Não é difícil prever um apagão em Roraima, a única unidade da Federação que não é interligada ao Sistema Interligado Nacional (SIN). Mas, por pura coincidência, depois que se espalhou a notícia de um vidente prevendo um grande apagão no Estado, no dia 4 de agosto, a operadora energética roraimense em seguida contratou uma empresa da Bahia para fazer um serviço de manutenção na rede de distribuição.
Inclusive, um dos apagões que chegou a ocorrer no dia 1º de setembro, um domingo, foi em virtude da manutenção programada pela equipe da empresa baiana, que estava hospedada em um hotel no Centro de Boa Vista por cerca de duas semanas. No entanto, não houve nenhum comunicado ou aviso prévio, como é de praxe, deixando a população sem saber o que estava realmente acontecendo.
Embora a população de Boa Vista, a Capital, viva sobressaltada a cada apagão (este que ocorreu nesta terça-feira foi o terceiro em 17 dias), é bom que todos saibam que nos municípios do interior o corte no fornecimento de energia é uma dura e corriqueira rotina que submete todos a transtornos e prejuízos incalculáveis.
É assim no Município do Amajari, ao Norte, e também é esta a realidade em Rorainópolis, no Sul. Inclusive, no dia 9 passado, moradores da Vila Jundiá, localizada neste município que fica na divisa com o Amazonas, bloquearam a BR-174 em protesto pelos constantes apagões sofridos pelos consumidores daquela localidade.
No apagão de terça-feira, 17, o Operador Nacional do Sistema Elétrico informou em seu boletim que o desligamento automático atingiu a rede de distribuição de Roraima e das unidades geradoras das Usinas Termo Elétricas Jaguatirica II, Baliza, Monte Cristo, Floresta e Palmaplan (Rorainópolis), atingindo 53% do sistema isolado de Roraima. Como das outras vezes, não foram informadas as causas.
Pelo silêncio das empresas envolvidas e das autoridades, não é necessário ser um vidente para prever que algo sério esteja ocorrendo, a ponto de ocorrerem constantes apagões, e que continuará acontecendo até que o Estado esteja integrado ao restante do país. No entanto, as cifras dão algumas pistas do motivo pelo qual é conveniente que Roraima viva de sistemas que falham.
Os primeiros dados divulgados a partir de quando Roraima passou a ser abastecido por usinas termelétricas a diesel, março de 2019, após a suspensão do fornecimento de energia pelo Linhão de Transmissão de Guri, da Venezuela, indicam que o custo de geração de energia pelas termelétricas ultrapassava um pouco mais de R$1,1 bilhão. E isso nos valores da época.
Os cálculos foram feitos com base no período de novembro de 2019 a outubro de 2020, período em que Boa Vista e municípios do interior interligados consumiam 1,25 GWh, o que necessitava de 345 milhões de litros de óleo diesel. As cifras podem ser ainda maiores, caso fossem considerados os custos de aluguel dos geradores, serviços de manutenção e a operação do sistema.
Os dados só excluem o abastecimento feito pela Usina Hidrelétrica de Jatapu, no Município de Caroebe, no Sul do Estado, que contribui com apenas 0,35%. Aliás, a construção dessa hidrelétrica foi uma falácia pregada na década de 1990 como a redenção da alternativa energética de Roraima, da mesma forma que estão pregando hoje com relação ao projeto de construção da hidrelétrica de Bem-Querer, em Caracaraí, na região Centro-Sul do Estado.
Com muitas cifras em jogo, não é de se estranhar que o abastecimento a diesel beneficia quem dela explora comercialmente. Enquanto não for concluída a construção do Linhão de Tucuruí, obra prevista para setembro de 2025, os roraimenses continuarão vivendo com o fantasma do apagão, enquanto um grupo seleto se beneficia das cifras geradas pelas termelétricas. Simples assim.
*Colunista