JESSÉ SOUZA

A boiada está passando enquanto os olhares estão voltados para a tragédia do RS

Pacote da maldade com 25 projetos e três PECs estão tramitando no Congresso Nacional de forma acelerada (Foto: Divulgação)

Enquanto a opinião pública e a mídia estão com os olhos voltados para a tragédia no Rio Grande do Sul, dividida entre posições de esquerda e de direita, o Congresso Nacional avança com um pacote da maldade ambiental requentado do governo passado, tentando novamente passar toda a boiada.

Boa parte dos projetos é remanescente de 2022, quando o governo passado apresentou 45 propostas prioritárias no Congresso, além de ter publicado  dois decretos facilitando a garimpagem e incentivando a atuação dos grandes empresários. Em 2023, as ações seguiram com a promulgação da Lei 14.701, que criou o Marco Temporal, e a Lei 14.785, originada do PL do Veneno, liberando os agrotóxicos.

Com as granadas colocadas no bolso dos cidadãos lá atrás, a boiada continua passando e foi acelerada em 2024, com o chamado “pacote da destruição” que é traduzido em conjunto de propostas que podem seguir com os planos de interesse das bancadas mais retrógadas dentro do Congresso, chamadas de BBB (da Bala, da Boiada e da Bíblia).

Com os projetos turbinados e ganhando nova roupagem, agora eles começaram a tramitar de forma bem rápida, alguns deles já de maneira conclusiva nas comissões, sem mais tempo para qualquer discussão. E isso enquanto todos estão anestesiados com as tragédias diárias no Sul do país.

São 25 projetos de lei e três Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que tentam golpear direitos consagrados que dizem respeito a licenciamento ambiental, legalização fundiária, direitos indígenas, recursos hídricos, minerações e outros, tramitando em uma velocidade surpreendente.

Um deles flexibiliza o Código Florestal, o PL 364/2019, que elimina a proteção de todos os campos nativos e outras formações não florestais. Se aprovado na Câmara, deixa toda vegetação “não florestal” do país em perigo, permitindo que os campos nativos (a exemplo do lavrado roraimense) e outras formas de vegetação nativa possam ser livremente convertidas para uso alternativo do solo (agricultura, pastagens plantadas, mineração etc.).

A proposta visa retirar a proteção adicional de toda a Mata Atlântica, bem como deixar completamente desprotegidos cerca de 48 milhões de hectares de campos nativos em todo o país, o que significa desproteger 50% do Pantanal (7,4 milhões de hectares), 32% do Pampa (6,3 milhões de hectares) e 7% do Cerrado (13,9 milhões de hectares), além de quase 15 milhões de hectares na Amazônia, sujeitando-os a uma conversão agrícola descontrolada e ilimitada.

Outra proposta, o PL 3334/2023 que está no Senado, tenta reduzir a reserva legal na Amazônia. O projeto reduz de 65% para 50% a parte do território dos estados amazônicos ocupada por áreas protegidas para que se possa reduzir a reserva legal de 80% para até 50%. Para o cálculo dos 50% de áreas protegidas, além das unidades de conservação da natureza de domínio público, devidamente regularizadas, e das terras indígenas homologadas, inclui as áreas de domínio das Forças Armadas.

O PL acaba o requisito de o Estado ter zoneamento ecológico-econômico aprovado para que possa ocorrer a redução da reserva legal, permitindo que supressões de vegetação na Amazônia Legal ocorram em áreas sobre as quais não se tem informações referentes à organização do território. E ainda permite que os estados autorizem os municípios a reduzirem a reserva legal para até 50%, com outros fins que não a recomposição.

Existem outros PLs que precisam de atenção por parte da sociedade, a exemplo do que suprime o controle sobre a vegetação secundária em área de uso alternativo do solo, o que altera a Lei Geral do Licenciamento Ambiental, que o empreendedor não apresenta mais qualquer estudo ambiental, nem mesmo o relatório de caracterização do empreendimento precisa ser conferido, o que beneficia grileiros, além do que esvazia a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental e o poder do Ibama.

O momento é de muita apreensão, pois existe um movimento que visa produzir fake news e muita polêmica envolvendo a tragédia no Rio Grande do Sul enquanto os grupos passam com toda a boiada, estourando as granadas que já estavam armadas desde o governo passado.

*Colunista

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