Roraima era o último Estado brasileiro que o maranhense Luiz Thadeu Nunes e Silva, de 63 anos, ainda não conhecia. Conhecido por dar volta ao mundo de muletas, o engenheiro agrônomo aposentado ficou encantado pelo pouco que viu da capital Boa Vista nessa segunda-feira (3).
“A cidade de vocês é linda. Bem planejada”, contou à Folha depois de visitar rapidamente pontos turísticos na área central da cidade, como a Praça das Águas e o Parque do Rio Branco. Até quarta-feira (5), ele pretende fazer um “bate-volta” nas fronteiras do Brasil com a Venezuela e a Guiana.
Dezenove anos atrás, Luiz Thadeu sofreu um grave acidente de trânsito em uma rodovia que corta Mossoró (RN), que o deixou com mobilidade reduzida para o resto da vida.
“No final de uma tarde chuvosa, o motorista de táxi foi atender o celular, perdeu o controle do carro, jogou pro meu lado, e eu não tava na frente. Se eu tivesse na cadeira do lado dele, eu tinha morrido. Batemos de frente com um caminhão. A pancada foi tão grande que o motor do carro avançou, a cadeira da frente do lado do motorista esmagou minha perna atrás, tive fratura exposta de fêmur”, lembrou, sem traumas.
Detalhes de sua trajetória e visita por todo o mundo foram contados no livro “Das muletas fiz asas: A história do viajante que venceu suas limitações e ganhou o mundo”, cujo prefácio foi escrito pela jornalista Sandra Coutinho, correspondente da TV Globo em Nova Iorque. Hoje, ele também é estudante de Jornalismo e produz crônicas sobre situações do dia a dia e das próprias viagens – textos que são veiculados há mais de um ano em ao menos 22 jornais brasileiros.
Luiz Thadeu enfrentou 43 cirurgias para reconstituição de sua perna esquerda em um intervalo de cinco anos (dois só com a perna imóvel), sem contar as inúmeras sessões de fisioterapia. Ele resolveu superar as “viagens” ao hospital ao escolher andar pelo mundo, mesmo que de muletas e sem falar outro idioma além do português. Hoje, a comunicação com estrangeiros é feita só pelo aplicativo de celular Google Tradutor.
Após visitar 150 países em cinco continentes da Terra, Luiz Thadeu concluiu que o Brasil, onde ao menos 17,3 milhões de pessoas possuem algum tipo de deficiência, segundo o último levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ainda precisa aprender muito a se adaptar à realidade desse público.
“Isso é um problema sério, porque tem que ter políticas públicas pra poder mudar esse quadro. Aqui em Boa Vista, tem necessidade de mais rampas, de uma série de coisas pequenas que mudariam, que iriam fazer um grande bem pras pessoas que tanto necessitam”, avaliou.
Todas as viagens, afirma ele, são custeadas pelo próprio bolso e são realizadas sozinhas. “Minha mulher me aceita, sabe da minha promessa, do sacrifício que passei. Ela e meus filhos ficaram comigo o tempo todo na minha recuperação. Hoje tem a lei da compensação: vou chegar agora [a São Luís-MA, onde mora], ela vai pro Rio de Janeiro, porque a gêmea dela mora lá”, contou.
Em época de efeitos econômicos catastróficos impostos pela pandemia da Covid-19, em que o preço da passagem aérea subiu nas alturas, Luiz Thadeu afirma que a opção mais barata é viajar com milhas.
Daqui pra frente, sua meta inclui: ser a primeira pessoa com deficiência no mundo a andar de muletas na Antártida – um continente gelado não pertencente a nação alguma e que fica no extremo Sul do globo; conhecer a Islândia, o país insular no extremo Norte do planeta que é o único da Europa que ainda não visitou; e visitar a Guiana, a Guiana Francesa e o Suriname, os únicos países da América onde ainda não foi.
“A minha meta é conhecer os 194 países. E eu tou fechando os continentes […]. Eu fechei agora nessa viagem à América Central, são 20 países. Já conhecia 13 e faltavam sete e eu viajei agora […]. Do dia 1º a 30 de setembro, percorri sete países da América Central”, lembrou. “Minha matéria-prima são os sonhos. No dia que eu deixar de sonhar, eu deixo de existir”.