Opinião

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Mais um golpe no escasso orçamento da ciência

Sebastião Pereira do Nascimento*

Como se não bastasse os cortes orçamentários ao longo do governo de Jair Bolsonaro nos diversos setores da administração federal, no último dia 02/08 a ciência brasileira sofreu outro grande golpe com a aprovação, pela câmara dos deputados, do texto-base de uma medida provisória que abre caminho para que recursos destinados à pesquisa, tecnologia e inovação sejam usados na renovação de frota de caminhões — com a aprovação pela Câmara dos Deputados, a matéria será enviada ao Senado. E para não perder validade, terá de ser aprovada pelos senadores até dia 11/08.

Editada pelo poder executivo em abril deste ano, a medida provisória (MP 1.112) cria o programa de aumento da produtividade da frota rodoviária no país (Renovar), com o objetivo de agregar iniciativas e ações voltadas à retirada progressiva dos veículos em fim de vida útil, à renovação de frota ou à economia circular no sistema de mobilidade e logística do país.

Contudo, ainda que a frota rodoviária brasileira esteja sucateada, mas retirar recursos já tão minguado da área da pesquisa e desenvolvimento científico, passa ser um desatino brutal de um governo desprovido de um caráter racional científico, visto que “a ciência, dentro da tradição racionalista — como apregoa Karl Popper  é estimada, e reconhecidamente, pelas suas realizações práticas, mais ainda, porém, pelo conteúdo informativo e a capacidade livrar nossas mentes de velhas crenças e preconceitos, velhas certezas, oferecendo-nos em seu lugar novas conjecturas e hipóteses ousadas. A ciência é valorizada pela influência liberalizadora que exerce, sendo uma das forças mais poderosas que contribuiu para a liberdade humana”, Bolsonaro, negando reconhecer isso ou por mera questões ideológicas, decidiu cortar a verba destinada à pesquisa científica, emitindo essa medida provisória que impede a continuidade de muitos projetos e o avanço da ciência no país.

No entanto, a decisão do executivo federal de cortar verba da pesquisa e inovação — ainda que Bolsonaro mantém suas mordomias utilizando o dinheiro do povo, mas que para ele nada significa — despertou mais uma vez a indignação da comunidade científica brasileira, que vem intensificando as críticas a esse nefasto governo, quando em carta ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, cientistas disseram que o que está em jogo é a sobrevivência da ciência e da inovação no país e pediram ao Congresso para reverter o corte de verbas e evitar prejuízos às pesquisas brasileiras.

Adotando a mesma linha, o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, filósofo Renato Janine Ribeiro, diz que o Brasil está perdendo talentos por falta de investimentos. “Ao invés de você colocar a inteligência científica na produção econômica e torná-la mais qualificada, você simplesmente incentiva os jovens doutores a migrarem e levarem todo o conhecimento que o Brasil pagou, não só o Estado brasileiro, mas a sociedade brasileira pagou, e levarem isso daí para quê? Para laboratórios na Europa, na América do Norte, que vão oferecer perspectivas de trabalho”.

Portanto, para a maioria da população brasileira, a impressão que fica é que Bolsonaro quer atingir de forma irresponsável a comunidade científica, pois, ele reconhece que a quase totalidade dessa comunidade não vota nele, assim como a comunidade acadêmica e intelectual do país. Ora, quem em estado de bom senso vai ser favorável a um governo que deliberadamente endossa uma política de desmantelo da educação, das universidades, dos institutos de pesquisas e de outras agências governamentais, como o Ibama e o ICMBio. Uma política que rompe os acordos sobre as mudanças climáticas, incentiva o desmatamento, a grilagem de terras e a invasão de áreas de conservação. Uma política que não só destrói as diretrizes históricas de proteção das populações indígenas, mas também desfaz as políticas públicas destinadas às camadas mais pobres da população.

E no tocante à política de C & T, como se fosse algo que não lhe dissesse respeito, Bolsonaro (e seus aliados), com tamanha irresponsabilidade vem sistematicamente menosprezando a ciência brasileira, como fazia durante a pandemia, quando subestimava os números epidêmicos e desdenhava das recomendações sanitárias ditas pela ciência. Bolsonaro também incentivava o uso de remédios ineficazes e negociava medicamentos e imunizantes superfaturados e, ainda, continua a promover ataques a todos que procuram contribuir para amenizar os danos causados pela pandemia. Bolsonaro demostra ser um indivíduo doente e ausente de empatia que jamais ressalta qualquer compadecimento humano.

