AFONSO RODRIGUES

Então vamos nos preparar

“A felicidade é alcançada quando a pessoa está pronta para ser o que ela é”. (Erasmo de Roterdã)

Já falei um zilhão de vezes: não desperdice seu precioso tempo, saindo por aí, procurando a felicidade. Ela está dentro de nós. Simples pra dedéu. Mas, como já falamos, vamos deixar que você reflita e abrace a felicidade que está grudadinha em você, e você nem percebe. Estou apostando que você conhece uma porção de pessoas desligadas. São as que não prestam atenção nem a elas mesmas. Só que você nem percebe que pode estar incluída no grupo. E quer saber de uma coisa? Geralmente você está no grupo. Isso acontece com todos nós. Também aposto que você, vez por outra esboça um sorrisinho maroto, lembrando-se de alguma tolice que praticou no passado. Já aconteceu muitas vezes, comigo.

Em mil novecentos e sessenta e oito eu fazia um curso pré-vestibular, em São Paulo. Era o Curso Barão, ali na Rua Barão de Itapetininga. Eu trabalhava na Empresa Coldex, e saía do trabalho à tarde, quase correndo para o Curso. Naquela tarde entrei em casa e tinha uma mesa superpreparada, com um bolo lindão. Como sempre, entrei quase correndo, olhei para o bolo e comentei, tolamente: irrr… que bolo bacana! Quem é o aniversariante? Homero, não; Helena, não; Alexandre, não; Marco, não. Enquanto isso a Salete olhava para mim com gesto de desdém. Fingindo, falei: bem, estou com pressa, mas quando eu voltar comemoraremos, com certeza.

Só que quando cheguei de volta do Curso, as crianças já dormiam, o bolo ainda estava intacto e a Salete bem chateada. Fiz tudo para disfarçar, mas não deu. Ela cruzou os braços e falou em termos de bronca: não acredito que você não foi capaz de perceber que hoje estamos comemorando nosso décimo ano de casamento. É muito desrespeito. O choque foi tão grande que não consigo me lembrar qual foi minha reação como desculpa para meu desligamento. Mas o tempo foi passando e a desculpa veio em forma de risos e comentários de familiares. Hoje, cinquenta anos depois, a Salete, sempre que alguém fala sobre o incidente, ela me olha com olhar de reprovação. Mas tudo faz parte da vida.

Continuo tentando me preparar para encontrar a felicidade dentro de mim. E olha que sempre a encontro. Mas aprendi a ter cuidado para não roubar a felicidade de alguém, como roubei a da Salete em um dos dias mais felizes para ela: o décimo aniversário do nosso casamento. Ainda há pouco, eu estava digitando esse papo, aqui no computador, quando o Alexandre chegou ao portão, voltando do Cantá. A Salete gritou com felicidade:

– O bom filho à casa retorna!

E eu fiquei feliz. Pense nisso.

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