Cotidiano

Mulheres têm optado por partos cesáreos

Na rede privada, 84% dos partos são por cirurgia, enquanto na rede pública o número chega aos 40%

A Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgou um alerta sobre o excesso de partos cesarianos em todo o mundo. O Brasil é o líder disparado no ranking com mais da metade de todos os nascimentos feitos por cirurgia: 53,7%. De acordo com dados do Ministério da Saúde, 84% dos brasileiros na rede particular nascem dessa maneira, contra 40% registrados na rede pública. Para a OMS, as cesáreas somente devem ser realizadas quando existirem “motivos médicos”.

A diretora do Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth (HMINSN), Cristiane Greco, explicou que Roraima segue a tendência nacional no quesito dos partos cirurgiados. A média de cesáreas fica por volta de 30% do total de partos. Obstetra que também realiza partos na rede de saúde privada, a diretora acredita que os hospitais particulares de Boa Vista estejam dentro da média nacional, que fica entre 80%.

“Praticamente todos são feitos com cesarianas a pedido das próprias pacientes. Ainda assim, eu acredito que o parto normal sempre é a melhor opção, pois a cesárea é um procedimento cirúrgico e, dentro dele, existem riscos de infecções e sangramentos muito maiores que nos partos normais”, disse.

Cristiane afirmou que as cirurgias não garantem que os bebês nasçam com algum tipo de vantagem sobre os que tenham nascido de forma natural. “As complicações são as mesmas, na verdade. De fato, o trabalho de parto faz o final do amadurecimento do pulmão do recém-nascido. Se a mãe escolhe a cesárea, corre o risco de o bebê não desenvolver isso”, observou.

“Trabalhamos assim na rede pública: se existe alguma situação de risco, recomendamos o parto por cesárea”, disse ao acrescentar que o trabalho de conscientização com as pacientes, para orientá-las que o parto normal é melhor, deve ser feito ainda no pré-natal, na atenção básica. “Existe a crendice de que a cesariana é melhor. É cultural”.

Profissionais que trabalham nos setores privado e público relatam que um dos argumentos usados com maior frequência explica os altos números registrados na rede privada: as mães não querem sofrer no parto. E isso vem da própria estrutura no atendimento, segundo eles, pois o parto normal feito em todo o Brasil submete a gestante a dores desnecessárias. Conforme os profissionais, o parto nos hospitais costuma ser feito com a mulher deitada, o que dificulta a saída do bebê.

As posições recomendadas para o parto natural deveriam ser de agachamento ou mesmo em pé, aproveitando a força da gravidade, conforme os médicos. Eles dizem que isso é comum em alguns países. “Quando a gente fala isso aqui, soa estranho e ninguém quer levar a sério”, afirmou uma médica que atua em hospitais públicos e privados, que pediu para não ser identificada.

Para ela, o parto normal não precisa ser sinônimo de sofrimento para as mães, porém, o modelo de saúde implantado no Brasil invariavelmente induz as pacientes a optarem pela cesariana. “Isso ainda se soma com a sugestão dos médicos, que preferem correr menos riscos ao lidar com a vida de duas pessoas ao mesmo tempo”, observou.

PROJETO – A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), junto ao Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo, e o Institute for Healthcare Improvement (IHI) estão desenvolvendo o Projeto “Parto Adequado”, com o apoio do Ministério da Saúde.

A iniciativa tem o objetivo de identificar modelos inovadores e viáveis de atenção ao parto e nascimento, que valorizem o parto normal e reduzam o percentual de cesarianas desnecessárias na saúde suplementar. No dia 27 de março foram anunciadas as instituições privadas selecionadas para participar do projeto. Este mês, os hospitais assinarão os termos de adesão e darão início às atividades. Apenas um hospital da região Norte, no Estado do Pará, foi inscrito no programa. (JPP)