Jessé Souza

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Os fios da ilegalidade que se conectam a um grande esquema político nacional

Jessé Souza*

A defesa do garimpo ilegal na Amazônia não é tão somente uma ação do crime organizado que saiu das grandes cidades para ganhar dinheiro cavando buracos e derrubando árvores no meio da floresta inóspita, a fim de financiar suas atividades criminosas.  Essa é apenas a ponta de lança de um poderoso movimento político e econômico que os usa para ajudar na legalização dessa atividade, assim como indígenas e garimpeiros são peças utilizadas por este movimento liderado por políticos gananciosos e empresários que não gostam de pagar impostos. 

Foi exatamente isso que mostrou uma matéria divulgada na noite de domingo, pela Folha de São Paulo, a qual aponta que o advogado e empresário Luís Felipe Belmonte, político aliado do presidente Jair Bolsonaro, atuava junto ao Palácio do Planalto para legalizar a mineração em terras indígenas ao mesmo tempo em que cooptava lideranças indígenas e repassava dinheiro para o filho, o marqueteiro e a advogada do presidente.  

Todo o esquema acabou vindo à tona a partir da busca e apreensão de celulares e computadores durante operação da Polícia Federal que investiga os atos antidemocráticos de 20 de abril de 2020, cujos diálogos extraídos fazem parte do inquérito policial revelado pela matéria do jornal paulista. Importante lembrar que Belmonte foi um dos principais responsáveis por tentar criar o partido Aliança Brasil para que fosse chamado de seu pelo presidente, mas que acabou não dando certo.  

Conforme a matéria, enquanto agia no Planalto para tentar legalizar o garimpo ilegal,  o empresário cooptava lideranças indígenas no Amazonas, fazendo pequenos pagamentos em dinheiro, inclusive um dos que recebeu foi Alvaro Tukano, que apoia a mineração no Alto Rio Negro e que já esteve com o presidente Bolsonaro e o acompanhou em uma visita à Terra Yanomami no ano seguinte. Foi no mesmo ano dessas articulações, em 2020, que Bolsonaro enviou um projeto de lei ao Congresso para legalizar o garimpo, assinado pelos então ministros da Justiça, Sergio Moro, e Minas e Energia, Bento Albuquerque.

Como pode ser analisado a partir do que foi divulgado pela FSP, as atividades ilegais de empresários de garimpo na Terra Yanomami fazem parte de um grande esquema nacional,  cujos financiadores faturam alto explorando a mão de obra dos garimpeiros, propinando indígenas, se beneficiando da atuação de facções em terras indígenas e, acima de tudo, com apoio do governo e do Congresso, que fecham os olhos para as atividades criminosas não só na Terra Yanomami, como também na faixa de fronteira Norte do país. 

A prova disso foi o voo do helicóptero venezuelano  sem identificação que, no mês passado, invadiu o espaço aéreo brasileiro com cinco corpos de garimpeiros em decomposição pendurados em uma rede, atravessando metade do território de Roraima para deixar a carga humana macabra numa região de apoio ao garimpo ilegal no Município de Mucajaí.  Além dos inúmeros voos clandestinos que partem diariamente para garimpos ilegais nos dois lados da fronteira.  

Esse grande esquema tem seus representantes na Amazônia, os quais sustentam seus lacaios políticos locais, financiam candidaturas almejando poder político absoluto e propinam lideranças indígenas que pensam apenas no seu próprio bolso ou nos seus interesses particulares querendo a política como um grande negócio.  E o garimpo ilegal é o sustentáculo financeiro e político do grande pacto de quem não quer pagar imposto, declarar riquezas, remunerar legalmente os trabalhadores, dar contrapartida social nem assumir o ônus ambiental.  

A ilegalidade é um grande negócio, não só no que diz respeito ao garimpo, mas em outras atividades ilícitas não combatidas na Amazônia, principalmente no atual governo que fez um desmonte ambiental e fechou os olhos para o crime que vem se organizando com toda força nas fronteiras, o qual tem ramificações em todos os setores da sociedade, especialmente dentro dessa política que tenta se estabelecer no país.

*Colunista