AYAN ARIEL
Editoria de Cidades
Há doze anos produzindo no Assentamento Novo Planalto, colonos da vicinal 5, região do MacLaren, no município de Alto Alegre, denunciaram à Folha que vêm sofrendo com intimidações de um advogado que teria clientes com interesse naquela área.
Os moradores relataram que já teriam sofrido quatro ataques nos últimos sete anos e o mais recente ocorreu na noite do último dia 30, quando seis homens desconhecidos incendiaram duas casas e a sede da associação de produtores do Novo Planalto.
A intimidação, segundo informou Silvanete Nascimento de Lima, presidente da presidente da Associação Rural dos Moradores do Assentamento Novo Planalto (Amanp), é feita por homens comandados por um indivíduo que teria se identificado como gerente das terras onde os assentados moram e informado que estava a mando de um advogado bastante conhecido na cidade. “Esse cidadão tem queimado e derrubado casas lá do assentamento e ficamos com esse prejuízo. Eles nunca apresentam nenhuma documentação oficial, é sempre documentação falsa. Quando eles estão nos carros, também tiram as placas para que a gente não consiga identificá-los, mas sempre conseguimos chegar a essas pessoas e elas sempre dizem que estão a mando desse advogado”, explicou Silvanete.
Produtor rural da localidade há seis anos, Angelino Gomes, de 54 anos, já viu alguns desses indivíduos perseguindo os moradores da região.
“Eles já andaram por aqui ameaçando os moradores e já sabemos até quem é. Teve uma vez que eles passaram na frente de casa e seguiram pro igarapé. Segui a caminhonete deles e perguntei pra onde eles estavam indo e disseram que a estrada era pública. Só que eu descobri depois que eram os caras que trabalhavam com esse advogado, que estavam ameaçando os produtores, dizendo que as terras são deles”, relatou Gomes.
TERRA – Desmembrada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) da região onde antigamente funcionava a Fazenda MacLaren, o assentamento com mais de cinco mil hectares de extensão é onde se encontram cerca de 120 famílias produtoras. Uma grande parcela delas veio deslocada da Raposa/Serra do Sol, em Normandia, razão pela qual o projeto rural foi criado.
“Quando nós procuramos o Incra, eles disseram que procurássemos um local que estivesse improdutivo e entrássemos para que eles pudessem nos assentar. Aí encontramos essa área e hoje ela se divide entre essas famílias. Só que, até hoje, nem Incra nem Iteraima dão uma solução para regularizar esse assentamento”, relembrou a presidente da associação de moradores.
Além dos colonos deslocados da área indígena do município de Normandia, que ocupam os maiores terrenos no projeto, também produzem no Novo Planalto pequenos produtores. A região é criadora de aves, bovinos e suínos, além da produção de mamão, hortaliças e derivados de leite.
Levando em conta todo o impasse envolvendo o assentamento, Silvanete faz um apelo. “O que a gente queria? Que as autoridades nos ajudassem com a regularização e nos colocassem frente a frente com esse cidadão para ver a real situação desse homem, porque ele diz que se não ganhar, nós também não ganharemos. A sensação é de revolta, pois não é de hoje que ele vem nos trazendo ameaças e prejuízos. Queremos justiça”, finalizou a presidente da Amanp.
OUTRO LADO – Em nota enviada a nossa equipe, o Governo de Roraima, por meio do Iteraima, esclareceu que a gleba Cauamé, no município de Alto Alegre, pertence ao Estado de Roraima, informando ainda que não existe assentamento estadual na área citada.
A nota também ressalta que embora a gleba já esteja registrada em nome do Estado, ainda não possui o assentimento prévio do CDN (Conselho de Defesa Nacional) para a emissão de títulos definitivos para imóveis localizados em faixa de fronteira.
“O Governo do Estado está trabalhando juntamente com o Governo Federal para a concessão do assentimento prévio das glebas já transferidas para o Estado e para a conclusão da transferência das demais glebas que ainda não foram repassadas. Tão logo o Governo Federal conceda o assentimento prévio, o Iteraima irá iniciar a regularização de todas as propriedades localizadas em áreas do Estado”, conclui a nota.
“Tudo virou cinzas por causa da disputa de terra”, diz produtora
Ela perdeu tudo em incêndio e teve prejuízo de cerca de R$ 150 mil (Foto: Divulgação)
Durante o ataque ocorrido no dia 30, que destruiu casas e a sede da associação de moradores da região, a produtora rural Fany Mota Bezerra sofreu grandes prejuízos, calculados em torno de R$ 150 mil. A casa-sede do sítio da senhora de 68 anos foi completamente consumida pelo fogo.
No dia do crime, o caseiro do sítio de Fany estava acompanhado do caseiro de um dos vizinhos quando perceberam a chegada do carro em que estariam os seis homens responsáveis pelos incêndios. Antes da ação, os indivíduos teriam combinado como seria o procedimento.
Após o carro seguir caminho até o primeiro alvo, os dois caseiros trancaram todo o sítio e se dirigiam até um ponto onde havia sinal de celular, para alertar a polícia sobre a situação, mas tiveram que se esconder no matagal quando viram os homens tocando fogo no terreno.
Fany lamenta a perda total da casa construída, que era um apoio para a criação de animais que a produtora possui. “É muito difícil, porque tudo foi começado com muito trabalho, esforço e tempo. De repente, aconteceu e ficou desse jeito. É muito grave a situação! Um investimento de uma vida inteira virou cinzas por conta dessa disputa de terras”
Por conta disso, Fany desabafa. “É um sentimento muito profundo e doído, porque até na idade em que eu estou fica difícil ter que recomeçar tudo, sem recurso, é um sentimento de tristeza, de insegurança e prejuízo mesmo”, concluiu.