Entre a cooperação de municípios e um plano com interesses partidários
Jessé Souza*
O que se tratava de apenas uma especulação acabou por se tornar um fato. O prefeito Arthur Henriques (MDB) acaba de criar uma espécie de governo paralelo dentro da Prefeitura que será comandado pela ex-prefeita Teresa Surita (MDB). Trata-se do Grupo de Trabalho para Governança e Cooperação Intergovernamental do Município, cuja coordenadora é a ex-prefeita.
O grupo, que traz um pomposo nome, terá como finalidade fazer cooperação entre a Prefeitura de Boa Vista e demais municípios do interior. É a legalização do que já vem sendo feito por Teresa, que é consultora-geral da PMBV, quando decidiu perambular pelo interior fazendo doações a municípios, especialmente aqueles que não fazem parte da base aliada do seu grupo político adversário.
Está muito clara a finalidade desse Grupo de Trabalho, e os órgãos de controle precisam estar atento para o que será colocado em prática, especialmente porque Teresa tem pretensões políticas e, dentro de seus planos, ser reconhecida no interior do Estado faz parte da estratégia política. Os cofres públicos municipais não podem bancar um interesse político pessoal ou de grupo em detrimento das necessidades mais urgentes na Capital.
Enquanto a Prefeitura de Boa Vista distribui luminárias nos municípios do interior, como foi feito recentemente em Mucajaí, existem bairros afastados do Centro da Capital que padecem da falta de iluminação pública, além de lugares na zona rural e áreas indígenas onde o negrume toma conta durante a noite. Qual a lógica de fazer benfeitorias em outros municípios enquanto a Capital necessita dessa estrutura?
Há uma urgente necessidade de os órgãos fiscalizadores, especialmente a Câmara de Vereadores, passem a verificar imediatamente essas doações de luminárias e saber por que esses equipamentos não estão sendo instalados na zona rural e áreas indígenas, bem como em bairros longínquos onde há precariedade do serviço de iluminação pública.
É incongruente que a Prefeitura de Boa Vista passe a ajudar municípios do interior, por um visível interesse político, enquanto a cidade carece de graves problemas, como no trânsito, drenagem e asfaltamento nos bairros. Os cofres públicos não podem bancar um projeto que visivelmente não corresponde aos anseios dos munícipes boa-vistenses.
Esta ação é igualmente inaceitável neste momento em que a Capital precisa, isto sim, de uma grande mobilização no atendimento primário para enfrentar o avanço do coronavírus, seja para uma mobilização visando a testagem em massa, agilidade na vacinação de toda população, distribuição de máscaras e campanhas incisivas de distanciamento social e práticas de higiene pessoal. Quando prefeita, Teresa negligenciou ações nesse sentido.
Torna-se necessário que o Ministério Público analise e investigue o Decreto Nº 52/E, de 27 de abril de 2021, que criou esse governo paralelo para fins de “assistencialismo municipal”. Afinal, Boa Vista está longe de ser uma cidade com infraestrutura adequada para que possa se achar forte o suficiente para ajudar municípios do interior por meio de uma força-tarefa.
Sim, avançamos muito, a cidade é elogiada e reconhecida por sua organização, mas é só avançar para a zona oeste, onde estão os bairros mais pobres, que os problemas ficam bem visíveis. Nessas áreas, nem semáforos existem nos cruzamentos mais movimentados. E isso é apenas algo que está visível para qualquer cidadão. Nesse inverno, uma caminhada por esses bairros revela as necessidades mais urgentes na infraestrutura da Capital.
Por que não pensar primeiro nos problemas da Capital antes de querer ajudar outros municípios, principalmente neste momento quando vamos entrar para uma nova campanha eleitoral?
*Colunista