
Alunos do curso de Medicina da Universidade Estadual de Roraima (UERR) denunciaram à reportagem da Folha uma série de irregularidades no internato rural obrigatório, realizado nos municípios de Rorainópolis, Cantá e Bonfim. De acordo com os relatos, os problemas vão desde a imposição de carga horária acima do permitido até a ausência de estrutura, apoio financeiro e acompanhamento pedagógico adequado.
Carga horária superior ao permitido
O grupo afirma que, embora o regulamento da própria universidade limite a carga horária do internato a 180 horas, os estudantes vêm sendo submetidos a jornadas que ultrapassam 290 horas. Em Bonfim, por exemplo, os plantões chegam a 36 horas consecutivas nos fins de semana. Além disso, os acadêmicos relataram que, mesmo após cumprirem rodízios extensos em Rorainópolis e Cantá, continuam sendo obrigados a participar das atividades em Bonfim sob ameaça de reprovação.
Estrutura precária e ausência de apoio
A falta de estrutura nos municípios também preocupa. Em Rorainópolis, os alunos arcam com todas as despesas de hospedagem, alimentação e transporte durante 15 dias. No Cantá, a rotina é de deslocamento diário, também sem apoio da instituição. Já em Bonfim, segundo denúncia apresentada à reitoria, o único recurso disponibilizado para pernoite foi uma maca improvisada sobre uma mesa, compartilhada por três estudantes em sistema de revezamento.
Falta de planejamento pedagógico
Os alunos também apontam a ausência de plano de ensino, critérios avaliativos e acompanhamento pedagógico adequado. Segundo eles, não há qualquer documento formal que comprove a realização dos estágios. Isso levanta dúvidas sobre a responsabilidade da instituição em caso de problemas durante a atividade prática.
Déficit de preceptores e desligamento de docentes
Outro ponto levantado é a falta de preceptores em áreas fundamentais da formação médica. Apesar de um processo seletivo recente com mais de 50 inscritos, apenas 12 profissionais foram contratados, o que resultou no desligamento de docentes que já atuavam na instituição. Com isso, a mudança afetou diretamente o ensino nas áreas de Pediatria, Ortopedia, Anestesiologia, Neurologia e Cirurgia Geral.
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Tentativas de diálogo sem retorno
Os estudantes afirmam que procuraram a coordenação do curso e apresentaram carta aberta com as reivindicações no início de março. No entanto, segundo eles, a reunião não resultou em encaminhamentos concretos. A coordenação teria informado que a universidade não tem obrigação de oferecer ajuda de custo ou resolver a questão do internato. Orientaram os alunos a cumprir as exigências conforme estão.
Denúncias de abuso e intimidação
A denúncia também cita episódios de intimidação e abuso de poder por parte da coordenação do internato. Isso inclui ameaças de reprovação, imposição de regras sem respaldo legal e condutas desrespeitosas com os acadêmicos.
Resposta da UERR sobre o Internato de Medicina
Procurada, a UERR informou que está apurando os fatos em conjunto com a coordenação do curso, a Pró-Reitoria de Ensino e outros setores da universidade. Segundo a nota, a instituição realizou reunião com os alunos e iniciou visitas técnicas para verificar as condições dos locais. Ainda conforme a universidade, os custos com deslocamento, hospedagem e alimentação são de responsabilidade dos estudantes. Leia a nota na íntegra:
NOTA – INTERNATO DE MEDICINA
A Universidade Estadual de Roraima (UERR) informa que já começou a apurar os fatos relacionados ao internato do curso de Medicina. A investigação está sendo feita junto com a coordenação do curso, a Pró-Reitoria de Ensino e outros setores da universidade. O objetivo é entender o que aconteceu e dar uma resposta rápida e responsável para a comunidade acadêmica.
As reclamações dos alunos foram ouvidas em uma reunião com representantes de todos os envolvidos. Após essa conversa, algumas providências já foram tomadas, como uma visita técnica ao município de Rorainópolis – onde o internato acontece – para avaliar as condições do local e pensar em melhorias na estrutura.
Também está sendo apurado o comportamento do professor responsável pela disciplina, conforme relato dos acadêmicos. A Pró-Reitoria de Ensino está acompanhando tudo de perto, com o compromisso de garantir um ambiente adequado para o aprendizado.
O Internato Rural faz parte da grade obrigatória do curso de Medicina da UERR. Todos os alunos precisam cumprir essa etapa conforme as regras e carga horária previstas.
Segundo a Resolução nº 46, de 11 de outubro de 2022, a UERR não é responsável por despesas como transporte, hospedagem e alimentação durante o estágio. Esses custos são de responsabilidade dos próprios alunos.
Por fim, a UERR lembra que qualquer estudante ou cidadão pode enviar denúncias, sugestões ou reclamações pelo canal oficial da Ouvidoria, disponível em: