Eram por volta das 14h de uma tarde comum na Central de Regulação das Urgências Médicas, setor responsável pelo recebimento de ligações para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência, o Samu. Na ligação, a voz de um homem solicitava que uma equipe fosse deslocada para atender ocorrência de uma vítima de tiro no peito. Os dados foram colhidos e todas as informações repassadas ao médico responsável em orientar os envolvidos no caso, até que a ambulância de suporte avançado fosse deslocada para a prestação do socorro juntamente com a Polícia Civil. Chegando ao endereço fornecido, não foi encontrada nenhuma vítima ou sequer sinais de que alguém precisava de ajuda médica ou policial. A ligação se tratava de um trote.
No Samu, no primeiro semestre de 2019, foram registrados 1.142 trotes, o que aponta crescimento de 152% em relação aos anos anteriores. No mesmo período de 2018, foram registrados 453 casos, e em 2017, os trotes contabilizaram 1.074 ligações recebidas com falsos pedidos de socorro. Conforme explicado pelo Coordenador da Central de regulação de Urgências Médicas, Elídio Cavalcante, os trotes possuem até horários fixos para acontecer, sendo em maioria por volta das 9h30 durante o intervalo e 12h no horário de saída das escolas da capital.
“Muitas ligações são anônimas, por isso não há como identificar de onde partiram. As que conseguimos identificar, nós retornamos, e na maioria dos casos foram feitas de dentro de escolas, por crianças. Para sabermos se o pedido de ajuda é real, fazemos diversas perguntas para registrar em ficha. Geralmente o mentiroso desiste quando é questionado sobre sintomas e o endereço”, explicou.
Cavalcante disse que os adultos não estão isentos de praticar a brincadeira de mau gosto, tendo muitos casos de homens que ligam para a Central no intuito de desferir palavras obscenas às atendentes. “Achamos que somente as crianças estão com o tempo à toa, mas adultos também aplicam trotes. A pessoa faz de forma consciente, mas não compreende o grau dos prejuízos que uma falsa ligação pode gerar à equipe que trabalha com seriedade salvando vidas”, disse o coordenador.
Multa de R$ 1 mil é prevista para quem aplicar trotes
Já está em vigor desde maio de 2017, a lei nº 1.181/17, conhecida como a Lei do Trote, pela qual quem for pego aplicando trotes para o Samu e Corpo de Bombeiros, por exemplo, é penalizado com multa de R$ 1 mil.
Os trotes além de obstruir a linha para que pessoas que de fato precisam de o serviço entrem em contato, também gera prejuízos financeiros, já que o deslocamento de uma equipe requer equipamentos e combustível conforme explicado pelo atendente da Central de emergências médicas Edson Santos.
“O dinheiro quem paga é a população porque são eles que movimentam a máquina pública, então cada trote representa dinheiro que poderia ser aplicado no deslocamento para atender ocorrências reais e graves. Deveriam existir medidas punitivas mais rígidas para os menores que praticam as falsas ligações e para os adultos que também fazem. É uma questão de educação e as escolas deveriam envolver os alunos desde pequenos para aprender a responsabilidade do nosso trabalho e de como um trote além de sem graça, é criminoso”, concluiu.