Opinião

Opiniao 16 07 2019 8563

O jardineiro – Francisco Habermann

Nada na vida se consegue sem o suor do trabalho. Isso todo mundo sabe. Mas tem algo que descobri com um jardineiro muito especial, dedicado.

Aqui em Botucatu-SP, conheço o senhor José Roberto dos Santos, um atento profissional do cuidado com as plantas. Cuida delas com tanto desvelo que às vezes se esquece de si mesmo. Dedica-se tanto no seu desempenho profissional que minimiza o seu próprio repouso garantido por lei. É o que venho observando com o passar dos anos, acompanhando-o em suas atividades. Nunca falta ao trabalho, mesmo nos feriados.

Já o vi trabalhando em datas como natal, carnaval, sexta santa, primeiro de janeiro e, entre outros, até no dia do trabalho. ‘As plantas não sabem se é feriado’, ele diz. O José Roberto trabalha para a alegria das plantas, o que me faz refletir.

Ando intrigado com a exploração desatenta que fazemos com o reino mineral, vegetal e animal, no nosso jardim que é a Terra. Sem falar da lamentável e perigosa contaminação das águas. Nem vou enumerar aqui os desastres decorrentes dessa exploração desenfreada, pois os jornais diários dão conta do assunto ( e das investigadas propinas inclusas ). 

Se não cuidarmos deste jardim, sucumbiremos e teremos que procurar outros planetas para a sobrevida da espécie. Aliás, já se está pensando nisso, tal o descuido acumulado nos últimos tempos da era consumista que atravessamos. Nosso descuido tem várias facetas.

Por fazermos parte do jardim temos que administrar o relacionamento do planeta com seus ocupantes e destes entre si. Não temos o direito de ocupar irresponsavelmente e de modo ilimitado todos os espaços deste planeta; não podemos explorar o reino mineral, vegetal e, especialmente o animal ( fazemos parte deste ) irresponsavelmente; cuidar da criação – nossos companheiros de jornada – é uma obrigação. Não podemos ameaçar – como estamos ainda fazendo – a existência das espécies animais, o equilíbrio vegetal e mineral nesse jardim tão especial chamado Terra. Portanto, somos dependentes do equilíbrio ecológico, nitidamente em perigo.

Assim, acho que o exemplar cidadão aqui citado tem razão em cuidar com o maior respeito do jardim. Ele dá o exemplo com a sua dedicação ao trabalho – até no Dia do Trabalho – e com seus cuidados profissionais. Chega a pedir desculpas às formigas cortadeiras ( as ‘quenquém’ , da família Acromyrmex, semelhantes à saúva ) quando protege as plantas ornamentais. Cidadão consciente da vida planetária. Um jardineiro diferenciado.

As flores e frutos do jardim da vida agradecem.

Nós também!

*Professor da Faculdade de Medicina da Unesp em Botucatu. Contato: [email protected]

Um cara inesquecível – Walber Aguiar

“Você que é sem nome, que zomba dos outros, você que faz versos, que ama, protesta.” (Drummond)

Chegou voando no Camilo Dias. Quase na hora de dar sua aula. Ainda assim, tentava travar a roda viva do cotidiano. Dar um tempo na correria das horas, no ponteiro escravizador que ameaçava domar vontades e desejos. A fragilidade contra a estrutura perversa, a beleza da simplicidade contra a perversidade do sistema sem vida.

Assim era Mário. E Vai continuar sendo. No imaginário dos alunos, no inconsciente coletivo da rapaziada. Sorriso de menino, bicicleta, cabelo ao vento. E a figura surgia. Ele estava sempre disposto a conversar. Com a “Cult” ou “Caros amigos” debaixo do braço e dos olhos, Mário enriquecia o bate papo com seu jeitão simples e sua cabeça carregada de memórias.

Intelectual, eclético, buscava compreender a vida pelas páginas da história. Entendeu o opressor, o oprimido, a revolução. Trouxe para os alunos a contextualização das coisas, a fim de que o dado histórico não fosse um acontecimento solto, perdido, estanque. Com a cabeça devidamente feita, Mário nunca se deixou alienar pelo poder da ilusão ou pela ilusão do poder. Pelo contrário, sempre correu atrás da verdade, ao perceber o engano, a farsa, a brecha ideológica.

