
Em um intervalo de 16 horas, Boa Vista registrou uma média de 177 milímetros de chuva, quase quatro vezes mais que o esperado para todo o mês de março. As informações são do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) e da Femarh (Fundação Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos).
Conforme levantamento do meteorologista da Femarh, Ramón Alves, a média histórica registrada no terceiro mês do ano é de 46,7 milímetros. Ele confirmou que o volume pluviométrico entre a tarde de sexta-feira (7) e a manhã deste sábado (8) representa a antecipação do período chuvoso desta temporada.
Em Roraima, as estações, na verdade, são divididas em dois períodos: seco (outubro a março) e chuvoso (abril a setembro). “Essas chuvas estão ocorrendo devido ao fenômeno La Niña, que traz mais chuvas para nossa região. Logo, nosso período chuvoso que, historicamente, começa em abril, pode ser antecipado”, declarou o especialista.
O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) havia emitido um alerta de chuvas fortes apenas para a região Sul do Estado, com até 100 milímetros em 24 horas e ventos intensos. A realidade foi bem diferente e surpreendeu Boa Vista, que fica mais ao Norte de Roraima.
De acordo com a Agência Nacional de Águas (ANA), o rio Branco, principal curso d’água do Estado, subiu mais de 20 milímetros no mesmo período, em Boa Vista. Se às 17h de sexta-feira, quando começaram as chuvas, ele registrava 0,78 milímetro de altura, às 10h30 deste sábado, o nível já estava em 1,01 metro.
Mais chuvas
Neste sábado, o instituto renovou o alerta de chuvas intensas, válido até às 9h de domingo (9), para Boa Vista e outros nove municípios do Norte do Estado. Conforme ele, a previsão será de 30 milímetros por hora de chuvas, ou até 50 milímetros em 24 horas, com ventos intensos de até 60 quilômetros por hora.
Com isso, o Inmet considera baixo o risco de corte de energia elétrica, queda de galhos de árvores, alagamentos e de descargas elétricas. Por outro lado, o instituto orienta que:
- Em caso de rajadas de vento, não se abrigar debaixo de árvores, devido ao leve risco de queda e descargas elétricas, e não estacionar veículos próximos a torres de transmissão e placas de propaganda;
- Evitar usar aparelhos eletrônicos ligados à tomada; e
- Obter mais informações junto à Defesa Civil (telefone 199) e ao Corpo de Bombeiros (193).
Ainda de acordo com o Inmet, a previsão é de muitas nuvens com possibilidade de chuva isolada ou pancadas de chuva até quarta-feira (12). Nesse período, a temperatura deve variar de 25 a 37 graus celsius.
Ramón Alves informou que, até maio, a previsão é de chuvas acima da normal climatológica em todo o Estado. “A princípio temos chuvas, sim, para esses meses, principalmente em maio, quando as precipitações tendem a ultrapassar os 200 milímetros de acumulado mensal”, pontuou.
Alagamentos e estragos pela capital
Desde ontem, vídeos nas redes sociais registram alagamentos e transtornos por toda a cidade, especialmente em bairros da zona Oeste da capital de Roraima.
O estudante Jairo José Rodriguez, de 40 anos, que mora na rua Antares, no bairro Cidade Satélite, relatou que a água ficou com, aproximadamente, 20 centímetros dentro de casa, e molhou eletrodomésticos como geladeira e máquina de lavar roupas, sofá e cama.
“Botamos a cama em cima do tijolo. Aqui na frente de casa, a água ficou com quase um metro de altura […]. Tava tão fundo que quase encobriu o nosso carro”, destacou.
No bairro Cauamé, uma moradora da rua Jael Barradas disse, sob condição de anonimato, que as águas deixaram toda a vizinhança isolada dentro de casa. “Há anos, nossa rua sofre com o problema de alagamento, já foi feito abaixo-assinado, abertura de chamado junto á Central 156, nada foi resolvido”, criticou.
