Garimpo ilegal já começa vencendo na lei que favorece quem compra ouro ilegal Jessé Souza*
A mais recente operação de combate ao garimpo legal na Terra Indígena Yanomami revelou que é necessário muito mais que uma ação de três dias para combater esse tipo de crime na imensa floresta amazônia. Não basta apenas caçar garimpeiros dentro dos grotões que destroem o meio ambiente.
É necessário atacar princiopalmente duas frentes: quem financia o garimpo e quem compra o ouro extraído ilegalmente. Mas a luta já começa a ser perdida na legislação, que beneficia especialmente quem compra ouro proveniente da ilegalidade e não consegue fiscalizar quem vende.
A Lei 12.844/2013, que regula a compra, venda e o transporte do ouro no país, diz que a venda do mineral ocorre de boa-fé do vendedor, ou seja, isenta de qualquer responsabilidade os compradores. A informação sobre a origem do ouro é autodeclaratória por parte do vendedor no momento do preenchimento da nota fiscal. Essa é a porta para todo o grande esquema.
É óbvio que alguém que chega para vender o ouro declare que ele foi extraído de terras indígenas ou tenha origem de qualquer fonte ilegal. Na hora da investigação, as grandes compradores de ouro ilegal acabam sendo isentos de qualquer responsabilidade e de provar a origem do ouro adquirido por elas.
O que alimenta o grande esquema é o que os especialistas chamam de “boa- fé presumida”, uma vez que a responsabilidade de provar de onde vem o ouro é do vendedor. Logo, na hora da fiscalização, as empresas facilmente se livram porque alegam que quem vendeu ouro foi quem mentiu. E também nunca se alcança os vendedores. Simples assim.
Então, é necessário que os legisladores mudem a lei que favorece os grandes compradores de ouro extraído ilegalmente das terras indígenas. Exatamente por isso que é difícil combater a comercialização ilegal do minério, além da inexistência de uma ação fiscalizatória constante e atuante para coibir os grandes esquemas montados na comercialização.
Além disso, é necessário chegar aos financiadores do garimpo, os quais estão em confortáveis mansões fornecendo aeronaves, combustíveis, maquinários e as grandes estruturas que a atividade de garimpagem exige. Porém, como se trata de gente importante, inclusive autoridades, nunca se chega a estes grandes alimentadores da atividade criminosa.
Atualmente, o Exército nem as forças policiais sequer estão conseguindo chegar aos grupos milicianos que dão sustentação ao garimpo, os quais não se intimidam em atacar os índios que tentam fiscalizar e proibir o acesso às frentes de exploração, muito menos recuam frente aos policiais federais, os quais foram recebidos a tiros no Rio Uraicuera, que é a princial via fluvial dos garimpos na Terra Indígena Yanomami.
A batalha contra o garimpo ilegal tem que começar pela mudança na legislação, paralelamente com ações constantes de combate aos financiadores das frentes garimpeiros e de combate ao braço armado que protege a garimpagem em terras indígenas. Mas não há interesse para que isso mude. Ao invés disso, os defensores do garimpo contam com a ajuda de parlamentares que estão no Congresso tentando aprovar projetos que liberam o garimpo em terras indígenas, a exemplo do Projeto de Lei 490, que está pronto para ser votado no Plenário da Câmara Federal, em flagrante inconstitucionalidade.
O Brasil está se tornando uma grande máfia que tenta se legalizar com apoio de uma bancada que age abertamente contra povos indígenas, meio ambiente e contra servidores públios, sem que sejam freados. Os tempos são sombrios.
*Colunista