Pode parecer uma frase sem muita lógica para algumas pessoas que vivem no mercado e pararam no tempo achando que o mundo desacelerou, que o aperfeiçoamento não é mais necessário e que tudo se resume ao mundo digital. Tenho uma triste notícia: ”O mundo está cada vez mais necessitando do olho no olho”.
A pandemia já completou seu segundo aniversário e pelo jeito acenderá velinha todo ano. Passará a nos fazer companhia como a influenza e tantos outros vírus que escolheram conviver com a gente. Tenha certeza de que esse fato mudará a vida de grande parte de quem habita esse planeta com quase 8 bilhões de seres humanos.
O distanciamento causado pela pandemia e uma cultura de isolamento criada em cima do medo da Covid-19 (com base científica) e a criação de mundos egoístas baseado em celulares, jogos, ambientes digitais e mundos desconhecidos nos levaram a desaprender a se comunicar. Quando ligo para o meu filho de 16 anos e ele está em um desses mundos que relacionei, descubro que vou trocar poucas palavras com ele, porque o foco não está no diálogo e sim na magia que os programadores criaram em cima da tecnologia. Passamos a ser reféns de nossa criação. Manipulados pelas ferramentas criadas por um colega que estava ao nosso lado, que era falador e de repente se calou.
As redes sociais são grandes exemplos do aumento constante desses seres humanos que não se comunicam. Seguidores, curtidas, cancelamentos, viraram palavras da moda. Quanto mais curtidas mais IBOPE, audiência eu tenho. Quanto mais palminhas, mas importante eu sou, ou o que eu escrevo ou gravo. Quanto mais compartilhamentos mais longe minhas verdades estão chegando.
No documentário ”O dilema das redes sociais” do NETFLIX, muitas frases nos levam a grandes reflexões e que ajudarão a entender o contexto do nosso artigo. Tem uma que me chama muito a atenção: “Se você não está pagando pelo produto, então você é o produto”, ou seja, ”Não existe almoço de graça”. O seu perfil é o grande negócio das redes. As suas necessidades e os seus desejos estão sendo monitorados o tempo todo. Não é à toa que você acaba de navegar pela Amazon e na próxima página navegada está lá uma grande variedade de ofertas do produto que você buscou na Amazon há alguns minutos. Coincidência? Claro que não. Sua vontade do momento tem que ser potencializada e as ferramentas utilizadas para isso trabalham com cada clique que você deu.
Nos primeiros cinquenta anos do Vale do Silício, a indústria fez produtos, como hardwares, softwares, e os vendia ao cliente final. Era um negócio legal e simples. Nos últimos dez anos, as maiores empresas do Vale do Silício têm estado no negócio de vender seus clientes. Exagero, verdade ou mentira? É fato, você é o grande negócio dessa nova era. Até porque você pode ter esses vários mundos na palma da sua mão em smartphones poderosos e muito caros. A Apple foi fundada em 1º de abril de 1976, em Los Altos na California e mesmo sendo o dia da mentira, Steve Jobs, Steve Wozniak, Ronald Wayne não imaginavam que, por meio de seus produtos, seriam hospedeiros para manipular tanta gente.
Mas uma frase me chama a atenção e me preocupa: ”Criamos uma geração global de pessoas que crescem dentro de um contexto em que o significado de comunicação e o significado de cultura estão atrelados à manipulação”. O ser humano tem vários mecanismos de defesa e autopreservação, mas quando você consegue desnudá-los você entrega suas fragilidades a quem sabe explorá-las. Infelizmente essa técnica de manipulação não está apenas no mundo digital, temos muitas pessoas com capacidade no mundo normal e por isso devemos estar sempre atentos, pois quando usado para o mal, poderemos ter muitos problemas.
Acho que chegamos a um ponto crucial. Quais as consequências da manipulação que conseguem ser percebidos pela sociedade? A indústria da beleza que no Brasil movimenta mais de R$ 100 bilhões, tem investido pesado em experiências virtuais. Cada vez você vê mais pessoas testando produtos aliado ao grande desejo de descoberta da fonte da juventude ou mesmo do ”estacionar o tempo”. Isso é algo que cresce vertiginosamente e você identifica meninas que acham que a experiência do produto e mais seus equipamentos de gravação, irão testemunhar a transformação de uma criança em uma mulher. São cílios grandes, bocas com batons em cores picantes, roupas que não condizem com sua infância e um monte de seguidores de olho em mais uma fragilidade que pode ser explorada e não preciso dizer onde isso pode chegar. Famílias destroçadas, crianças traumatizadas, enriquecimento sem preparo, crescimento sem base, enfim um mundo para pessoas que ainda não estão prontas para a vida. Para as pessoas que acham que estou exagerando, vai aí mais uma citação do documentário: “Existem apenas duas indústrias que chamam seus clientes de usuários: a de drogas e de software.”
Pode parecer que eu sou o maior inimigo das redes ou da comunicação feita por elas, mas não é nada disso. Gosto das redes e as uso, mas as uso como ferramenta e não um vício ou um meio para manipular alguém. Apenas quero que entendam uma coisa antes de entrarmos na segunda fase do artigo: ”A internet teve como princípio básico aproximar quem está distante e hoje depois de 53 anos de criação a internet ajuda a separar quem está sentado na mesma mesa, deitado na mesma cama e transformando o sonho de um futuro melhor ao lado que quem sem ama em algo mais ambicioso, difícil e perigoso”
Vamos supor que restabelecemos a ordem mundial das coisas. A internet, redes e demais ferramentas digitais continuam apenas como ferramentas. Aí surge o dilema: COMUNICAR PARA LIDERAR. Vocês vão ver o outro lado da moeda e algumas necessidades do mercado que vem sendo esquecidas e valorizando os profissionais que continuam a dar importância para uma boa conversa e a real troca de experiências.
