Opinião

Opiniao 22 06 2019 8431

Visitas que vêm para ficar – Missionária Clara    Boa Vista, 22 de junho de 2019 – Celebramos nesta quinta-feira o Dia Mundial do Refugiado, iniciativa do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) para pontuar um recorte da humanidade que por inúmeras razões, teve de abandonar seu lar, cidade, país, movido por riscos que nem sempre imaginamos. A data foi firmada mundialmente em 2000, quando o mundo estimava que haveria 70 milhões de pessoas que precisavam ter seus direitos humanos preservados em sua condição de refúgio. Hoje os números ultrapassam 80 milhões e órgão admite que pode ser muito maior. 

A pedido do ACNUR, a Fraternidade – Federação Humanitária Internacional (FFHI), no papel de parceira e em sua missão em cinco, dos 10 abrigos instalados em Roraima, promoveu uma série de atividades entre os refugiados. Uma sopa típica venezuelana – “sancocho”, feita com carne ou peixe e verduras, para celebrações familiares, algo como o nosso churrasco – foi preparada no abrigo Tancredo Neves. Música e apresentações teatrais foram algumas das demais atividades nos abrigos. Essas ações partiram da escuta que demos a eles, enquanto organizávamos a celebração. Lembrar tempos felizes de suas vidas pregressas e vislumbrar um futuro feliz para cada um fazem parte desses eventos que realizamos em Roraima, no dia em que o ACNUR celebrara a data no mundo todo. 

A iniciativa deu ampla visibilidade à realidade local, cuja capacidade de acolhimento está bem próxima de seu limite. Há 3000 venezuelanos nas ruas, mais de 6000 abrigados e todos os dias chega mais gente. Tudo que se faz, ainda assim, é insuficiente para humanizar esses acolhimentos. Famílias, crianças, idosos ainda continuam nas ruas. 

O Brasil precisa enxergar essa imigração venezuelana com mais consciência, precisa abrir-se para dar oportunidades de receber nossos vizinhos de forma digna, que eles possam trabalhar, socializar-se e construir uma nova realidade feliz, talvez próxima à que deixaram para trás, em seu país. Eles querem colaborar com a sociedade brasileira, basta a permissão dos demais estados brasileiros. 

Operação acolhida, um modelo: A Operação Acolhida é modelo, onde organismos internacionais como o ACNUR, as Forças Armadas brasileiras, as ONGs, como a FFHI, agem em parceria para fazer frente a essa situação. 

Nós não podemos fazer nada para estancar os motivos que desencadearam esse êxodo venezuelano, mas o que nós temos feito é praticar e propagar ações que amparem esses refugiados que chegam, oferecendo-lhes o refúgio que buscam. 

Há também movimentos governamentais e não governamentais no Brasil que visam à formação de uma nova consciência social em relação a esses novos habitantes do país, mas é preciso mais. Precisamos estar atentos à xenofobia, ao preconceito, à desumanidade, expressões que brotam diante de uma situação tão nova que é a permanência desses estrangeiros no país. Nosso desafio, então, é esperar que nesta data, possamos provocar mudanças no coração daqueles que ainda não enxergaram o coração das pessoas que acabam de chegar ao Brasil.   *Coordenadora de campo da FFHI – Roraima 

