Jessé Souza

JESSE SOUZA 11477

Matança e (in)segurança pública do lado de cá   Jessé Souza*     Como está muito óbvio, existe uma guerrilha em curso patrocinada pelo crime organizado em Roraima, que há um certo tempo  conta com o intercâmbio de facções criminosas da Venezuela. São nove assassinatos em menos de uma semana, na Capita, sendo a maioria das vítimas de nacionalidade venezuelana. Esse é o único intercâmbio partindo de ambos lados da fronteira que funciona atualmente. E muito bem!   Em artigo anterior, esta coluna já alertava para o grave problema na (in)segurança pública que estamos vivendo. E já houve autoridade afirmando que seria impossível evitar que venezuelanos fossem cooptados por facções criminosas brasileiras. De certo que é difícil evitar tal realidade, mas não significa que é impossível enfrentá-la se a Segurança Pública estiver verdadeiramente organizada.   Aliás, quando se fala em Segurança Pública, isso significa tratar de duas forças policiais atuando de forma completamente distintas, usando linguagens diferentes, não apenas por causa de sua natureza administrativa e de suas atribuições na estrutura organizacional de combate ao crime e na representação dos interesses públicos de manutenção da ordem jurídica.   Essa atuação distinta, que deveria sempre colaborativa, geralmente acaba sendo contaminada por forças políticas partidárias que comandam este e aquele setor, colocando Polícia Civil e Polícia Militar muitas vezes em conflitos administrativos e políticos partidárias, o que gera sérios prejuízos para as instituições e principalmente para a sociedade.   Ninguém pode negar esse (nem tão silencioso) embate político nos bastidores da Segurança Pública, uma vez que existe uma intensa disputa eleitoral. Prova disso são policiais civis e militares, inclusive um delegado, eleitos deputados estaduais.   E se o crime está organizado, mas o Estado não, dividido por interesses partidários e/ou particulares, então o terreno é fértil para o avanço da criminalidade comandada por poderes paralelos. As mortes em Boa Vistas, nestes últimos dias, com claros sinais de execução por acerto de conta ou disputa de poder dentro do mundo do crime, apontam que é preciso sair dessa zona de conforto em ficar esperando a situação encrudescer para só agir depois.   Fica parecendo que as autoridades se acomodam enquanto o crime está em silêncio ou finge estar. Vamos ao exemplo. O Residencial Vila Jardim, no bairro Cidade Satélite, há tempos se tornou refém da ação de criminosos, sem que o poder público tenha conseguido libertar aquela grande parcela de cidadãos que lá moram das mãos de bandidos.   Finge-se que existe uma guarnição plantada lá, que fica apenas passando uma falsa sensação de segurança, sem que haja um trabalho organizado de inteligência e de investigação incessante para impedir que o crime organizado (ou não) se apodere definitivamente da sagrada moradia de pais e mães de família que batalharam  a vida toda pelo sonho da casa própria.   Muitos já foram expulsos de lá e, atualmente, estes preferem alugar os apartamentos por valores bem abaixo do mercado apenas como forma de não abandonar o imóvel. E só quem se sujeita a morar naquele condomínio, de aluguel, é quem não tem mesmo outra opção ou quem realmente não conhece a realidade daquele conjunto habitacional.   Esse é apenas um pequeno exemplo de como a Segurança Pública está desorganizada enquanto o crime se organiza cada vez mais, há muito tempo, inclusive dentro dos presídios, onde agentes do Estado foram cooptados, conforme apontam as investigações em curso.   Não há como evitar que o crime coopte mais membros, brasileiros ou estrangeiros. Mas tem como enfrentá-lo para inibir e conter, se houver um grande pacto por parte das autoridades e, obviamente, interesse político.  Ou ainda não perceberam que estamos numa guerrilha, a não ser a guerra política deles? Ou não querem enxergar mesmo?   O fato é que nessa guerrilha só estão morrendo pessoas (inocentes ou não) insignificantes social e economicamente  para quem está no alto da pirâmide social. Até parece existir um pacto informal diante do quadro que estamos vivendo, do tipo: “Está combinado, vocês agem do lado de lá, e não mexam com quem está do lado de cá. E está tudo certo”.     *Colunista