Propina em nome de Deus: quando o demônio veste prata e ouro
Jessé Souza*
As igrejas pentecostais e neopentecostais começaram a ganhar força na política partidária a partir das discussões para a elaboração da Assembleia Nacional Constituinte, responsável pela aprovação da Constituição Federal de 1988, que ficou conhecida como a Carta Cidadã. E desde lá essa força religiosa só se ampliou até os dias atuais, quando pastores mostraram quais eram suas verdadeiras intenções.
Naquela época, nas discussões na Constituinte, a alegação era a necessidade de discutir a pauta conservadora na construção das leis, quando os religiosos evangélicos se articularam para eleger parlamentares dentro de suas denominações religiosas e chegaram a formar uma bancada influente no Congresso, a da Bíblia (evangélicos), que se aliou a outras bancadas, a do Boi (ruralistas) e a da Bala (armamentistas e afins), formando o bloco BBB, cuja atuação se destaca contra direitos humanos e minorias no país.
No momento atual, a bancada da Bíblia ganhou destaque no governo Jair Bolsonaro, com pastores tendo acesso privilegiado ao presidente mesmo que eles não ocupassem cargos no governo, inclusive com os pastores midiáticos ganhando passe-livre e um deles se tornando inclusive conselheiro do presidente, Silas Malafaia.
Os religiosos foram instalados estrategicamente nos ministérios, a exemplo dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura que passaram a atuar nos bastidores do Ministério da Educação (MEC) durante a gestão do então ministro Milton Ribeiro, um pastor que é líder do Ministério Cristo para Todos, um ramo da Assembleia de Deus, com sede em Goiânia (GO).
O hoje ex-ministro Milton Ribeiro foi preso preventivamente nesta quarta-feira pela Polícia Federal no caso que investiga a influência dos pastores que atuavam em uma espécie de “gabinete paralelo” dentro do MEC, esquema este que foi revelado pelo jornal Estado de São Paulo, o ‘Estadão’. A matéria mostrou que não era exatamente implantar uma pauta conservadora no MEC a finalidade desses pastores.
As investigações apontam que, no gabinete paralelo formado por pastores, os religiosos comandavam a agenda do então ministro e intermediavam destinação de verbas e as direcionava para aliados políticos a partir de pedidos de propina em dinheiro e até em barra de ouro em troca da liberação de recursos para escolas e creches.
No país onde os pastores e bispos midiáticos são milionários e possuem até emissoras de TVs para pregar para o seu rebanho, inclusive com jatinho para viajar ao exterior, quem banca essas igrejas são pessoas pobres, desiludidas das políticas governamentais e que buscam curas para os seus problemas pessoais, existenciais e de saúde nessas igrejas; ou acreditam piamente na teologia da prosperidade do é dando dinheiro que se recebe mais dinheiro.
Então, diante desta realidade, não poderia dar em outra. Pastores pentecostais e neopentecostais não hesitaram em buscar o poder por meio da política e, fisgados pela corrupção como um atalho para ganhar mais dinheiro que não do dízimo dos fiéis, foram flagrados pedindo propina em uma pasta importante para a sociedade, a Educação. Logo ela em que os pastores pregavam que queriam um ensino em favor da família, de Deus e da Pátria.
Mas a verdade dos fatos é que eles queriam apenas o vil metal, igualmente como querem seus líderes e mestres que ficaram milionários liderando igrejas a partir de seus programas midiáticos e que se fortaleceram dentro de um governo que prega exatamente uma pauta conservadora em nome da família, de Deus e da Pátria.
O demônio veste prata e ouro.
*Colunista