Opinião

OPINIAO 10740

AS NOVAS ORGANIZAÇÕES FAMILIARES

Dolane Patrícia*

Ana Cláudia Araújo**

Devido as mudanças ocorridas em nosso ordenamento jurídico e na sociedade brasileira, uma nova perspectiva surge e se instala no Direito de Família, englobando valores e princípios que transcendem aos termos civis e constitucionais já existentes, alcançando os direitos fundamentais explícitos em nossa Constituição Federal, formando um alicerce normativo que proporciona uma maior amplitude de alcance e aplicabilidade.     

A importância deste tema traz grande relevância social e jurídica, pois é algo que se estende e se reflete na sociedade como um todo. Tal fato pode ser explicado através da evolução histórica da família, no qual a sociedade se depara com esta mudança de parâmetros e pensamentos, na qual é introduzida uma nova forma de pensar e agir, não se baseando mais pelo o velho e conhecido tradicional que era imposto e até mesmo recomendável nas décadas anteriores.

Tal acepção decorreu de diversos fatores históricos, sociais e culturais, se comprovando na própria Constituição Federal vigente, já que esta inova ao admitir a existência de outras espécies de famílias, não se prendendo ao casamento civil como único elemento formador familiar, mas também a novos elementos, como a convivência de pessoas, não somente oriunda do matrimônio, mas sim do vínculo afetivo.

Devido a todos estes elementos transformadores citados, a estrutura familiar tornou-se mais maleável, ou seja, adaptável as concepções atuais da humanidade.  E isso acaba por justificar uma maior valorização da função afetiva da família.

Sob esse aspecto, se introduz a problemática do abandono afetivo relacionado com a valorização do afeto na ciência jurídica, tema que, recentemente, vêm gerando grandes demandas no âmbito jurídico brasileiro, observando-se a necessidade de responsabilizar os responsáveis legais da criança ou adolescente, caso descumpram os encargos do poder familiar, que podem causar danos, como as lesões psicológicas e afetuosas irreversíveis ao filho menor, que se encontra em um estágio de desenvolvimento, inteiramente dependente do vínculo afetivo.

Neste ínterim, refere-se justamente a análise das consequências do desamparo afetivo praticado por genitor ou responsável, legal à criança e o adolescente, tendo como decorrência a responsabilidade civil pelo o ato ilícito praticado, e se resulta na obrigação de indenização.

Desde o princípio dos tempos, a família sempre desempenhou um papel de fundamental importância na vida do homem, sendo base e alicerce no início de suas formações e opiniões, no modo de ver o mundo e de ser inserido neste.

Anteriormente ao surgimento das novas modalidades de famílias, existentes na sociedade atual, o conceito de família clássica definida pelo Código Civil de 1916, era essencialmente hierarquizada e patriarcal, fundada somente no casamento, e definida “como um conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo da consanguinidade, cuja eficácia se estende ora mais larga, ora mais restritamente, segundo as várias legislações. Outras vezes, porém, designam-se, por família, somente os cônjuges e a respectiva progênie”, de acordo com Clóvis Beliváquia.

Todavia, já se fazia necessário ceder novo espaço à família contemporânea, no qual é admitida a felicidade individual ou coletiva, tendo como fundamento a conduta humana moral, focando na realização pessoal de seus membros, que são ligados por laços afetivos.

A doutrinadora Maria Helena Diniz discorre sobre “família no sentido amplo como “todos os indivíduos que estiverem ligados pelo vínculo da consanguinidade ou da afinidade, chegando a incluir estranhos. No sentido restrito é o conjunto de pessoas unidas pelos laços do matrimônio e da filiação, ou seja, unicamente os cônjuges e a prole”.

Uma vez que houve essas transformações, na Constituição Federal de 1988, o conceito jurídico de família foi ampliado, reconhecendo-se outras entidades familiares, tendo artigo 266 exemplificado a ascensão dessas novas modalidades de famílias.

Nesse sentido, há a presença de diferentes formas de organização familiar que convivem juntas entre si, como as famílias tradicionais pai, mãe e filhos; as famílias monoparentais, onde um dos pais vive com os filhos; as famílias recasadas, nas quais surgem novos membros, como padrasto ou madrasta; famílias ampliadas, compostas por parentes diretos ou colaterais, existindo extensão das relações entre pais e filhos para avôs, avós, netos; famílias ditas não convencionais, que escapam às fórmulas pais, mães e filhos. São tias que viraram mães, avós que viraram pais, etc.

