E assumiremos nossa covardia
Como recebeu apoio da população apenas no verbo e nas postagens de redes sociais, além dos movimentos sociais ausentes, a greve dos caminhoneiros ficou comprometida depois que o Governo Federal, ao se sentir acuado, apelou para a estratégia de negociar com lideranças de entidades que se mostraram comprometidas mais com as transportadoras do que com a categoria dos trabalhadores caminhoneiros.
O episódio revelou que a greve tem dois vieses: o dos trabalhadores caminhoneiros, que não tiveram seus direitos e reivindicações atendidos no acordo com o Governo Federal; e dos empresários donos das grandes transportadoras, que foram os principais beneficiados no acordo. Isso ficou bem claro quando o presidente Michel Temer (MDB) se apressou em anunciar o fim da greve, enquanto os trabalhadores caminhoneiros mantiveram o movimento, já que eles não se sentiram representados no acordo.
Assim que Temer encerrou seu pronunciamento, ao meio-dia de ontem, a TV Globo imediatamente começou a enfatizar a fala do presidente, com a apresentadora, de cara fechada, classificando os caminhoneiros que mantiveram os bloqueios de “radicais”, palavra que se tornou um mantra para classificar todos aqueles que não concordam com os posicionamentos oficiais ou para coisificar os movimentos de esquerda que realizam protestos.
Só que, desta vez, o país está lidando com uma categoria autônoma, cujos sindicatos geralmente fazem o jogo dos empresários do transportes e dos governos. E se a sociedade não abraçar a causa dos caminhoneiros e não se juntar a eles, os manifestantes serão atropelados pela repressão dos governos e engolidos pelas grandes empresas que acabaram beneficiadas pelo acordo com o Governo Federal.
Mas, como foi comentado ontem, neste espaço, os movimentos que deram apoio para que este governo tomasse o poder não têm o mínimo interesse em se unir a esta grande mobilização nacional. Nem os partidos de esquerda e movimentos sociais mostraram-se coesos nesta oportunidade única de mandar um ultimato para os políticos e governantes brasileiros.
Quando as forças policiais da União e dos estados estiveram usando seu poder para desbloquear as estradas, como foi anunciando por Temer ontem, os brasileiros devem lembrar que ali estará representadas a passividade e a covardia da maioria, que protesta apenas da boca para fora ou na frente da tela de um computador ou de um celular.
E então os trabalhadores brasileiros irão perder a grande oportunidade de mostrar sua força diante da indignação nacional. Aí, definitivamente, poderemos assumir nossa posição de covardes.
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