A situação dos profissionais de saúde e o avanço da garimpagem ilegal
Jessé Souza*
Profissionais de saúde que trabalham no Hospital Geral de Roraima (HGR) relatam que é constante a chegada de pacientes acometidos por malária e Covid-19 contraídas nos garimpos ilegais na Terra Indígena Yanomami, provocando reflexos no atendimento ao público em uma estrutura deficitária. Essas pessoas falam abertamente e não fazem questão de esconder que atuam nos garimpos ilegais.
Em outra ponta, também é grande o número de indígenas Yanomami doentes de malária em várias regiões invadidas por garimpeiros. Conforme os profissionais de saúde relatam, há casos em que a frente de exploração de ouro funciona ao lado das comunidades e, alguma vezes, a comunidade indígena é forçada a se mudar para dar lugar ao trabalho de exploração mineral.
Por sua vez, os profissionais de saúde dizem que se sentem ameaçados e que, por isso, não se sentem seguros para atuar na terra indígena devido à ostensiva presença garimpeira, geralmente com homens armados, bebidas alcóolicas, prostituição e drogas.
Há casos em que profissionais de saúde acabam trocando de lado, ou seja, largam o emprego para trabalhar no garimpo, seja na busca pelo ouro ou montando barracas de vendas, uma vez que eles passam a vivenciar essa realidade quando atuam na saúde indígena.
Pelo que vivenciam, esses servidores da saúde não acreditam que a realidade da saúde indígena possa mudar, uma vez que na mesma medida em que presenciam a invasão garimpeira aumentar, também vivenciam a falta de estrutura, com falta de remédios e equipamentos, além da ineficiência da gestão para administrar a assistência que dependem de voos.
Enquanto os garimpeiros se movem rapidamente por embarcações velozes e voos de aeronaves a qualquer momento, os profissionais de saúde ficam “presos” à espera de voos e também não conseguem autorização rápida de voo para remover pacientes, o que geralmente decreta a morte de quem está em situação grave.
Apesar das fiscalizações e operações policiais pontuais, os garimpeiros sentem-se fortalecidos, principalmente com as últimas decisões do governo, a exemplo do general Augusto Heleno que autorizou sete projetos de exploração de ouro em áreas de proteção ambiental que ficam no entorno de terras indígenas.
General Heleno é secretário-executivo do Conselho de Defesa Nacional, um órgão consultivo da Presidência da República que precisa se manifestar sobre a ocupação do território em faixas de até 150 quilômetros de distância da fronteira. Essa pressa em autorizar pesquisa mineral não é a mesma para combater o garimpo ilegal, atender a saúde indígena e fiscalizar desmatamentos.
Enquanto a garimpo avança nas terras indígenas e os profissionais de saúde indígena lutam pela melhoria das condições de trabalho, a bancada ruralista no Congresso Nacional, com apoio de mineradoras, está mobilizada para aprovar o mais rápido possível quatro projetos de lei que alteram normas de proteção ambiental no país, facilitam a exploração de garimpos e permitem a grilagem de terras públicas.
Esse é o cenário do país, que até hoje não definiu uma política ambiental e que assiste o avanço do risco de extinção de várias comunidades indígenas na Terra Yanomami. Ao perceberem esse momento político pró-garimpo, os financiadores da garimpagem ilegal sentem-se livres para agir.
Com isso, as riquezas minerais exploradas ilegalmente nas terras indígenas acabam indo parar em outros estados, e até fora do país, enquanto o Estado de Roraima fica com as graves consequências no meio ambiente, na saúde pública e avanço da violência devido às ações ilegais que surgem a partir das frentes garimpeiras.
*Colunista