A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu na quarta-feira (8) restringir os procedimentos oferecidos pelas operadoras de planos de saúde no País. Seis dos nove ministros integrantes do colegiado votaram a favor da fixação do rol taxativo da ANS (Agência Nacional de Saúde).
No julgamento no STJ, embora tenha seguido o voto do relator do caso, Luis Felipe Salomão, na defesa do rol taxativo, Villas Bôas Cueva estabeleceu quatro requisitos para garantir a segurança jurídica dessa regra e dissipar as tensões entre operadoras e pacientes.
São eles:
1. O rol da ANS é, em regra, taxativo;
2. A operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com pedido de tratamento não constante no rol, caso exista procedimento efetivo, eficaz e seguro capaz de garantir a cura do paciente e já esteja incorporado no rol;
3. É possível a contratação de cobertura ampliada, ou a negociação de aditivo contratual de procedimento que não esteja incluído no rol;
4. Não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol, pode haver a título excepcional a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistentes desde que: não tenha sido indeferido pela ANS a incorporação do procedimento ao rol; haja a comprovação da eficácia do tratamento a luz da medicina baseada em evidências; haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacional e estrangeiro, como Conitec e Natjus; seja realizado quando possível o diálogo interinstitucional dos magistrados com experts na área da saúde, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a justiça federal.
Mesmo antes da decisão, alguns planos de saúde já vinham negando procedimentos não oferecidos na lista da ANS.
Em Roraima, o pequeno Renato Varela, de quatro anos, foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA). No ano passado, um laudo médico recomendou tratamento intensivo e precoce com um acompanhamento multiprofissional, contínuo e por tempo indeterminado, com reavaliação periódica.
Mas nem todos os itens exigidos pelo neuropediatra eram oferecidos pelo plano de saúde do menino. Com isso, a mãe Yonara Varela, que é advogada, procurou a Justiça para garantir a assistência completa ao filho. A sentença e o acórdão foram favoráveis para o paciente.
“Meu filho faz 25 horas de terapia por semana e o plano de saúde não concede. Então, com essa negativa do plano de saúde em atender ao que está solicitado no laudo, a gente entra na Justiça, comprova que a pessoa é portadora de TEA, que a criança precisa daquele tratamento, que o plano de saúde tá negando o tratamento. Aqui em Roraima, a maioria dos juízes concede a liminar, entendem esse lado e obviamente fazem a aplicação da lei”, explicou.
No entendimento de Yonara, “caso o plano negue o tratamento, o paciente pode e deve procurar a Justiça e na Justiça será avaliado e concedido ou não”. “Na decisão do voto vencedor [no STJ], o rol foi considerado taxativo modulado, podendo caber restrições. Estão propagando que agora os planos não serão mais obrigados a atender fora do rol, não é bem assim”, explicou. “Os planos de saúde ganharam um ponto favorável nos argumentos que utilizarão nos processos”.
Por sua vez, a advogada Loide Gomes, presidente da Comissão de Defesa da Pessoa com Autismo da OAB-RR (Ordem dos Advogados do Brasil), vê com “preocupação” o entendimento do STJ. “[A decisão] pode afetar a vida de milhares de brasileiros que precisam dessa cobertura de planos de saúde. É uma decisão que afeta principalmente a pessoa com deficiência, com doenças raras ou incuráveis mas que a ciência está descobrindo novos tratamentos”
Conforme ela, o rol taxativo mitigado vai permitir que os planos de saúde neguem tratamentos que não estejam previstos nessa lista pré-estabelecida, embora a saúde seja um direito com acesso universal e cabe ao médico prescrever a assistência que o paciente deve receber.
Loide acredita que a discussão jurídica sobre o assunto não se esgota nesta decisão e deverá ser levada para apreciação do STF (Supremo Tribunal Federal).
Além disso, ela defende que o rol taxativo seja debatido no Congresso Nacional. “Que tenhamos uma lei que defina que o rol é exemplificativo e não taxativo. É o médico que decide juntamente com o paciente o tratamento que deve ser adotado e não o plano de saúde amparado por uma lista de procedimentos definida por ato administrativo de um órgão vinculado ao Ministério da Saúde”, declarou.