Walber Aguiar*
“Também pôs Deus a eternidade no coração do homem.” (Eclesiastes)
Naquele mês de julho fui apresentado a Paulo Sarmento na disciplina de Cultura brasileira. Baiano dando aula de um Brasil moreno, negro, índio, ainda cheirando a pelourinho e seus acarajés e abarás. A partir daí as sarmentices pareciam brotar do chão, tal qual a autenticidade daquele bom baiano.
O homem da antropologia, o cara que chegava franzino em sala com um caderno ou livro apenas, mais tarde seria um amigo das letras, um adepto da malandragem responsável, até porque os baianos fazem carnaval o ano inteiro por qualquer motivo.
Assim, apresentado ao mestre das histórias antropológicas e ao cunhadismo de Darcy Ribeiro, ao amor de Regina (sem cunhadismos) e às antropologices e tiradas filosóficas de Lévy-Strauss, restou uma amizade sem nenhum interesse, sem os olhos de cifrão, cheios de gananciosas remelas e dores consequenciais.
E quando estávamos todos enlutados, entre a realidade da ilusão e a geografia da morte, conheci um livro onde a jornada continua, onde figuram abordagens antropológicas, filosóficas e sociais, onde o autor mergulha profundamente na história humana, na odisséia dos pés descalços sobre a terra.
No entanto, um dos mergulhos mais inusitados reside naquilo que se entende e se vislumbra como eternidade e seus derivados terrenos e divinos. Onde um anjo se depara com limões e passa a dialogar com a transitoriedade, o limite e a fugacidade.
Assim, o anjo mostra uma espécie de angústia diante do sempre, do eterno, do infinito. Uma angústia parecida com a do demônio que não suportava a perspectiva da lembrança de que viveria para sempre num mar de perseguições, ódios e lamentos. Uma espécie de gastura existencial diante daquilo que nunca acaba, que vai durar pra sempre.
Nessa ótica, o limão, em sua pureza cítrica, em sua geografia de extrema finitude e limitação, é tomado como alguma coisa boa, simples, singela, pelo mesmo fato de ter seu tempo de duração. Simplesmente, por ser algo que um dia acaba, mas vê seu papel cumprido, sua missão finda, sem ter que se preocupar com os quilômetros devoradores, numa estrada sem placas e sem qualquer tipo de fronteira.
O anjo saiu com as mãos cheias de limão, Sarmento com as mãos cheias de livros e eu com os olhos cheios de lágrimas, por me perceber confrontado com o transitório e o eterno, o rotineiro e o desconhecido. Um dia a gente abre essa cortina e descobre esse mistério. Enquanto isso, nos lambuzaremos com a pureza do limão e a solidão do espinho…
*Advogado, Poeta, professor de filosofia, historiador e membro da Academia Roraimense de Letras E-mail: [email protected]