Jessé Souza

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A militarização de escolas como bengala de uma falsa solução

Jessé Souza*

Há um declarado e acelerado movimento pela militarização das escolas públicas em Roraima, o qual tem pressa em realizar audiências públicas pouco divulgadas na mídia, o que impede a opinião pública acompanhe com transparência o encaminhamento das propostas. Surgiu até um movimento em oposição à militarização, encabeçado pelo Comitê Estadual em Defesa da Escola Pública de Roraima.

Mas, independentemente do debate que está sendo travado com certa força nas redes sociais, o programa de militarização das escolas revela aspectos muito mais amplos do que vem sendo exposto nesse confronto de opiniões, como a questão da segurança pública, o papel da família e a falência total da educação pública.  O caminho parece sombrio. Aos fatos.

A insegurança passou a fazer parte da vida da escola, uma vez que ela é parte viva da sociedade e não há como dissociá-la da realidade em que ela está inserida. A segurança pública perdeu a guerra para o crime organizado e não consegue mais devolver a tranquilidade ao templo do saber que é a escola. Nesse aspecto, a Polícia Comunitária foi apenas um engodo do governo.

Não se pode esquecer que o então governo Neudo Campos prometeu uma polícia cidadã exportada do Canadá, que foi apenas um sonho (ou delírio político), embora tenha como positivo o Instituto de Formação Superior de Segurança Pública, que nunca chegou a formar policiais com esta visão de polícia de primeiro mundo pregada à época. 

Outros governos anunciaram o Ronda nos Bairros, modelo de privatização de viaturas e equipamentos que foi copiado pelo atual governo, com a contratação de empresa de Manaus (AM). Esse programa faliu nos governos anteriores, enquanto o crime se organizava no principal presídio de Roraima a ponto de hoje desafiar os poderes constituídos.

Como a politicalha destrói tudo, a polícia cidadã nunca existiu, assim como a Polícia Comunitária foi um surto de algum sonhador que queria lutar contra forças poderosas e nem um pouco ocultas na Segurança Pública que até hoje serviu apenas para eleger policiais civis e militares como deputados estaduais.

Foi nesse contexto que o crime organizado venceu, com as escolas dentro da realidade  de violência urbana somada ao abandono por parte das autoridades. Não há como fugir dessa vergonhosa realidade cujo suco de insegurança são corpos esquartejados e desovados em áreas dominadas por facção venezuelana e nas cercanias de Boa Vista.

Já que a família como instituição verdadeiramente responsável pela educação das crianças faliu, com pais jogando a responsabilidade para a escola, a militarização passou a ser a oficialização da incompetência do governo com a segurança pública, com as políticas públicas voltadas às famílias mais pobres (incluindo programas para crianças e adolescentes), além do desavergonhado uso da Educação como instrumento partidário.

As escolas se transformam em comitês eleitorais, com diretores e professores cargos comissionados transformados em cabos eleitorais, sendo obrigados até a fazer bandeiradas em períodos eleitorais nos semáforos e centros comerciais.  Pior: a Secretaria de Educação é usada como moeda eleitoral, sendo loteada a grupo político aliado em troca de apoio partidário a cada governo que passa.

Não é de hoje que o titular ou a titular da pasta de Educação foi tesoureiro(a) ou coordenador(a) de campanha do governador da vez.  Foi assim com Neudo Campos e está sendo assim agora. Não há como pensar em política educacional enquanto a Educação for usada por interesses partidários ou eleitoreiros.  Desde longos tempos as secretarias são loteadas após a eleição ou às vésperas delas. 

Então, a militarização das escolas surge não apenas como resultado da falência do sistema educacional da forma preconizado pela Constituição Federal, mas também como estratégia para formar alunos subalternos à pedagia do “sim, senhor; não, senhor”,’ visando uma sociedade apática e/ou alienada.

E ainda serve para simular que a segurança pública está muito bem com as escolas tomadas por militares, enquanto a violência avança e torna a escola militarizada uma ilha em si mesma, cuja realidade cruel será vivenciada fatalmente fora dos muros da escola depois que a sirene tocar. É importante que haja, sim, escola militar, mas como uma opção e não como solução para todas as desgraças que estamos vivendo.

A implantação de escolas militares como política educacional é o atestado de nossas incompetências como governo, família, gestor e político. É o nosso fracasso de política educacional que opta por bater continência a formar cidadãos plenos com senso crítico e preparados para o mercado de trabalho e até mesmo para a vida quando a família assume seu papel de educar ao mesmo passo que a escola transmite conhecimento.

Como estamos em ano eleitoral, então é o momento de a sociedade observar como vão se comportar gestores e professores, bem como autoridades que gerenciam a Educação. Aí saberemos por que chegamos ao fundo do poço de nossa política educacional, cuja militarização é uma bengala que escora uma falsa solução para nossos fracassos na segurança pública, na educação e no papel como família formadora de cidadãos.

*Colunista