintrusão do garimpo. Uma corda de aço perpassa de um lado a outro do rio para impedir a passagens de barcos dos garimpeiros. Mesmo com as operações nos últimos meses, ainda há indícios da presença de garimpeiros na região.

“Escolhemos esse local para o evento de 20 anos da Hutukara, primeiro porque aqui é a nossa casa e nunca vamos recuar e nem nos amedrontar com os invasores, eles que precisam sair imediatamente da nossa terra. Aqui também é um ponto de resistência a todos os ataques que a Terra Yanomami vem sofrendo nos últimos anos. Palimiu é um símbolo de luta! Somos fortes, com guerreiros e guerreiras e vamos continuar resistindo”, disse Dário Kopenawa, vice-presidente da Hutukara.

Para o povo Yanomami, os xamãs são homens yanomami que passam por um processo longo de formação com os mais velhos, ficam submersos da floresta, usando somente o pó vegetal “yakoana”, que é alucinógeno, extraído de uma árvore, a partir daí fazem conexão com os “xapiri’, que são guardiões invisíveis das florestas, espíritos nos quais os ancestrais animais dos povos Yanomami se transformaram. Dário afirmou que, quando o planeta fica doente, com as mudanças climáticas, são os xamãs que curam a terra.

“Durante a nossa festa, vamos realizar o Encontro dos Xamãs. Quase dez anos que não fazemos esse encontro e isso marca também a nossa retomada de fortalecer a nossa medicina tradicional dos xapiri, nossos médicos da floresta. No passado já fizemos esse encontro nas regiões da Missão Catrimami, Demini, Ajarani e Novo Demini. Quando não tinham os médicos não indígenas, os xamãs que nos curavam. Isso é um conhecimento sagrado e vamos fazer essa demonstração com mais de 20 xamãs de várias regiões, sobretudo para os jovens, que devem manter a nossa tradição. Não podemos esquecer o nosso xapiri porque é a nossa cosmovisão, que Omama [Deus] nos deixou”, disse Dário.

História da Hutukara

A associação foi criada em 2004, pelo xamã e liderança política, Davi Kopenawa, em uma assembleia indígena, na comunidade de Watorikɨ, região do Demini, no Amazonas. Atualmente, a assembleia é convocada a cada quatro anos e desde sua fundação, Davi Kopenawa vem sendo reeleito como presidente da associação, e seu filho Dário Vitório Kopenawa, foi escolhido para ocupar o cargo de vice-presidente, em 2022.

A Hutukara exerce um papel de articulação política e gere projetos voltados à proteção territorial, frente à invasão do garimpo ilegal, com denúncias aos órgãos públicos, manejo etnoambiental, saúde, formação, pesquisa e outras iniciativas com parcerias nacionais e internacionais.

De acordo com o xamã Davi Kopenawa, o nome “Hutukara” foi escolhido para a associação pelos xapiri. Em diferentes contextos, a palavra Hutukara adquire sentidos diversos com base na cosmologia Yanomami. Segundo Davi, Hutukara é o céu que desabou nos primeiros tempos, constituindo o plano em que nos encontramos hoje, o da urihi, a terra-floresta – povoado por seres vivos visíveis e invisíveis. É, portanto, o nome xamânico da terra atual, associado ao que os não indígenas chamam de universo, mundo ou planeta Terra. Nome propício, pois o papel da associação é defender a Terra-Floresta e seus povos.

A Terra Yanomami conta com 10 associações, sendo a Hutukara a responsável de reunir essas organizações. Elas enfrentam desafios específicos, a partir da realização do Fórum de Lideranças, que é a maior instância política da TIY, com debates e decisões, reconhecido formalmente desde 2015.

Além disso, a HAY organiza assembleias gerais ordinárias e extraordinárias, encontros regionais com representantes de órgãos do Estado e de entidades parceiras, para discutir problemas e demandas da população. São também organizadas oficinas para tratar questões específicas, como a elaboração do Plano de Gestão Territorial e Ambiental da TIY e do Protocolo de Consulta.

A HAY se articula com outras forças do movimento indígena e com organizações indígenas como Conselho Indígena de Roraima (CIR), Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e Rede de Cooperação Alternativa (RCA) para objetivos políticos, possibilitando a participação de Yanomami em manifestações e encontros com representantes de órgãos públicos, em Boa Vista, Brasília e outros países.