Toda essa falta de zelo com a ciência brasileira promovida pelo governo Bolsonaro, vem afetando duramente a capacidade do país de gerar conhecimentos, principalmente nesse momento em que mais se precisa de respostas científicas aos problemas de saúde pública, meio ambiente, indústria e tecnologia. De modo que é preciso repetir aos perdulários do planalto que investir na ciência é investir no conhecimento, na saúde, na educação, na inovação e na potência econômica do Brasil. E é só a partir disso que resolveremos os inúmeros problemas do país, muitos
deles provocados pelo desmando do atual governo.

Reforçando isso, o renomado físico brasileiro Luiz Davidovich, revela que o CNPq já estava com editais lançados na praça, prevendo o recebimentos desses recursos que já estavam prometidos em projeto de lei enviado ao Congresso. Mas ele foi mudado agora, repentinamente, de um dia para o outro. É uma facada na ciência brasileira. E sem ciência, sem inovação, sem tecnologia, o Brasil não vai para frente”.

Ao invés disso, Bolsonaro penaliza o sistema nacional de ciência e tecnologia, através desse profundo corte orçamentário, o qual vem trazendo o enterro da ciência brasileira. E ainda sobre esse corte orçamentário, na visão do professor do Hélio Dias – Instituto para a Valorização da Educação e da Pesquisa no Estado de São Paulo (IVEPESP) –, “é incompreensível que o Congresso permita que suas decisões, manifestadas democraticamente na aprovação de leis para o país, sigam sendo descumpridas por meio de manobras de último momento. É preciso priorizar a ciência – ciência é vida! Penso que a luta deve estar focada no judiciário para comprovar a possível ilegalidade desta medida provisória, assim como o descontingenciamento do FNDCT, cuja ação se encontra parada no Supremo Tribunal Federal”.

*Consultor ambiental, pesquisador, filósofo e escritor.

Veja-a por outro prisma

Afonso Rodrigues de Oliveira

“Bendita crise que vai me ensinar o que é verdadeiramente importante. (Mirna Grzich)

Jogue todos os aborrecimentos para debaixo do tapete e procure viver bem com você mesmo. As crises nos trazem ensinamentos valiosos. Nós é que não nos valorizamos no que somos, e acabamos como marionetes das crises. Vamos pensar mais um pouco no que devemos fazer, de agora em diante, para estarmos maduros para a próxima crise. Porque elas estão sempre aí, na espera de uma oportunidade. Talvez, até, rindo dos tolos que somos.

Você está preparado para as próximas eleições? Ainda bem que não. Porque se estivéssemos preparados para uma eleição civilizada, iríamos bater com a testa na urna. Mas, vamos considerar o nosso movimento político como uma crise. O Afonso Arinos falou essa verdade. Os partidos atuais não são mais do que arapucas. E na maioria dos casos, “balcões de vendas”. Vamos refletir sobre isso, mas sem bagunça. É nas reflexões que chegaremos à conclusão necessária. Já estamos saturados de ouvir autoridades e políticos de renome, defendendo a nossa democracia. E o que nos deixa preocupados é saber se eles estão falando o que sabem ou do que pensam que sabem.

Prefiro continuar citando a advertência do Miguel Couto: “No Brasil só há um problema nacional: a educação do povo”. E enquanto não formos um povo realmente educado, não teremos uma democracia de fato e de direito. Continuaremos sendo orientados para respeitar os mandantes, enquanto eles não nos respeitam. O que continuará nos obrigando a votar, quando deveríamos votar por dever de cidadão. E para termos o direito de escolher os nossos candidatos, temos que ser educados, politicamente. Senão não seremos capazes para escolher o melhor. E continuaremos escolhendo, por não termos opção: ou votamos ou seremos punidos. E isso está bem distante da cidadania, tanto quanto da democracia.

Enquanto não acordarmos para a necessidade de nos tornarmos cidadãos, continuaremos marionetes de políticos que na verdade não são políticos. São os que entram na política para enriquecerem, à custa da nossa ignorância política. Vamos acordar e parar de ficar falando potocas em defesa de quem não merece ser defendido politicamente. Vamos nos respeitar para podermos respeitar a nossa democracia, elegendo políticos que entendam de política. Ainda temos bons políticos, Brasil afora. Só que os maus não os deixam trabalhar nem aparecerem na mídia viciada. Tenho certeza de que você não conhece algum político realmente político. Vamos acordar para a vida e viver. Cada vida que vivemos por aqui não é mais do que mera passagem. Pense nisso.

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