Candidato a deputado estadual nas eleições 2022, D.L.A, de 38 anos, é acusado de aplicar golpes de empréstimo em servidores públicos enquanto trabalhavam na Secretaria Estadual de Cidades (SeCidades). Na pasta, ele trabalhou por seis meses. Denúncia também cita que ele teria deixado em aberto dívidas em nome de uma das vítimas pelo aluguel de carros para a campanha eleitoral. No ano passado, o suspeito terminou como quinto suplente de seu partido ao receber 230 votos.
Existem ao menos cinco boletins de ocorrência registrados contra ele: dois por ameaça, dois por estelionato e um por extorsão. A Polícia Civil diz investigar o caso. Os valores alegados nas denúncias somam prejuízo de, pelo menos, R$ 18.127,58, sem incluir juros correções. O suspeito nega todas as acusações e promete honrar com todos os compromissos (leia o posicionamento completo ao final da reportagem).
Segundo o grupo de denunciantes, que admite ingenuidade a ponto de ceder senhas de cartões de crédito por acreditarem que isso seria um procedimento normal na SeCidades, D.L.A. os chamou para trabalhar na campanha eleitoral do ano passado em troca de cargos comissionados no governo estadual – para um deles, o então candidato descumpriu a promessa. Ademais, acusam-no de ter usado dados da ficha cadastral de cargo comissionado para fazer empréstimos em nome deles, e que não teriam condições de arcar com o prejuízo, tampouco advogados para recuperar o montante.
Uma das denunciantes é a autônoma J.M.A, 25, ex-servidora da SeCidades (com salário de R$ 2.275,78). Atualmente se mantendo com a venda de acessórios de celular, ela afirma que o acusado teria feito em seu nome um empréstimo de R$ 6 mil, o que lhe resultaria em prejuízo de R$ 38,4 mil após terminar o pagamento de 96 parcelas. “Como a gente estava vulnerável ao emprego, acabamos caindo nessa”, destacou. “No momento em que chegamos a cobrá-lo, ele agiu de forma cruel com a gente, com ameaças, tanto da parte dele, quanto do irmão dele, que é agente penal”.
Nomeada em abril de 2022, ela disse que assim que D.L.A. teria feito o empréstimo em seu nome logo no primeiro pagamento. “Ele sempre falando: não fala pra ninguém, é normal da secretaria”, relata sobre quando o indagava acerca da razão do desconto na conta bancária.
J.M.A. revelou à Folha o áudio enviado pelo então candidato, que poderia provar que ele teria lhe ameaçado por ter um irmão policial penal. “Eu tenho paciência de Jó, ele não. Se eu fosse você não passava na frente dele não”, disse o acusado. “Respondo por mim, meu irmão não, é todo ‘despingolado’, só tou falando um recado”, completou na gravação.
A reportagem teve acesso ainda a um boletim de ocorrência feito por A.V.R.S., 25, que diz ter aberto uma conta salário e emprestado o cartão ao suspeito, que teria gastado todo o limite de R$ 2.387,58, usado R$ 440 do cheque especial e demorado a devolver o pertence, pedindo ainda para não contar a ninguém. “Nunca devolvia e sempre que eu pedia o cartão, dizia que ia devolver e falava da vaga de emprego que estava garantida e ia ser minha”, relatou.
Por sua vez, o montador R.N.L., 56, relatou à polícia ter descoberto um empréstimo não autorizado de R$ 3,8 mil em seu nome, enquanto trabalhava no Governo de abril a dezembro de 2022. O acusado teria pedido o dinheiro que caiu na conta, pois supostamente pertencia à secretaria. A vítima entregou o montante por acreditar no acusado. “Ele falou que a secretaria tinha mandado pra ele esse dinheiro, que não tava podendo enviar na conta dele por causa da política”, explicou.
Outros denunciantes, que atualmente recebem um salário mínimo como agentes de portaria, também alegam ser vítimas. M.L.S., 27, declarou ter sido chamado para trabalhar na campanha eleitoral em troca do cargo de assessor especial da SeCidades (salário de R$ 3.613,77), antes ocupado pelo suspeito. Ele o acusa de emprestar, em seu nome, em torno de R$ 5 mil. “Aí veio mais um empréstimo feito, totalizando R$ 20 mil a R$ 21 mil de dívida”, relatou.