É como diz a frase de um autor desconhecido: “Com o tempo descobrimos que fazemos parte de duas famílias, a primeira é a família genética, aquela onde nascemos e crescemos, a outra família é aquela que é composta pelas pessoas com as quais criamos os laços da amizade verdadeira e os chamamos para morar dentro de nosso coração.”

*Advogada, juíza arbitral, Pós Graduada em Direito Processual Civil e Direito de Família, Pós-graduanda em Direito Empresarial. Mestre em Desenvolvimento Regional da Amazônia, Personalidade da Amazônia e Personalidade Brasileira. Acesse: dolanepatricia.com.br.#dolanepatricia

**Advogada

Vacina, esperança com prudência

Roberto Rohregger*

A humanidade já passou no decorrer da história vários períodos em que surtos de novas doenças causaram uma quantidade enorme de vítimas. Desde a primeira grande pandemia que temos registro, a peste negra, que ocorreu no período de 1347 a 1351 e que matou em torno de 75 milhões de pessoas, até a epidemia da AIDS, com outros milhões de mortes. De forma geral, nestes momentos temos um quadro de eventos que normalmente a sociedade e governos não estão preparados para tratar, e normalmente a resposta a estas epidemias são lentas, causando pânico entre a população.

Estamos vivendo uma nova pandemia, apesar de vários avisos de ocorrências em um passado recente, como o Ebola. O mundo ainda não está totalmente preparado para o combate a estes acontecimentos, e, é fato que neste período extenso de quarentena e de severas medidas sanitárias, com a economia profundamente afetada, a população está ficando cansada e insegura. Aliado a estes fatores, ainda temos uma certa politização da pandemia com informações conflitantes ente governos, cientistas e muitas fake news, contribuindo ainda mais para um quadro de confusão em relação aos procedimentos, e cuidados.

Neste momento, a maior esperança que se tem propagado é do desenvolvimento de uma vacina, que seria uma grande vitória. Várias instituições no mundo inteiro estão pesquisando o desenvolvimento de uma vacina, a partir de diversas concepções, e algumas encontram-se em um estágio bastante avançado. A última e inesperada novidade é a vacina desenvolvida na Rússia e anunciada num clima de vitória por Wladimir Putin. Esta notícia, porém, foi recebida com muita cautela por toda a comunidade científica, primeiro por não haver nenhuma publicação de estudos consistentes sobre o desenvolvimento da vacina e, pela falta de transparência com relação aos testes efetuados para a aprovação.

O risco nisto tudo é que, também o desenvolvimento de uma vacina possa ser politizado, e neste caso a pesquisa não siga os rígidos preceitos necessários, desde o seu desenho até a fase
final com a devida comprovação de sua eficácia, afinal uma vacina além de comprovadamente eficiente contra o vírus, também tem que garantir que não haja efeitos colaterais que possam ser piores que o bem que promete. Neste momento é preciso ter prudência tanto na divulgação de uma efetiva cura, quanto ao tempo em que uma vacina possa ser disponibilizada para a sociedade, visando não gerar falsas expectativas e assim vir a tornar-se mais um empecilho em relação a manutenção dos cuidados de prevenção ao contágio.

Na concepção clássica das virtudes, a prudência sempre foi considerada uma das mais importantes, como afirma Tomás de Aquino, na Suma Teológica, “é a principal em uma ordem superior, é a mãe das virtudes”. Na contemporaneidade, o filósofo Hans Jonas afirma no livro Técnica, Medicina e Ética que, “a cautela se converteu em virtude superior, perante a qual retrocede o valor da ousadia, melhor ainda, esta se transforma inclusive no valor da irresponsabilidade”, desta forma é preciso exigir que governos atuem com prudência, obedecendo os preceitos necessários de testes e de segurança, haja visto que um dos preceitos da bioética é o princípio da não-maleficência. Deve-se garantir que um procedimento além de promover o bem, também garanta que não haverá efeitos negativos, que signifique riscos para a saúde dos indivíduos.

A vacina é uma ótima notícia, mas deve ser encarada de forma realista, e os governos devem agir de forma transparente, informando a sociedade, e submetendo-se aos necessários rigores da ciência.

*Teólogo e mestre em Bioética. Professor do curso de Teologia do Centro Universitário Internacional Uninter.