A transformação digital exige uma nova postura do profissional e da faculdade de direito, que precisa se adaptar às tecnologias. E, nesse cenário, surgem as startups jurídicas, que prometem revolucionar o mercado no qual estão inseridas. Nos Estados Unidos, onde há mais empresas em operação nesse sistema, as operações de compra, venda e investimentos em lawtechs (startups jurídicas tecnológicas) movimentaram US$ 1,2 bilhão no ano passado, de acordo com o portal Startse.
Segundo a Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (AB2L), houve um boom de negócios digitais envolvendo a área do direito. Hoje, são 422 startups de tecnologia para a área jurídica em atividade no país. Para se ter uma ideia, em 2018, eram apenas 20. O grande problema que essas companhias visam resolver é a ineficiência e os processos burocráticos que permeiam o direito. No país, pilhas e mais pilhas de processos se acumulam e crescem ano a ano.
De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o número de processos sem solução em todo o Judiciário chegou a 80,1 milhões só em 2017 — alta de 0,3% em relação ao ano anterior, quando foram computados 79,8 milhões. Foi o período em que menos cresceu o estoque. Mas o fato é que ele ainda continua em curva ascendente. De 2009 a 2017, o acréscimo foi de 19,4 milhões de processos — crescimento de 31,9%. O processo considerado “pendente” ou “sem solução” é o que ainda não transitou em julgado, ou seja, ainda não completou toda a tramitação possível nas esferas do Judiciário.
O foco das lawtechs, portanto, é utilizar a tecnologia para diminuir a burocracia e acelerar os trâmites. Tal medida pode dar mais eficiência ao Judiciário e, por conseguinte, aos membros que fazem parte da área do direito — juízes, advogados, entre outros. Automação e produtividade e gestão dos dados são alguns dos recursos oferecidos por essas companhias.
Frente a esse cenário, surgem outras dúvidas e questionamentos. Com a automação e o uso da inteligência artificial, a tendência é que os operadores do direito se foquem ainda mais em habilidades humanas e interpessoais, afinal, a IA ainda não é capaz de ter a sensibilidade dos humanos nem pode interpretar de forma satisfatória uma lei de acordo com cada caso. Outro aspecto que ronda o mercado são as bases de dados que alimentam os sistemas de inteligência artificial — elas podem ter um determinado viés e prejudicar a decisão de um caso.
Em entrevista ao Startse, Alexandre Zavaglia, cofundador e presidente da Future Law, escola focada em preparar os profissionais do direito para as transformações tecnológicas, disse que “a tecnologia pode sugerir algumas decisões, mas a palavra final tem de ser do profissional”.
Já o presidente de Coordenação de Tecnologia e Inovação da OAB-SP, Márcio Dumas, disse ao portal que é necessário ter prudência com esse tema — a discussão não pode ser só em relação ao que os robôs podem ou não fazer. “Os investimentos em legaltechs são muitas vezes altos. Isso não pode beneficiar as grandes bancas, mais ricas, em detrimento dos pequenos escritórios?”, questiona.