Jessé Souza

O drama dos indios Yanomami transformados em trapos humanos 11638

 O drama dos índios Yanomami transformados em trapos humanos

Jessé Souza

As imagens nos remetem a uma indignação a cada vez que circulam nas redes sociais. Mas logo são esquecidas. Refiro-me às fotos dos índios Yanomami jogados ao relento em praças públicas, meio-fios e postos de combustíveis.

Esta deprimente situação tem várias origens, a começar pelo  histórico descaso da política indigenista adotada pelo Governo Federal. Não é recente, mas ela só piorou na atual administração, que é declaradamente a favor do garimpo, incentivando principalmente a invasão das terras indígenas.

Um vídeo circulou recentemente mostrando índios Yanomami visivelmente embriagados em uma confusão generalizada entre barracos e máquinários de um garimpo. A cena foi gravada por um garimpeiro que narrava o enfrentamento entre indígenas.

Ali é apenas parte do drama daquele povo, submetido a repetidas invasões garimpeiras. O garimpo representa a ausência completa do Estado, que não consegue chegar lá com seus projetos para garantir que eles possam sobreviver com dignidade, seja por meio de seus próprios recursos ou por meio de projetos de autossustentação que reforcem sua subsistência.

Largados à própria sorte, o garimpo passa a ser uma ilusão por meio do alcoolismo ou das esmolas para que eles sejam coniventes ou mesmo participem da exploração mineral. No final, vão restar apenas mais pobreza, um ecossistema devastado e a dependência do que o garimpeiro levou junto, além das doenças, alcoolismo, prostituição e desestruturação de suas comunidades.

Mas há aqueles que, largados em suas terras, acabam vindo para a cidade por meio da BR-210, conhecida como Transamazônica desde a década de 1970. É por esta rodovia que eles chegam principalmente no Município de Mucajaí, onde se entregam às bebidas alcoólicas, que os transformam em pedintes e trapos humanos desprezados pela sociedade.

Os que chegam a Boa Vista são uma minoria, os quais acabam saindo da invisibilidade social quando são fotografados e filmados em situação degradante. A mais recente foi uma foto em que dois Yanomami estão jogados em uma ciclovia, mostrando que a sociedade ainda segue despreparada para lidar com esta situação ou menos conivente.

O órgão indigenista, a Funai, mal consegue lidar com os problemas corriqueiros, afetada pela política que vem de cima pra baixo de um governo que também se declarou anti-indígena. Este órgão é o responsável por criar uma rede de proteção para evitar que isto ocorra, mas sequer consegue combater a invasão de suas terras.

A sociedade foi habituada a acreditar que o garimpo seria a solução para o problema do desemprego e do desenvolvimento econômico do país, por isso uma parcela significativa da população acha que o problema é o índio, não restando sequer a empatia por este povo.

Esse momento crítico de crise enfrentada pelo brasileiro, ampliada pela pandemia que provoca mais desemprego, reforçada pela defesa do garimpo pelos políticos, acaba refletindo na corrida pelo ouro nas terras indígenas. E tudo isso sob um governo perdido, que sequer consegue administrar a crise da vacina, enquanto os demais problemas avançam.

A cena de índios jogados ao relento, nocauteados pela bebida alcoólica, revela apenas parte do grande problema que vem de longas datas. E tudo é logo esquecido até surgir uma nova foto ou vídeo de indígenas jogados na praça ou se enfrentando numa área de garimpo.

*Colunista