Jessé Souza

Exemplo que vem de Alter do Chao mas o alerta vem sendo dado ha tempos 13247

Exemplo que vem de Alter do Chão, mas o alerta vem sendo dado há tempos

Jessé Souza*

Desmatamento, garimpo e esgoto têm provocado uma situação crítica do ponto turístico mais famoso do Estado do Pará, no Distrito de Santarém, em Alter do Chão, considerado o Caribe brasileiro. As águas escuras e barrentas denunciam a grave situação. Não por coincidência, esse mesmo problema vem ocorrendo com as águas do Rio Branco, o principal manancial de água potável que corta o Estado de Roraima de Norte a Sul.

Antes com águas cristalinas, Alter do Chão era conhecido como uma área paradisíaca no Rio Tapajós. Mas os problemas vinham sendo denunciados por ambientalistas e moradores há alguns anos, o que foi ignornado pelas autoridades. No ano passado, os problemas começaram a ser identificados: nas expedições do projeto Águas do Tapajós, pesquisadores identificaram até toxina nas águas do rio.

No entanto, o alerta vinha sendo dado desde 2018, quando a Polícia Federal divulgou um laudo técnico, resultado de perícia realizada na Bacia dos Tapajós, quando foi apontado um “volume absurdo” de sedimentos, como mercúrio e cianeto, lançados no rio através das atividades garimpeiras. O material lançado nos 11 anos anteriores foi comparado a do rompimento da barragem de Mariana, em Minas Gerais, com uma média de 7 milhões de toneladas de sedimento lançados anualmente.

Como não houve providências por parte das autoridades paraenses em todos os níveis de governo, o Rio Tapajós hoje caminha para não ser mais translúcido, cheio de peixes e fonte de geração de emprego e renda pelo turismo. Historicamente, o garimpo se concentra no alto do rio, cerca de 330 quilômetros distantes de onde fica Alter do Chão, mas essa atividade de exploração de minério foi ignorada diante do discurso de que o garimpo só traz desenvolvimento.

Pela distância da área garimpeira e com a Cachoeira de São Luis no meio do caminho, que seriva como uma contenção para os sedimentos, a população de Santarém achava que a poluição não iria chegar. Mas, entre 2019 e 2021, houve um aumento de 363% de área degradada pelo garimpo na terra indígena Mundukuru, onde fica o alto do Rio Tapajós, conforme levantamento divulgado Instituto Socioambiental (ISA). E a poluição avançou por onde antes era um santuário turístico.

Essa realidade precisa servir de alerta para Roraima, pois vivemos uma situação idêntica, com a forte atuação do garimpo nos principais afluentes do Rio Branco, dentro da Terra Indígena Yanomami, onde a atividade garimpeira ilegal provoca drásticos desmatamentos, com destruição do leito dos rios, lançando sedimentos e principalmente o mercúrio. A água barrenta nos principais rios já é uma realidade há pelo menos três anos, especialmente nos rios Uraricoera e Mucajaí, que deságuam no Rio Branco.

Além da ação fortemente poluidora do garimpo, em Boa Vista este problema soma-se ao lançamento de esgoto não tratado no Rio Branco, o que pode ser visto e sentido (devido ao forte odor) no Igarapé Mirandinha, no bairro Caçari, e no Igarapé Caxangá, no Centro, mais precisamente no Mirante do Parque do Rio Branco. São problemas históricos, negligenciados pela Companhia de Água e Esgoto de Roraima (Caer), sempre entregue nas mãos da politicagem.

Apesar da grave situação, não se vê ninguém preocupado em pesquisar para analisar a qualidade água dos nossos principais rios e identificar os problemas para que sejam combatidos a tempo, especialmente o garimpo ilegal, que precisa ser contido antes que a situação fique irreversível, com graves consequências não só para as populações indígenas, mas para toda a população do Estado de Roraima.

O exemplo vem de Alter do Chão, que já está pagando o preço pela inércia das autoridades. Em Roraima, quando as autoridades irão perceber que é preciso agir de forma enérgica antes que seja tarde demais? Será necessário que uma crise de saúde ou uma crise hídrica para achar que temos um problema sério? As primeiras vítimas estão sendo as populações indígenas, que estão morrendo de doenças levadas por garimpeiros e com a destruição da floresta e dos rios.

*Colunista