Ontem, 6, foi um dia marcado pelo fogo nos pneus que foram queimados por servidores em frente à Secretaria Estadual de Justiça (Sejuc), à Cadeia Pública Masculina de Boa Vista e ao 5º Distrito Policial (DP). Na Sejuc, o fogo serviu como anúncio do bloqueio de entradas do órgão e de unidades prisionais do Estado. Na delegacia, serviu como um gesto de resistência após o promotor de justiça Masato Kojima tentar negociar com os manifestantes que estavam bloqueando a entrada do local.
SEJUC – Após a Secretaria Estadual de Fazenda (Sefaz) e o 5º DP, ontem, 6, foi a vez de a Sejuc ter as entradas bloqueadas, por agentes penitenciários, bem como em unidades prisionais de Roraima, por volta das 11h. O ato foi realizado em protesto à falta de pagamento de salários.
Segundo os manifestantes, somente funcionários que estão fazendo a distribuição de alimentos estão autorizados a entrar nas unidades prisionais. Por temer represálias de facções criminosas que visam a categoria, os agentes abordados optaram por não ser identificados. “Não entrará autoridade ou visitante algum. Se alguém do Ministério Público quiser entrar em presídio, não iremos deixar. Se algum interventor também quiser, trataremos da mesma forma. Já ouvimos promessas demais e não aguentamos mais. A fome dói e todos que trabalham para o governo sentem isso”, afirmou um dos manifestantes.
No 5º DP, promotor e policiais civis discutem
Promotor saiu escoltado em uma viatura do GRT (Foto: Priscilla Torres/Folha BV)
Além da Sejuc, outro lugar que foi marcado pelo fogo foi o 5º Distrito Policial, a única delegacia em funcionamento em Boa Vista, e que está bloqueada por servidores da Polícia Civil até amanhã, 8, seguindo decisão tomada em assembleia geral dos policiais civis.
Na parte da manhã, o promotor de Justiça Masato Kojima esteve no local para conversar com manifestantes. Entretanto, o diálogo evoluiu para uma discussão entre as partes, que resultou em dois pneus do carro do promotor sendo furados, e a necessidade de escolta da Grupo de Resposta Tática (GRT) para a saída dele do local. Após isso, os policiais civis queimaram pneus em frente à Central de Flagrantes.
Em vídeo filmado por um dos servidores, é possível ver que, logo após a autoridade chegar, o tom de voz da discussão dele com os servidores vai acalorando. “Eu não costumo receber designação para atuar e não resolver. Viro noite e final de semana, faço tudo o que for possível para resolver o problema de vocês. (…) Não me enxerguem como qualquer superior. Quero ser respeitado como promotor. Procurem não criar um confronto que não existe. O promotor tem prerrogativa de entrar onde deve (no 5º DP). Me identifiquei e irei entrar, não preciso consultar ninguém. Vim para cuidar disso”, afirma.
Após isso, o delegado plantonista, Glauber Lorenzini, e membros do Sindicato dos Policiais Civis do Estado de Roraima (Sindpol) decidiram se reunir com o promotor no gabinete dentro da Central de Flagrantes. Enquanto isso ocorria, os pneus do carro de Masato foram furados, havendo a necessidade de um guincho para retirar o veículo do local, enquanto ele era conduzido pelo GRT aos gritos de ‘omisso’ por parte dos manifestantes.
Segundo o secretário da Federação dos Policiais Civis da Região Norte (Fepolnorte), José Nilton, as atitudes do promotor estimularam a atitude dos manifestantes. “Ele colocou gasolina no nosso fogo. Chegou aqui de forma unilateral, querendo impor a nós que deveríamos trabalhar. Até poderíamos, se recebêssemos [o salário], houvesse gasolina, papel ou internet. Não temos alimentos em casa, nossas contas estão atrasadas e sequer há gasolina para podermos continuar trabalhando normalmente”, comentou.
O presidente do Sindpol, Leandro Almeida, esteve na reunião no gabinete do 5º DP com Masato, e comentou com a imprensa como foi o diálogo: “Ele queria saber como o DP estava funcionando e questionou porque o atendimento não estava sendo feito. Explicamos que não há condições, por falta de internet, papel, entre outros. Não sei o que culminou a represália dos manifestantes, mas eu entendo que os nervos de todos estão à flor da pele com a falta de salários. Não é brincadeira você acordar e não poder alimentar seu filho, com a mesma coisa ocorrendo no almoço. Não queremos saber de bloqueios, são vidas que dependem de salários”, discorreu.
OUTRO LADO – Por meio de nota, o Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR) esclareceu que não houve a tentativa de prisão ou ameaças nesse sentido. “O MPRR se solidariza com o sofrimento dos servidores e familiares decorrentes do descontrole e malversação do dinheiro público que ocasionou a falta de pagamento dos salários, ao passo que repudia veementemente todo e qualquer ataque à Instituição, em especial, os dirigidos ao Promotor de Justiça Masato Kojima, no exercício de suas funções, e pela equipe de Segurança Institucional do órgão”, afirma trecho da nota.
Citou que o órgão está a favor dos servidores, especialmente àqueles voltados à segurança pública. “A exemplo da recente decisão judicial proferida pela Justiça Federal em face do descumprimento por parte do Governo do Estado de acordo já homologado judicialmente com Ministério Público do Estado de Roraima e o Ministério Público Federal, referente ao pagamento dos servidores da segurança pública”, complementou.
A Associação de Membros do Ministério Público do Estado de Roraima também se pronunciou afirmando que nada dito por Masato justificou a atitude de represália dos manifestantes. “Em momento algum o agente do Ministério Público atuou afastado da razão ou das regras de tratamento com qualquer representante da Polícia Civil ou dos manifestantes que estavam presentes no local, mantendo o diálogo com autoridade policial”, afirmou por nota. (P.B)