JESSÉ SOUZA

Conivência, desarticulação e falta de plano para a fronteira favorecem avanço de crimes

Governo abandonou as políticas para a fronteira em 2016, quando tráfico de pessoas se estabeleceu (Foto: Divulgação)

 Apesar do silêncio absoluto das autoridades a respeito da migração do garimpo ilegal para a fronteira da Venezuela e Guiana, com garimpeiros e agenciadores se instalando nas cidades fronteiriças, o que permite adentrar a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, pesquisadores e estudiosos sobre tráfico de pessoas e exploração sexual de crianças e adolescentes se posicionaram.

Ao comentar em uma rede social a respeito do artigo de ontem, “Garimpo migra para fronteira com Guiana e Venezuela, onde rede de crimes está sendo instalada”, a doutora em Ciência Política Geyza Alves – que tem atuação no tema abuso, exploração sexual e trabalho infantil – afirmou que o Estado de Roraima é confirmado como rota do tráfico e exploração sexual de crianças e adolescentes desde 2002.

A confirmação veio após a Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil (Pestraf), que apontou que os municípios de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, e Bonfim, na fronteira com a Guiana, como as cidades de saída do Brasil para esses tipos de crimes, reafirmando o que foi destacado no artigo de ontem.

Segundo ela, a Universidade Federal de Roraima (UFRR) fez um trabalho de extensão financiado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT ou ILO, do inglês International Labour Organization), quando foram trabalhadas a Rede de Enfrentamento e também algumas comunidades indígenas. “Infelizmente, o poder público abandonou essas políticas após 2016, levando a essa nova fronteira que é o Uiramutã”, comentou se referindo à migração do garimpo ilegal junto com os demais crimes para essa cidade, conforme destacado no artigo de ontem.

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Geyza Alves comentou que, como Uiramutã está dentro da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, “os olhos dos governantes estão fechados, deixando que o município seja inchado, levando à calamidade, sem atendimento, sem coibir no início essa mudança de local dos garimpeiros e dos donos de garimpos que estão financiando tudo isso. É o Estado novamente deixando de fazer seu papel”.

A doutora em sociedade e cultura na Amazônia pela Universidade Federal da Amazônia (Ufam), Márcia Oliveira, com pós-doutorado em sociedade e fronteiras pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), também chama a atenção para a grande omissão das autoridades para o que está ocorrendo na fronteira Norte de Roraima, que tem favorecido o tráfico de pessoas, principalmente de mulheres, crianças e adolescentes indígenas.

Márcio frisou que o tráfico de pessoas na Amazônia não é um acaso, mas um crime que se alimenta da conivência estatal, da desarticulação entre países fronteiriços e da ausência de planos de enfrentamento que garantam prevenção, repressão e assistência às vítimas. Ela destacou que a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal têm desempenhado um papel fundamental, mas seus esforços são limitados diante da imensidão do problema e da falta de apoio estrutural.

‘Se o Brasil quer, de fato, combater o tráfico humano, precisa retomar e ampliar suas políticas de enfrentamento, garantir a vigilância efetiva de suas fronteiras e estreitar as parcerias internacionais para a repressão dessas redes. O silêncio do Estado é um grito de impunidade para os criminosos e uma sentença de abandono para milhares de vítimas”, alertou Márcia Oliveira.

A doutora destaca a necessidade de uma mobilização não só dos países envolvidos, mas de toda sociedade, uma vez que o silêncio, omissão e descaso com o problema favorecem a atuação dos criminosos, por isso, segundo Márcia, o combate ao tráfico de pessoas precisa ser uma prioridade política, social e humana.

A doutora ainda chama a atenção de todos e faz um questionamento final: “Não podemos mais fingir que não vemos. A Amazônia é o coração do Brasil, mas suas veias estão pulsando tráfico humano, exploração e dor. Quem vai responder por isso?”

Com a palavra, as autoridades em todos os níveis de governo e a sociedade em geral…

 *Colunista

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