Depois da Black Friday, o Dia do Comércio certamente é uma das datas mais importantes do setor no Brasil. Ao longo de pelos menos uma semana, empresas de diferentes segmentos realizam uma série de promoções para atrair os consumidores e comemorar a data com muitas vendas. Mas em 2022, parece que a festa foi suspensa.
Um levantamento inédito em âmbito nacional realizado pela proScore, bureau de crédito e authority de Score, baseado no seu índice autoral DPC (que dimensiona o Poder de Compras do Consumidor) demonstra que embora tenha apresentado uma sutil melhora de 76% no primeiro trimestre de 2022, frente aos 86% de 2021, quando atingiu o menor percentual de liquidez para o período dos últimos quatro anos, o poder de compra dos brasileiros segue baixo.
Ano
Percentual da população com liquidez completamente comprometida
2019
75%
2020
72%
2021
86%
2022
76%
Da amostra trabalhada, a proScore apurou que a diferença para as pessoas ainda com capacidade de consumo para assumir novos compromissos financeiros foram concentradas em 3 faixas, que demonstram que quanto maior seu percentual, maior a capacidade de adquirir bens e serviços de maior valor. O resultado foi o seguinte: Faixa 1 de 10% (5,3%), Faixa 2 de 20% (8,8%) e Faixa 3 de 30% (9,9%).
Faixas de liquidez disponível frente à renda
2022
2021
2020
2019
Faixa 1 – 10%
5,3%
3,2%
7,1%
6,2%
Faixa 2 – 20%
8,8%
3,2%
8,7%
5,8%
Faixa 3 – 30%
9,9%
7,5%
12,0%
12,8%
Diante desta constatação, justamente no início da semana do consumidor quando naturalmente ocorre uma chuva de ações de marketing e promoções que buscam estimular as vendas, segundo Mellissa Penteado, CEO da proScore, nem toda essa quantidade e diversidade de campanhas será capaz de animar os consumidores brasileiros.
“Esse baixo percentual significa que ainda temos um longo caminho a percorrer frente a todos os esforços da retomada econômica. Muitas lacunas monetárias como a falta de emprego e geração de renda e o aumento dos preços em diversos segmentos ao longo desses últimos 24 meses, infelizmente seguirão penalizando a circulação do dinheiro em si e comprometendo o poder de compra da população”, analisa a especialista.
Aumento do grau de endividamento
Outro índice apurado no estudo é o fator de endividamento potencial relativo que demonstrou uma tendência crescente de concentração do ticket médio de dívidas frente à geração de renda recorrente. Entre 2019 e 2020, momento pré e início da pandemia, tal fator indicava leve estabilidade, no entanto para 2021 houve um salto significativo de 28%, reforçado no levantamento de 2022.
Semestralmente monitorado pela proScore, o DPC aponta o potencial da liquidez do brasileiro e, consequentemente, o comportamento do seu grau de endividamento, que vem aumentando muito como reflexo da pandemia, mesmo sustentado por auxílios governamentais emergenciais.
“Exemplo disso é que na amostra modelada comparativamente nos dois últimos períodos, 17% dos consumidores que estavam sem potencial de liquidez em 2021 reduziram sua concentração de endividamento em 2022, enquanto 6% aumentaram esse mesmo índice”, destaca Mellissa.
Consumo x Poder de Compra
O Dia do Consumidor, que a cada ano vem se tornando globalmente conhecido, nasceu em 1962 e foi inserido na cultura norte-americana de consumo curiosamente com um pano de fundo histórico, quando o então presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, remeteu uma carta ao congresso americano externando suas preocupações sobre os direitos do consumidor, desde o momento das ofertas até a conclusão do pós-venda. No entanto, a data só foi comemorada pela primeira vez em território norte-americano em 1983, com o amadurecimento dessas discussões.
De acordo com Mellissa Penteado, claramente no Brasil a robustez da divulgação e celebração da data não tem outro intuito senão o de estabelecer uma relação de troca puramente comercial, onde o elo mais beneficiado, ao menos neste ano, certamente não será o próprio consumidor.
“Isso porque também não é desconhecido para ninguém o fato de que a inflação brasileira, hoje na casa dos dois dígitos, a reboque da inflação mundial e conjuntamente aos aumentos excessivos em bens de subsistência e consumo, está tornando a renda da família brasileira em faixas impotentes”, diz a especialista.
Mellissa explica que, na prática, significa que o poder de compra do cidadão, mesmo que estimulado por promoções, está tão limitado que a prioridade nesse momento é sobreviver. Em outros termos, manter a moradia, a alimentação, a saúde e o transporte ao emprego.
“Ou seja, por mais que essa data comercial queira celebrar uma possibilidade de reaquecimento econômico, do outro lado o consumidor em si, homenageado da vez, não é o protagonista. Ao menos não por querer e sim por não poder”, pondera.