César Cheres tinha 29 anos quando viu, na casa da vizinha, uma criança de nove anos jogando xadrez em um tabuleiro amadeirado. Sem ter concluído o Ensino Fundamental e sem emprego fixo, mal ele previa na época que a modalidade mudaria o rumo da sua trajetória de vida.
“Perguntei pra ela se podia me ensinar. Achei super interessante e a partir daquele momento aprendi”, lembrou ele, que voltaria a reencontrar o xadrez após sofrer um acidente e ser internado no hospital. “Tinha um rapazinho que jogava xadrez lá, comecei a jogar com ele e perdia todas”.
Perder viraria rotina nas primeiras competições que Cheres disputaria, mas a insistência mudaria seus resultados nos tabuleiros e na vida. “Nunca desisti. Até então, eu não tinha estudo algum, eu não tinha nem a sexta série ainda. Pra que a gente evolua no xadrez, a gente precisa estudar, buscar literatura no xadrez e a modalidade, por si só, desenvolve a mente da pessoa, o raciocínio, a concentração – coisas que eu não tinha”, disse.
Graças ao xadrez, César Cheres voltou a estudar, concluiu os ensinos Fundamental e Médio e ingressou no antigo Cefet (atual IFRR) aprovado em primeiro lugar para o curso de Agrimensura. Depois, ele ingressou no curso de Geografia na Universidade Federal de Roraima (UFRR). Ele não concluiu os cursos, pois decidiu se dedicar aos filhos e ao trabalho.
“Quando me vi concentrado para o xadrez, eu observei que absorvia conhecimento nas minhas leituras e a partir de então comecei a estudar novamente e eu tive muito sucesso”, afirmou, lembrando ainda de ter passado para dois concursos, um deles em 16º lugar entre três mil candidatos para agente de trânsito municipal de Boa Vista, cargo que ele ocupa desde 2005. “Tudo isso eu devo ao xadrez”, diz ele, que conquistaria títulos municipais e ainda se tornaria presidente da Ferox (Federação Roraimense de Xadrez).
De pai para filha
César Cheres não se contenta em guardar conhecimento para quem quer que seja, muito menos para a filha Beatriz Cheres. Hoje, aos 15 anos, ela é considerada uma das melhores enxadristas do Estado em sua categoria e já “cansou” de vencer o pai nos jogos. “Agora, minha filha tá passando conhecimento pra mim. Eu não consigo mais vencê-la. Ontem joguei quatro partidas, perdi cinco (risos)”, rememorou ele.
Desde que aprendeu o xadrez (quando tinha cinco anos), Beatriz contabiliza quase 40 medalhas, a maioria de ouro. O último título foi conquistado no último sábado (10), pela categoria feminina Sub-18 do Torneio Amigos do Xadrez, que lhe garantiu no Floripa Chess Open, em Florianópolis – com passagens aéreas pagas para participar do maior torneio aberto do Brasil.
“O meu pai jogava bastante quando eu tinha cinco anos de idade, sempre tinha amigos dele indo lá pra casa, e eu o via jogando sempre. Também tinha vários tabuleiros espalhados pela casa e eu me encantei pelo esporte”, lembrou.
Xadrez nos detalhes
Após descobrir o xadrez, o pai da Beatriz reencontraria a menina que lhe apresentou à modalidade (já adulta e professora) em duas ocasiões marcantes – uma delas na escola onde a filha dele, na época com oito anos, foi campeã pela primeira vez.
“Uma história de início do meu aprendizado que emenda com minha filha sendo campeã. Devo tudo a essa garota e tudo ao xadrez, porque através do xadrez, cuidei de mim e agora estou cuidando de outras pessoas”, declarou César Cheres, que agora ensina o esporte a quem lhe pede. “O xadrez, antes de ser tudo isso, é segurança pública, porque quem o pratica, de criança a adulto, não parte para a prostituição, criminalidade e as drogas. Tem a vida direcionada para o sucesso”.
*Por Lucas Luckezie