AFONSO RODRIGUES

De cara a cara com ela

“O único meio de se descobrir os limites do possível é ir além dele, alcançando o impossível”. (Arthur Clarke)

Se você se lembrar, sempre, de alguma coisa incrível que já aconteceu com você, vai refletir um pouco sobre isso. É legal pra dedéu. Até mesmo se o acontecido foi, aparentemente, bem insignificante. O causozinho, bem zinho, que vou lhe contar é um exemplo típico da coisa. Foi no início da década dos oitentas. Eu estava instalado no meu tapiri, na Confiança I, no Cantá. Foi um dos períodos mais interessantes e importantes de minha vida, pela experiência adquirida. Quarenta anos já se passaram e não consigo resistir à saudade dos momentos incríveis vividos ali.

A pouca distância do tapiri tínhamos um igarapé que eu adorava. Construí ali, uma “ponte” atravessando o igarapé, com o objetivo de construir uma fonte de energia. O caso é complicado e por isso só falarei dele, depois. Todas as manhãs eu me levantava cedinho, dava uma caminhada em volta do tapiri. E logo seguia até o igarapé e ficava um tempão olhando e admirando a obra, na construção da ponte. Ela tinha mais ou menos um metro de altura e uns três metros de comprimento, que era a largura do igarapé. Atravessar aquela ponte e contemplar a obra era um orgulho para o agricultor que ainda confundia melão com pepino.

Naquela manhã dei a caminhada em volta do tapiri e segui para o igarapé. Cheguei à beira do igarapé e fiquei admirando a correnteza calma, e as brincadeiras das piabinhas miudinhas. Devo ter ficado naquele enlevo por mais ou menos uns dois minutos. E foi aí que a jiripoca piou. Só aí percebi que alguma coisa se mexia, como se estivesse medindo alguma coisa na pontizinha. Cara, você não imagina o susto que tomei quando verifiquei que a cabeça que roçava a ponte era de uma sucuri enorme. E estávamos, a uma distância de menos de três metros. E como agricultor experiente, dei um pulo para trás e saí correndo para pegar o facão para matar a cobra.

Não sei bem quantos minutos fiquei procurando o facão que estava a pouco mais de um metro à meinha frente. E como não consegui encontrar o facão resolvi encarar a sucuri na de braço a braço. Mas quando cheguei ao igarapé a sucuri já tinha ido embora. Voltei desiludido por não tê-la encarado olho a olho. Quando cheguei ao tapiri notei que o facão estava bem ali onde sempre esteve. Só depois foi que concluí que fui protegido em não encontrar o facão que estava ali. Já pensou o que a sucuri poderia ter feito com o agricultor experiente? Duas semanas depois, o meu vizinho matou a sucuri que não quis nada comigo e não sei por quê. Pense nisso.

[email protected]

99121-1460