JESSÉ SOUZA

A falência da Educação é projeto político que vem sendo colocado em prática

O antropólogo Darcy Ribeiro já dizia: "A crise da educação no Brasil não é uma crise; é um projeto". A frase cai muito bem para a explicação do Governo do Estado a respeito da suposta inviabilidade da escola em tempo integral em Roraima, a qual vem sucumbindo e trocada de forma rápida pelas escolas militarizadas.

Argumento de que escola em tempo integral é inviável não se sustenta à luz dos fatos (Foto: Divulgação)

O antropólogo Darcy Ribeiro já dizia: “A crise da educação no Brasil não é uma crise; é um projeto”. A frase cai muito bem para a explicação do Governo do Estado a respeito da suposta inviabilidade da escola em tempo integral em Roraima, a qual vem sucumbindo e trocada de forma rápida pelas escolas militarizadas.

A falência da escola em tempo integral não é porque esta modalidade é inviável. Mas porque foi um projeto político sucateá-la a fim de justificar o argumento de que ela seria inviável por falta de recurso e, mais absurdamente, porque as famílias querem seus filhos adolescentes e jovens “ajudando em casa”, conforme viria ocorrendo no Município de Rorainópolis, no Sul do Estado.

Escola em tempo integral consome mais recursos, especialmente para garantir melhor estrutura para conforto e acomodação dos alunos, como também para alimentá-los durante o período de vivência dentro da escola. Já sabemos que recursos existem aos montes. Os cofres públicos podem até secar, mas logo estão cheios de novo de tantos impostos que o brasileiro paga.

Os seguidos casos de irregularidades e de flagrantes de improbidades comprovam que há muito dinheiro sobrando, com os recursos públicos escorrendo pelo ralo da corrupção. Não se pode esquecer que, em 2019, uma parlamentar tomou posse com tornozeleira porque havia sido presa acusada de desviar recursos do transporte escolar. Este ano, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) identificou irregularidades na compra de livros didáticos no valor de R$15,4 milhões.

Aqui está o “xis” da questão: não há dinheiro para investir em uma educação de qualidade porque é preciso sobrar dinheiro para os esquemas – isso sabendo que a Educação é uma das pastas loteadas a cada ano de eleições porque o setor se tornou uma das principais moedas, inclusive com gestores de escolas se transformando em cabos eleitorais e as próprias escolas em comitês partidários.

As escolas militarizadas também acabam servindo a este propósito por mais um motivo, além de consumir menos recursos com treinamentos de educadores, materiais pedagógicos, laboratórios etc: é muito cômodo para os pais acharem que estão transferindo suas responsabilidades de educar seus filhos para militares armados dentro de sala de aula.

Além de sobrar mais recursos para a divisão do despojo, calam pais insatisfeitos e mantém alunos na pedagogia do “sim, senhor; não, senhor”. É aqui que entra outro projeto de poder: o de dominação da população mais pobre, que deixam de cobrar mais investimento na educação de seus filhos, e ainda fabricam alunos sem criticidade, menos consciente e menos humanistas.

Há de se observar que não há famílias de ricos brigando por vagas em escolas militarizadas. Porque elas sabem que esse tipo de educação não irá garantir o futuro que eles querem para seus filhos. Existem, sim, aquelas que se acham classe média desejando ver seus filhos batendo continência para militares na escola porque não querem mais assumir as responsabilidades, seja porque os pais não têm tempo ou porque perderam qualquer domínio sobre seus filhos.

Logo, o argumento de que a escola em tempo integral é inviável não se sustenta à luz da verdade. Esse modelo de escola vem sendo sucateado há um certo tempo, em Roraima, para que se torne apenas isso mesmo: um depositário de jovens e adolescentes, apenas se alimentando e passando o tempo dentro de sala, sem os recursos e estruturas necessários para uma educação de qualidade.  

E não custa nada chamar Paulo Freire para servir de reforço à fala de Darcy Ribeiro: “Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica.”

*Colunista

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