Os recentes julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) demonstram que há uma certa mudança no perfil de análise dos ministros, em especial, nas peças de combate à corrupção que ganham repercussão em todo o país. A avaliação é que não basta mais apenas o testemunho de alguém envolvido no processo investigado, mas de provas técnicas que comprovem a ilegalidade.
A avaliação é do procurador do Ministério Público de Roraima (MPRR), Edson Damas, em entrevista ao programa Agenda da Semana na Rádio Folha 100.3 FM neste domingo, 25.
Damas explica que o pleno do STF segue uma linha ‘garantista’, quando a avaliação é voltada para a garantia dos direitos frente ao processo. Ainda, que a sociedade vive um momento de delação premiada, ou seja, quando alguém que faz parte do esquema de corrupção se prontifica e fala o que presenciou.
Com os depoimentos sendo divulgados à extensão, a população acaba entendendo que a fala descrita na delação é a verdade e se frustra quando o envolvido é absolvido das acusações.
“Aí que está o problema. As delações premiadas surgem, são amplamente noticiadas, mexem com o imaginário da população e quando vai se provar, por intermédio de outros meios como prova técnica, testemunhas, não se consegue reproduzir em juízo. Isso aparenta uma linha de impunidade”, afirma o procurador.
O procurador reforça que a própria lei sempre requer que a delação seja corroborada com provas técnicas e/ou testemunhas para se ter um respaldo maior. No entanto, nem sempre o que é dito é comprovado.
“Fica aquele ‘disse me disse’ e gera uma expectativa muito grande. Na hora de confirmar isso em juízo, não se consegue. Não se consegue corroborar essas delações premiadas. Me parece que essa é a linha que o Supremo Tribunal Federal vem agindo”, disse. “Antes tinha aquela linha mais conservadora no STF, onde se levava muito em consideração e se dava muito valor às provas testemunhais e escutas telefônicas”, completou.
MUDANÇAS – Para o procurador, a forma como o STF vem analisando e julgando casos de corrupção influencia também no formato como as investigações surgem nos órgãos fiscalizadores, como o próprio Ministério Público, Ministério Público Federal, Polícia Federal, Defensoria Pública e entre outros.
“Nós vamos precisar se acostumar. Os órgãos de investigação vão ter que aprender esse movimento garantista dentro do STF e investir em trabalho e serviço de inteligência digital. Nessa nova linha é preciso produzir documentos e dados técnicos, principalmente com relação à lavagem de dinheiro. É muito difícil comprovar sem um trabalho técnico, que requer treinamento e investimento em equipamento’, finalizou.
Confira a entrevista na integra:
DELAÇÃO PREMIADA – Segundo o Portal Politize, a delação premiada ou colaboração premiada é “um mecanismo judicial pelo qual um acusado colabora com as investigações”. Os detalhes revelados podem ir indicação dos nomes de co-participantes, localização da vítima (se houver) ou detalhes que ajudam a recuperar os bens que foram perdidos por conta do crime.
Em troca, o acusado pode receber alguns benefícios, como redução de um terço a dois terços do tempo da pena; cumprimento da pena em regime semiaberto, no lugar do regime fechado; a depender do caso, extinção da pena; e até mesmo perdão judicial.
Entretanto, o delator deve falar somente a verdade e não omitir informações seletivamente. As informações também devem ser passíveis de confirmação pelas autoridades. Caso a delação não acrescente novidades às investigações ou seja falsa, o réu pode perder seus benefícios.