Quero saber agora como vão ficar as tardes bucólicas sem a sua presença. O papo solto do outro lado do rio, onde perseguíamos a liberdade. A sala de aula sem a leveza do maestro que regia. Drummond vai ficar mais tedioso, Bandeira menos lírico, Gullar menos incisivo, Augusto dos Anjos mais sorumbático, casmurro. A doçura poética ficará mais amarga, pois a metaforização se perderá na cinza das horas.

Mesmo inteligente, Mário não era chato. Afeito a leitura Nietzscheana, ele dizia: “Mudei-me da casa dos eruditos e bati a porta ao sair. Por muito tempo a minha alma assentou-se faminta à sua mesa. Não sou como eles, treinados a buscar o conhecimento como especialistas em rachar fios de cabelo ao meio. Amo a liberdade. Amo o ar sobre a terra fresca. É melhor dormir em meio às vacas que em meio às suas etiquetas e respeitabilidades”.

Mário “medusa” era assim mesmo, o bicho. Nele residia o paradoxo da força e da fraqueza. Do simples e da complexidade. Era apaixonado pela vida, pelos amigos e pela banda Carolina Cascão, com o velho Avery e o imprevisível Rubinho.

Sempre levava uma mochila. Nela carregava esperança e dignidade. Despojamento e grandeza. Infelizmente, a grandeza que portava faltou aos médicos que o jogaram num canto qualquer, num hospital de Porto alegre, teoricamente um grande centro. Omissão, indiferença, infecção hospitalar.  

Foi uma porrada a notícia de sua morte. Não deu tempo de ver o camarada pela última vez. 

Nem pude ir ao velório ou ao sepultamento. Pelo simples fato de não saber que ele havia morrido. Mas sempre vou fazer um poema no final da tarde. Um poema crepuscular, cheio de fogo e vida. Um poema para o grande Mário Wander. E visitar seu túmulo, onde Remato diz: agimos certo sem querer, foi só o tempo que errou, vai ser difícil sem você, porque você está comigo o tempo todo…

Era um dia como outro qualquer. Talvez nem fosse. Mário pensou na praia grande, no último papo, na última cerveja, questionou a Deus e foi dormir um pouco. Porque ninguém é de ferro…

*Poeta, historiador, professor de filosofia e membro da Academia Roraimense de Letras [email protected]

Na democracia – Afonso Rodrigues de Oliveira

“Da mesma forma que não quero ser escravizado ou espoliado, não quero escravizar nem espoliar. Tal é minha concepção da democracia. Tudo o que dela difere não é democracia.” (Abraham Lincoln)

Como você vê a democracia? Não é tão simples assim, quando não somos politicamente preparados para ela. E, lamentavelmente, ainda não somos nem estamos preparados. E o pior de tudo é que ainda não percebemos isso, para que possamos nos preparar. Já falei pra você do dia em que eu ia passando pela porta de saída do Fórum João Mendes, em São Paulo. (Porta de saída a que me refiro é a porta por onde os poderosos saem). Mas vamos lá: eu passava, com o pão para o café da tarde, quando uma autoridade saía, acompanhado por seguranças. Eu ia pela calçada, claro. Mas tive que pular para o lado para não ser atropelado pela autoridade que não deu a mínima bola para minh
a presença. E viva a democracia brasileira.

Estamos percebendo que vai haver mudanças na nossa política. Mas mudanças não ocorrem do dia para a noite. Ela exige muita educação. Que é exatamente o que não temos o suficiente para sermos um país democrata e democrático. Mas também não tenho dúvida de que estamos fazendo nossa parte. Mas ainda temos muito que aprimorá-la para que tenhamos o que queremos, desejamos e teremos. Comece sua caminhada pensando alto, mas sem nadar nas nuvens. Médico carioca, Miguel Couto já nos disse isso há quase um século: “No Brasil só há um problema nacional: a educação do povo.”