J.S.A., 21, por sua vez, acusa D.L.A. de deixar dívidas em torno de R$ 6,5 mil em seu nome adquiridas durante a campanha eleitoral passada, pelo aluguel de dois carros. “Ele solicitou meu cartão de crédito e através disso, ele disse que iria arranjar um emprego pra mim […]. O meu nome foi até pro Serasa por causa disso”.
O que diz a SeCidades
Procurada, a SeCidades disse desconhecer qualquer tipo de ação que utilize o nome da pasta em benefício de servidor, que repudia esse tipo de atitude e promete adotar as medidas administrativas que o caso requer.
A secretaria detalhou que o acusado entrou na secretaria por processo seletivo em 28 de dezembro de 2021, onde permaneceu cadastrado até 17 de março de 2022. Em abril de 2022, ele foi nomeado assessor especial (cargo comissionado) e desligado em 1º de julho de 2022 para concorrer ao cargo de deputado estadual.
Conforme o Portal da Transparência governamental, em 2022, o ex-servidor recebeu salários diferentes até o desligamento. Em janeiro, ele trabalhou com cadastro de campo da Secretaria Estadual de Articulação Municipal e Política Urbana com salário de R$ 1.716,85, mas em fevereiro, recebeu R$ 2 mil, enquanto em março, R$ 1.066,67.
Em abril, quando passou para a SeCidades, começou a receber R$ 2.891,02 como assessor especial. Em maio e junho, no entanto, seu salário foi de R$ 3.613,77.
Questionado sobre essa variação salarial, o governo estadual esclareceu que o salário varia de acordo com a nomenclatura do cargo comissionado e que, no caso dele, a diferença se deu “em função da troca de cargo, calculados os dias trabalhados e, nos meses seguintes, o valor foi bruto (todo o mês)”.
O que diz o acusado
Em entrevista à Folha, D.L.A. negou todas as acusações, disse que os denunciantes sabiam dos empréstimos, prometeu honrar com todos os compromissos e pagamentos pendentes, admitiu ter ficado “aperreado” financeiramente após a campanha por recusar o fundo partidário e citou possível abandono de parceiros e colaboradores depois das eleições. Para ele, as denúncias são uma “armação”. “Na cabeça deles: já que você não vai nos ajudar, nós vamos te prejudicar”, interpretou.
No decorrer de sua defesa, D.L.A. disse ser reconhecido pelo trabalho em prol do esporte e ter sido empresário. O acusado disse que, no mês passado, ficou “sem um real em conta” e que buscava alternativas para resolver as pendências, como um acordo para retornar ao Governo.
Ele demonstrou surpresa com as denúncias e perfilou a autônoma que o denuncia, ao sugerir que: ela possui “paixão platônica” por ele e de ter motivado o fim de seu casamento no passado; que ela teria dupla personalidade. Apesar disso, ele teria dado à autônoma uma oportunidade de trabalho no Governo. Prometeu, ainda, revelar em juízo verdades sobre ela.
No caso da autônoma, ele afirma que ela teria feito o empréstimo de “livre e espontânea vontade” para ajudar sua campanha, com a condição de que ele pagasse as mensalidades.
Sobre as supostas ameaças, disse que nem ele, tampouco o irmão policial penal ameaçaram alguém e explicou o contexto do áudio enviado à autônoma, ao dizer que ela, na companhia do marido J.S.A. teriam ameaçado de morte na casa de seus pais.
“Se chegam na tua porta, alguém vai chegar batendo o pé na tua porta, falando mal de um parente teu, qualquer um de nós iria reagir. O que ele falou: vou te dar uma oportunidade de não vir mais aqui na minha porta, meu pai não fez negócio com você, vai atrás do meu irmão. Se isso for ameaça, eu seguro isso na frente de qualquer juiz. Foi isso que foi falado”, disse, explicando que não denunciou o casal por ser questão de “momento”.
Acerca do aluguel de veículos, D.L.A. revelou conversa com J.S.A. de que, após a campanha, não teria como pagar a dívida gerada e, como garantia, deu a ele seu celular para abater parte do valor. “Se eu fosse estelionatário de má-fé, eu teria feito um negócio desse? Estelionatário é quando engana a pessoa, falsifica documento. Jamais isso aconteceu”, defende-se.
Ele corrigiu ainda os valores apresentados em duas das denúncias, ao dizer que emprestou R$ 5 mil em nome de J.M.A. e R$ 12 mil de M.L.S.
*Por Lucas Luckezie