Uma moradora do bairro Silvio Leite mostrou à Folha a rua alagada, assim como a água entrando em sua residência, na noite dessa sexta. Familiares da pedagoga Kátia Santos, de 55 anos, precisaram se antecipar para proteger móveis e retirar as águas.
No bairro Liberdade, trechos das pistas das avenidas Mário Homem de Melo e Ataíde Teive começaram a registrar novas rachaduras após os últimos alagamentos, que inclusive quase adentraram em alguns comércios da região na noite de sexta.
A Prefeitura de Boa Vista esclareceu que o grande volume de água em um curto espaço de tempo sobrecarregou o sistema de drenagem, o que diminuiu a velocidade do escoamento. Com isso, pontos da cidade registraram alagamentos durante a chuva.
“O que a gente está vendo é uma quantidade de chuva muito acima do normal para esse período. Isso pressiona o sistema de drenagem, fazendo com que a água acumule em determinados pontos. Nós estamos monitorando toda a situação e com equipes de várias secretarias no Centro de Controle e nas ruas atuando para minimizar os danos e garantir a segurança da população”, disse o prefeito Arthur Henrique (MDB).
A Central 156 recebeu 18 ocorrências relacionadas à limpeza de bocas de lobo e serviços da Patrulha da Chuva. As demandas foram encaminhadas imediatamente às equipes da Prefeitura, que já estão nas ruas auxiliando moradores e fazendo intervenções emergenciais.
“Vale ressaltar que a Defesa Civil não foi acionada por moradores, não tendo registrado, até o momento, casos de pessoas machucadas, desalojadas ou queda de árvores. Mas as equipes permanecem em alerta para atender às demandas que surgirem. Em caso de ocorrência, a população pode acionar apoio por meio da Central 156”, enfatizou a Prefeitura.
A Prefeitura ainda alertou que as pessoas não saiam de casa durante as fortes chuvas e evitem transitar com veículos em áreas de risco. E se estiver na rua, procurem abrigo em locais seguros, evitando permanecer debaixo de árvores
Uma moradora do bairro Liberdade se assustou com a queda do galho de uma árvore de grande porte no quintal de casa, o qual destruiu parcialmente o muro.
“Isso aconteceu umas 3h da manhã, estava chovendo bastante”, disse a dona de casa, Emília Souza, 53 anos. “Eu estava acordada nessa hora, porque tava chovendo muito. Quando escutei, falei: ‘pronto, o fim do mundo chegou'”.
Na zona rural, o Lago do Robertinho, um dos balneários mais famosos de Roraima, cancelou a programação deste sábado em virtude da interdição da estrada que dá acesso ao local.
Sem energia
Ademais, moradores de bairros como Paraviana, na zona Norte, Caçari, na Leste, e São Bento, na Oeste, relataram ter ficado mais de 12 horas sem energia. A Roraima Energia confirmou que descargas atmosféricas e ventos fortes danificaram a rede elétrica da capital, inclusive a fibra que suporta os canais digitais da empresa.
“No momento, estamos sem canais de atendimento, mas estamos trabalhando para disponibilizar um novo canal para o atendimento emergencial. Lamentamos os transtornos e agradecemos pela compreensão de todos”, destacou.
Aviões
O mau tempo também cancelou o pouso de um avião da Latam no Aeroporto Internacional de Boa Vista, na noite de sexta, que vinha de Brasília. A empresa esclareceu que o voo foi alternado para Manaus devido às condições meteorológicas adversas no destino, “fato totalmente alheio ao controle da companhia”.
“A aeronave pousou em Manaus à 1h22 (hora local). A companhia ofereceu assistência aos passageiros e, após reabastecimento e troca da tripulação, o voo seguiu para Boa Vista, aterrissando em completa segurança às 6h22 (hora local) deste sábado (8/3)”, pontuou.
A Azul disse não ter tido voos afetados, enquanto a Gol ainda não respondeu até a publicação da reportagem.