A liderança plena tem como uma das principais bases a empatia, o saber se colocar no lugar do outro. Para que alcancemos esse grau de evolução devemos ter a sabedoria e a humildade em saber ouvir, ou melhor escutar. Pegar as informações coletadas através de uma escuta ativa e definir formas de conseguir chegar ao coração das pessoas e as inclui-las num projeto comum. Pode se assemelhar a técnica da manipulação que falamos anteriormente, mas na realidade, adotamos passos que nos fazem ficar mais próximos, identificar as necessidades, engajar em propósitos, mas tudo isso a alguns poucos centímetros de distância. Aqui eu tenho a relação face to face e não um supercomputador tentando imitar o seu criador.
Como vou comandar uma equipe senão consigo me comunicar com ela? A comunicação estará fadada ao fracasso, pois no gráfico simples de feedback da mensagem temos a presença de um emissor, uma mensagem coberta de ruídos, um receptor e um feedback que dependerá da sua habilidade em fazer a mensagem alcançar o seu destino e os seus objetivos.
Muitas pessoas, equivocadamente ainda acham que o comando vem da força e adotam posturas arrogantes, frases intimidadoras como por exemplo: ”Manda que pode, obedece quem tem juízo”, postura de superioridade, enfim se acham ”professores de Deus”. Comportamentos como
esses já deveriam estar abolidos há muito tempo, mas infelizmente essa não é a realidade. O pseudo líder nada mais é do que um profissional frustrado, com deficiência no ouvir, com a cultura do medo como regra e a criação de um ambiente hostil dentro da organização.
A chefia nunca será um termo bem-visto quando tratamos de liderança. A liderança nasce do exemplo, da conquista e da admiração. Líderes são seguidos, chefes são temidos. Líderes dividem triunfos, chefes assumem protagonismos desnecessários. Líderes adoram a simplicidade, chefes os holofotes. Líderes trabalham por um projeto comum, chefes pensam nas vantagens baseadas no sacrifício dos outros. Liderança é arte da conquista sem barulho.
Muitos dizem que liderança se aprende. Eu particularmente sou favorável a teoria que somos um ser em evolução constante, mas sem esquecer do que trazemos do nosso berço. Quem nunca recebeu carinho, jamais vai exercer um comando com afeto. Quem nunca teve regras, jamais vai exercer o comando disciplinado. Quem nunca soube o que é a solução de um problema resolvido em conjunto, jamais vai exercer um comando com espírito de equipe. Quem nunca soube o que é um diálogo, jamais vai exercer a liderança com a habilidade de se comunicar.
A comunicação é feita de várias formas, inclusive em silêncio. Tem horas que a melhor comunicação está em saber o momento certo de calar-se. Avançar ou recuar sempre será a dúvida de um estrategista que tenha o pé no chão. O medo do erro é uma das grandes armadilhas para um líder. O líder dá autonomia para sua equipe e quando o erro ocorre deve ser visto pelo prisma da vontade de fazer o certo, da vontade de realizar e da vontade de se fazer parte de um resultado. Claro que os erros nas organizações são calculados e dentro de um limite tolerável, mas essa margem é o que diferencia quem pede de quem manda.
Ao longo desses anos fiz questão de carregar algumas coisas comigo e desenvolver cada vez mais a habilidade de se comunicar. Por meio disso descobri que reter conteúdo é uma ótima forma de construir um mercado pouco ético e desleal. É preciso compartilhar o que temos, dividir o pouco ou muito como uma forma de dar significado a nossa existência, pois a vida é muito mais do que dinheiro, cargos, status ou qualquer coisa que se assemelhe a ideia de queremos ser deuses.
Comunicar para liderar é um exercício acima de tudo de humildade, de respeito e de sabedoria. Você pode usar tudo isso, as ferramentas tecnológicas disponibilizadas, fazer um vídeo e postar das redes sociais sobre determinados temas, postar textos que evidencie suas posições, mas sem em momento algum faltar com respeito a opinião contrária, diminuir quem está te ouvindo ou mesmo criar verdades absolutas que só quem tem certeza é quem as vende.
Comunicar nasce no ”bom dia” que a gente vai deixando de usar ao longo da vida. Do ”como você está” como forma de dizer ao próximo que você está atento a ele ou simplesmente de dizer ”parabéns” pelos resultados que você conquistou e ouvir do outro que esse resultado só foi possível porque existe um líder que se comunica com os comandados sem precisar de shows pirotécnicos ou mesmo de tapetes vermelhos.
Use suas habilidades e competência de comunicação para você ajudar o próximo, para confirmar a importância dos membros da sua equipe e grite muito, por todos os cantos do mundo: “Eu sou igual a você, as vezes com mais defeitos do que você, mas estou aqui para dizer com todas as letras que tudo o que conquistamos ou vamos conquistar terá parte do seu DNA e juntos venceremos qualquer desafio”.