Cotidiano

Mais de 3,5 mil pessoas vivem nas ruas de Boa Vista

Dos migrantes que vivem nas ruas 1290 são homens, 1005 mulheres e 1247 crianças menores de 18 anos

MARCOS MARTINS

Editoria de cidades

No Brasil, foi realizado um estudo no ano de 2016 que estimou em mais de 100 mil pessoas a população de rua a partir de dados disponibilizados por 1.924 municípios, mas em Roraima, o número total de moradores de rua ainda é um dado praticamente desconhecido.

Segundo informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Censo que será realizado em 2020 não deve incluir essas pessoas, que ainda são invisíveis socialmente.

No entanto, em Boa Vista, a situação de moradores de rua tem ganhado características próprias com a imigração venezuelana. Muitos acabam sem lugar nos abrigos da ajuda humanitária espalhados pela cidade e ficam nas ruas. Segundo dados da plataforma regional de Coordenação Interagencial R4V, site onde a Organização das Nações Unidas (ONU), detalha informações sobre o fluxo migratório venezuelano, existem hoje, em Roraima, 3542 migrantes vivendo como moradores de rua, dos quais 1290 homens, 1005 mulheres e 1247 crianças menores de 18 anos.

Segundo o site, a contagem das pessoas foi feita em dois momentos, o primeiro durante a noite quando as pessoas foram identificadas dormindo em espaços públicos abertos e contabilizadas a partir de grupos com mais de 10 pessoas e o segundo, durante o dia, em edifícios e estruturas públicas ou privadas ocupadas espontaneamente.

Uma dessas pessoas é Juliane Cobar que passa as manhãs perambulando nas ruas. “Estou há quatro meses em Boa Vista. Na Venezuela não conseguimos emprego, não vivíamos bem. Pelo menos aqui passa alguém para dar alguma ajuda e algum alimento. Viver na rua não é a melhor situação, mas recebemos ajuda aqui e pelo menos conseguimos comida”, afirma Juliane.

Também morando há quatro meses em Boa Vista, Luiz Manoel relata que em Roraima tem conseguido comer mesmo morando nas ruas. “Pela manhã temos que encontrar outro local para ficar, pois de noite ficamos perto da rodoviária. Na Venezuela até se encontra comida, mas em muito pouca quantidade. A situação está cada dia pior lá, e sem emprego. Aqui eu consigo comer quatro ou cinco vezes no dia e na próxima semana nós vamos para o Mato Grosso e queremos sair das ruas. Viver com familiares assim não é uma boa condição”, afirma Luiz, que chegou com esposa e dois filhos. 

Ainda conforme dados do site, o quadro de moradores de rua evoluiu muito a partir de janeiro de 2019, quando existiam apenas 1076 pessoas vivendo nas ruas, chegando ao ápice em julho deste ano, quando o número de indigentes chegou a 3631.

A ONU disponibilizou dados atualizados sobre moradores de rua em Boa Vista (Fotos: Site R4v)

Governo e prefeitura não monitoram situação de moradores de rua


Imigração venezuelana contribui para a população de rua, segundo a prefeitura (Foto: Diane Sampaio/FolhaBV)

A reportagem da Folha procurou a Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) do governo estadual para saber como essa questão era tratada. Por meio de nota, a secretaria informou que não mantém nenhuma política de atendimento a pessoas em situação de rua em Boa Vista. 

Em abril deste ano, o juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública, Luiz Alberto de Morais Júnior, determinou que a prefeitura de Boa Vista criasse e implantasse um programa para monitorar a população de rua na cidade no prazo máximo de 60 dias, sob pena de multa.

A decisão em caráter liminar (provisório) foi concedida em ação civil pública movida pelo Ministério Público de Roraima (MPRR). Em setembro do ano passado o órgão acionou a Justiça para que a prefeitura executasse programa de monitoramento com o fim de se verificar, trimestralmente, qual é o real número de pessoas vivendo em situação de rua na capital.

Apesar da determinação judicial, a prefeitura de Boa Vista informou por meio de nota para a Folha de Boa Vista que, com a chegada de milhares de venezuelanos, a prefeitura não tem como atender a demanda sem o apoio do Governo Federal, sendo a operação Acolhida que recebe recursos para abrigar os venezuelanos que estão nas ruas.

“A situação de moradores de rua na capital é diferente do que ocorre no restante do país. Ela é influenciada diretamente pela imigração venezuelana e até o início a crise humanitária no país vizinho, havia casos raros de moradores de rua na capital”, concluiu a nota.