A MUTAÇÃO… TERRA E VIDA – Carlos Augusto Matos de Carvalho

A reflexão sobre as mudanças no mundo, em decorrência das intervenções da humanidade nos seus próprios modos de convivência e sobre a sua interação com o meio ambiente, sempre vem acompanhada de dúvidas, constatações, perplexidades, contradições e confluências de opiniões, portanto, de polêmicas. No entanto, não há caminho mais seguro para a maior compreensão dos fenômenos socioculturais, econômicos, institucionais e da natureza, senão por meio da mais ampla e irrestrita discussão. Assistir ao filme Powaqqatsi, de imagens e música, sem diálogos, permite um excelente panorama das transformações na terra. Powaqqatsi é uma palavra originária dos povos hopis, do tronco asteca (família uto-asteca), que pode ser traduzida como “vida em transição”. Daí chega-se ao nome do filme “Powaqqatsi – A Vida em Transformação” (1888), do diretor Godfrey Reggio, com música de Philip Glass. O filme denuncia o modus vivendi da sociedade contemporânea e o custo do progresso, cuja abordagem tem a clara intenção de mostrar as contradições das sociedades na história, dentro de cada país e entre os países, sobretudo quanto às desigualdades e supremacia dos países do primeiro mundo às nações terceiro-mundistas. Tais fenômenos se repetem entre os cidadãos de uma mesma sociedade, onde há ricos e pobres, sendo os primeiros mais privilegiados quanto ao acesso aos bens imateriais (educação, saúde e poder) e materiais (dinheiro e propriedades), por exemplo. A civilização e o seu habitat (a terra) sempre sofreram pressões naturais como terremotos, maremotos, colisões com meteoros (vide a extinção dos dinossauros) e intervenções próprias do homem no cenário natural. Nas duas situações os comportamentos, hábitos, perspectivas e ações desses mesmos seres humanos se transformam, criando ciclos virtuosos (melhoria do bem-estar, desenvolvimento tecnológico, crescimento do conhecimento, etc.), mas também externalidades negativas (poluição, desigualdades econômico-sociais, violência, doenças, dentre outros). A tônica do filme é a de que os fenômenos naturais estão perdendo a “naturalidade”, potencializados em tragédias anunciadas, devido à falta de cuidado e ações predatórias do ser humano para com o meio ambiente, o que agrava as condições de vida. A película que não tem falas, numa atmosfera rítmica intensa e penetrante, ao mesmo tempo tediosa ou triste, traduzida pela junção da música (ou músicas) e imagens, exigido do expectador concentração, visão holística e imersão cuidadoso na divisão tênue entre o imaginário e a realidade que o filme procura traduzir. Com imagens justapostas, o filme apresenta objetos inertes e pessoas desesperançadas, confundindo-se com a vida frenética das grandes cidades, trabalhos intensos e degradantes, assim como com a própria natureza transformada pelas ações dos seres humanos. E tudo é um caos em aparente equilíbrio, pois não há certeza de que a desesperança cause total falta de esperança, já que as pessoas continuam e continuam a vida. Então, de onde vem a desesperança já que as mazelas vistas diariamente nos centros urbanos tornam-se “invisíveis” aos olhos dos citadinos? Essas disparidades cotidianas se transformam em cenas comuns, em que as pessoas se acostumam como diz Marina Colassanti no poema “A gente se acostuma, mas não devia…”. É possível inferir, numa dimensão ampliada, que os países mais poderosos também não se apercebem dos mais pobres. Em todo caso, os mais fracos sempre são “percebidos” para a exploração, a submissão, ficando eles, cada vez mais, distantes de uma vida digna. A projeção do filme em modo de reverso parece trazer um significado de mea culpa da humanidade, de vontade em voltar atrás, de corrigir os erros do passado. E a vida continua nessa perspectiva, sem muita esperança de que o modo de vida mude, embora seja arriscado asseverar que a humanidade não tenha esperança e que não venha a encontrar uma resposta mais equânime para atender às diferenças entre os homens e a sua relação com a natureza.

*Professor / UFRR; Mestre em Economia / UFRGS; Doutorando em Administração / UFMG

    

Olhe para longe – Afonso Rodrigues de Oliveira

“Para conseguir ver muitas coisas, precisamos aprender a olhar para longe
de nós.” (Nietzsche)

Os que ficam olhando para o bico dos sapatos nunca vão além. Não perca seu tempo pensando só em você. Sua convivência depende de como você convive. Ela tanto pode levar você para o bem quanto para o mal. Olhe mais para o futuro. Mas primeiro procure ver que futuro você realmente quer pra você. E o difícil é entender que para construir seu futuro você não deve pensar só em você. Ele depende de sua convivência com as outras pessoas. Não devemos tentar construir nosso futuro tentando destruir o futuro das outras pessoas. E você pode estar fazendo isso pensando, só em você mesmo, ou mesma. 

Sabemos que a vulgaridade em que estamos afogando nossa cultura está nos levando para o poço da irresponsabilidade social. Não podemos evoluir, tanto no ambiente profissional quanto no familiar, sem o conhecimento das Relações Humanas no Trabalho e na Família. Um conhecimento indispensável na evolução humana. E a vulgaridade a que me refiro é esse descabido movimento sobre discriminação e suas ramificações. Quando fui comprar o pão para o café da tarde, ontem, estive diante do risco de um desencontro entre o racional e o vulgar. Muito simples.

Fernando Ferraz é o dono da padaria, e um cara culto. Ele estava conversando com uma mulher linda, com um cabelo maravilhoso. Ele nos apresentou, e eu pensei em elogiar o cabelo da mulher bonita. Mas fiquei receoso. Aprendi, muito cedo, que devemos sempre elogiar alguém, como um princípio de relações humanas. E aprendi também, como elogiar sem o risco de ser confundido. Mas no momento, refleti sobre o risco que estamos vivendo, de ser confundidos, num elogio, mesmo quando ele é sincero e civilizado. A mídia está vulgarizando o civilizado, alardeando a discriminação, mesmo quando não discriminamos. Preferi não elogiar. 

O Fernando é um grande guitarrista aqui na Ilha Comprida. Tem a mania de me apresentar aos clientes, como “o poeta da Ilha.” Inclino a cabeça e falo sério para o apresentado, dizendo que esse é um apelido que ele me deu. Rimos e o papo continuou. Vamos olhar mais para o futuro e evitar levar para ele o que estamos plantando, com sementes pejorativas. Vamos valorizar mais o brilho dos nossos olhos, do que a cor da nossa pele ou o formato do nosso cabelo. Afinal, o nordestino não precisa sair por aí usando chapéu de couro para provar que é nordestino. Valorize-se, olhando mais para o futuro bem distante, senão você não vai chegar lá. Deixemos a vulgaridade para o lixo, e vamos viver a vida com racionalidade. Pense nisso.

*Articulista [email protected] 99121-1460