Debate, movimento pró-garimpo e a fatura que começou a chegar à população
Jessé Souza*
O debate do presidente Jair Bolsonaro (PL) no Jornal Nacional, na noite de segunda-feira, não trouxe novidade em relação à possibilidade de um fato novo que pudesse influenciar a eleição dentro do cenário de polarização entre esquerda e direita. Porém, apresentou uma posição que interessa à Amazônia, especialmente a Roraima, que foi a defesa contra a destruição de equipamentos e veículos apreendidos durante operações contra o garimpo ilegal.
O presidente voltou a defender com veemência sua posição contra a destruição dos bens de empresários do garimpo ilegal, mesmo que exista decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) respaldando que estes bens apreendidos possam ser destruídos imediatamente diante da impossibilidade de transportá-los para a cidade. A pergunta feita pelo apresentador William Bonner foi muito pertinente: “A quem interessa não destruir esses equipamentos?”
Obviamente que só interessa aos grandes operadores do crime organizado que se tornou o garimpo ilegal nas terras indígenas, os quais movimentam fortunas milionárias, esbanjando mansões, carros luxuosos e helicópteros no quintal de casa, conforme vêm apontando as operações da Polícia Federal em outros estados, para onde vai a riqueza produzida pelo ouro extraído principalmente da Terra Indígena Yanomami, o qual é “esquentado” de forma fraudulenta por empresa no Pará, que detém autorização de lavra usada para dar aspecto de legalidade à comercialização do minério extraído do garimpo ilegal.
Enquanto isso, restam aos garimpeiros e indígenas a pobreza, doenças, violência e mortes, além de um ônus incalculável à toda sociedade brasileira, diante da devastação do meio ambiente, destruição dos reservatórios de água potável e contaminação de peixes por mercúrio, pescados estes que alimentam boa parte da população amazônida. A propósito, no mesmo dia do debate circulou o resultado da pesquisa realizada por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Instituto Socioambiental (ISA), do Instituto Evandro Chagas e da Universidade Federal de Roraima (UFRR), que aponta alta contaminação de pescados na Bacia do Rio Branco.
Na manhã seguinte ao debate, a PF fez busca e apreensão de aeronaves de um empresário de garimpo, investigado por dar apoio ao garimpo ilegal em Roraima, o qual é candidato à deputado federal tendo como bandeira principal a defesa do garimpo ilegal. À frente do movimento pró-garimpo, ele articulou a aprovação de uma lei estadual que justamente proíbe as forças policiais e órgãos ambientais estaduais de destruírem os equipamentos do garimpo,
bem como manda devolvê-los imediatamente aos proprietários a título de fiel depositário.
Como essa lei não tem qualquer validade para ser aplicada nas operações dos órgãos federais, ela serve apenas para incentivar o garimpo ilegal, ludibriar garimpeiros em período eleitoral e servir da bandeira de campanha para conseguir votos de apoiadores do garimpo. E essa fala do presidente no debate na segunda-feira tem essa finalidade de dar reforço ao grande esquema nacional, o qual conta inclusive com pastores que chegaram a pedir propina em barra de ouro para facilitar a liberação de recursos do Ministério da Educação.
Mas, o que verdadeiramente sobra de todos esses acontecimentos dos últimos dias, é que começou a chegar a primeira fatura real do garimpo ilegal em Roraima: a contaminação dos peixes por mercúrio. Outros reflexos já existiam, como o avanço da criminalidade e o fortalecimento do crime organizado, mas a população não costuma a enxergar isso dessa forma. As pessoas só começam a acreditar quando a conta mexe no bolso ou na saúde de cada indivíduo. Uma nova conta ainda estar por chegar, caso não haja providências drásticas: uma forte crise hídrica. Aí já será tarde demais para reclamar.
Os tambores estão tocando…
*Colunista