Eu ainda era criança quando, no ensino primário, li na capa do meu caderno escolar: “A educação é como a plaina: aperfeiçoa a obra, mas não melhora a madeira.” Quantos educadores já prestaram atenção a essas pérolas? Sabemos que não devemos criticar quem cometeu o erro apenas porque ele o cometeu. Precisamos analisar o porquê da ação. E é aí que devemos ser mais cautelosos na nossa escolha política. Porque sabemos que a educação começa no lar. Não interessa o berço em que você nasceu. O que interessa é a atenção que você recebeu nele. Porque é aí que aprendemos sem saber que estamos aprendendo.

Vamos nos preparar para as próximas eleições. Quando estiver na cabine de votação lembre-se de que você está ali não por dever, mas por obrigação. E isso, cá pra nós, não tem nada a ver com a democracia. Que não seremos cidadãos enquanto formos obrigados a fazer o que deveríamos fazer por dever. Porque enquanto formos pisoteados pelo despreparo dos preparados, não teremos a dignidade suficiente para nos considerarmos cidadãos. Vamos nos preparar para o voto facultativo. Mas só o teremos quando o merecermos. Pense nisso. 

[email protected] 99121-1460

Na contramão da mão – Marlene de Andrade

“Lembre a todos que… sejam obedientes, estejam sempre prontos a fazer tudo o que é bom.” (Tito 3:1).

Levei um susto quando quase atropelei um ciclista. Essa situação ocorreu quando eu estava em um cruzamento, olhando os carros que vinham à minha esquerda a fim de que eu pudesse seguir em frente. Quando deu para eu ir, do nada, passou um ciclista à minha frente, na contramão e bem rápido e ainda bem que ele estava mesmo pedalando rapidamente, caso contrário eu o teria atropelado de forma extremamente trágica. Apesar do susto muito grande, graças a Deus, não atropelei aquele homem.

Já em outro dia eu estava saindo da Av. Sílvio Botelho para pegar a Av. Getúlio Vargas, à minha direita, quando do nada saem três ciclistas na contramão. Eles vinham daquele prédio azul de vidro, onde era a OI, rumo ao Centro Cívico e por isso em direção oposta a minha, ou seja, eu na mão e eles na contra, ali foi outro susto, enorme, que também levei.

Atendi um senhor em meu consultório que me disse que estava conduzindo sua camionete quando atropelou um ciclista venezuelano, o qual vinha na contramão e, o qual levava de carona a mulher e um filho. Ele socorreu os três, colocando-os em seu carro e os levou, imediatamente, para o HGR. Disse-me ele que essas três pessoas receberam alta em boas condições de saúde, mas que o susto foi muito grande, fora o estrago da bicicleta e de seu carro.

Quando a gente vai contar esses episódios para um conhecido, sempre tem alguém que, pelo menos uma vez, passou aperto no trânsito por causa de ciclistas transgressores, os quais preferem transitar na contramão, e aí, para esses ciclistas isso não é considerado infração de trânsito?

Penso que essa onda de ciclistas andando na contramão deveria, também, ser monitorada pelos guardas de trânsito, pois, mesmo não sendo veículo automotor, a bicicleta faz parte do trânsito, ou será que estou equivocada?

Nas ruas, avenidas e estradas a maior prioridade é o pedestre e, em segundo lugar, o ciclista, contudo, isso não dá a eles e nem a ninguém, o direito de transgredir as normas regulamentadoras do trânsito.

Aquele versículo bíblico que diz que tudo deve ser feito com ordem e decência (1ª Coríntios 14:40) é um dos que eu mais gosto. Trazendo esse versículo à realidade desses ciclistas que preferem a contramão, vemos que a falta de obediência às leis é um desafio a própria segurança e a dos outros. Transitar nas vias públicas sem decoro e honradez deveria ser considerado crime e devido à gravidade dessa prática, fica uma pergunta no ar: até quando alguns ciclistas, aqui em Roraima, vão continuar andando na contramão?

Médica Especialista em Medicina do Trabalho/ANAMT-AMB- CFM CRM-RR 339 RQE 431