O antropólogo José da Guia Marques, 60, servidor do Incra em Roraima, obteve o título de mestre com a dissertação “Reviravolta Identitária: Um estudo sobre o processo de reconhecimento étnico de Bastiões”, que analisa o processo de demanda identitária e territorial da comunidade quilombola de Bastiões, localizada na zona rural do município de Iracema, na região do Vale do Jaguaribe, no estado do Ceará.
A dissertação foi apresentada no último dia 19, ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Roraima (UFRR), como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Antropologia Social. José da Guia foi aprovado sem restrições, o melhor conceito do mestrado.
“Foi significativo e gratificante para mim, ser aprovado no mestrado na véspera do Dia da Consciência Negra, justamente com uma pesquisa que busca entender a identidade das populações negras remanescentes dos quilombos. Foi uma coincidência que reforça a reflexão e a luta pela igualdade racial, aliado ao reconhecimento dos direitos à terra das comunidades negras que o Incra vem realizando em todo o país”, comentou.
Maranhense de Araioses, José da Guia ingressou nos quadros do Incra em Roraima, em 2006. Por sua formação em antropologia, foi recrutado pela Sede para contribuir no programa de garantia de acesso à terra para a população negra e já produziu 16 relatórios antropológicos de reconhecimento e delimitação de territórios quilombolas no Tocantins, Pará, Piauí, Ceará e Amapá. “No momento, estou concluindo dois laudos novos de comunidades quilombolas do Amapá”, informou.
Foi trabalhando na Superintendência do Incra no Ceará, entre os anos de 2009 e 2017, que o servidor teve contato com o quilombo de Bastiões. Chamou a atenção do pesquisador a decisão da comunidade de abrir mão dos direitos étnicos e territoriais aos quais teria acesso, com base no Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988, declinando do reconhecimento enquanto comunidade remanescente de quilombo.
“A minha pesquisa buscou verificar como e porque se deu o processo de renúncia a essa demanda identitária e aos direitos territoriais correspondentes e até que ponto a rigidez e a uniformização da legislação quilombola, bem como a forma de intervenção do Estado por meio de seus agentes, contribuíram para a desistência da comunidade em relação à sua demanda identitária e territorial”, explicou.
REGULARIZAÇÃO – As comunidades quilombolas são grupos étnicos – predominantemente constituídos pela população negra rural ou urbana –, que se autodefinem a partir das relações específicas com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e práticas culturais próprias. Estima-se que em todo o País existam mais de três mil comunidades quilombolas.
Por força do Decreto nº 4.887, de 2003, o Incra é a autarquia competente, na esfera federal, pela titulação dos territórios quilombolas. As terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos são aquelas utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural. Como parte de uma reparação histórica, a política de regularização fundiária de Territórios Quilombolas é de suma importância para a dignidade e garantia da continuidade desses grupos étnicos.
Roraima e Acre são os dois estados brasileiros que não têm comunidades quilombolas autoatribuídas ou com demandas de reconhecimento territorial ao Incra. Em 2008 José da Guia produziu um Parecer Técnico, a partir de uma pesquisa exploratória, para demonstrar porque até aquele momento histórico não havia surgido nenhuma comunidade quilombola em Roraima.
Além de trabalhar em um ambiente que lhe proporcionou ter contato com o objeto de sua pesquisa, o servidor agradeceu ao superintendente do Incra em Roraima, Antônio Adessom Gomes dos Santos, pelo horário especial que lhe concedeu durante o período de sua pesquisa de campo e da elaboração de sua dissertação do mestrado. “Isso foi fundamental para garantir a qualidade do trabalho acadêmico que apresentei ao Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da UFRR”, concluiu.