Jessé Souza

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A realidade amazônida pincelada em três matérias nacionais

Jessé Souza*

Três  matérias compartilhadas ontem em nível nacional servem para mostrar o intenso bombardeio contra o meio ambiente nos últimos anos, no País, especialmente na Amazônia. Uma delas diz respeito a um despacho do presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Eduardo Bim, para anular multas ambientais que totalizam R$ 16,2 bilhões referentes ao arquivamento de multas aplicadas a desmatadores, madeireiras e queimadores de matas. 

Tudo isso graças a uma artimanha legal em  deixar os processos parados por mais de três anos, o que permite a autuação caducar e, por conseguinte, tudo é arquivado por prescrição. O arquivamento não apenas beneficia os transgressores do meio ambiente, os livrando de multas, como também incentiva a impunidade aos crimes ambientais.  Basta que o órgão ambiental deixe os processos engavetados até que possam ser arquivados por decurso de prazo. Simples assim.

Não por acaso, esses três anos são exatamente o tempo desse atual governo. Vale ressaltar que o próprio presidente Jair Bolsonaro (PL) é um crítico contumaz das multas ambientais. Ele próprio chegou a ser multado por pescar em área protegida, em janeiro de 2012, e desde lá vem repetindo que quer acabar com a “indústria da multa” no Brasil. A propósito, sua multa prescreveu em 2019; lembrando que o agente que o autuou foi removido de seu cargo.

Outra matéria que traz grandes preocupações é a que diz, com base em um estudo divulgado, que cerca de 30% do  ouro produzido no Brasil é irregular. O estudo não afirma isto textualmente, mas obviamente que se trata de minério proveniente do garimpo ilegal, cuja maior parte é extraída  em Rondônia, Pará e Roraima, onde a Terra Indígena Yanomami é o principal alvo, sendo o maior patrocinador um empresário candidato que anda “desfilando enfeitado de periquito”, conforme denunciou o candidato ao Governo de Roraima pelo Psol, Fábio Almeida, durante o debate de domingo realizado pelo Grupo Folha é TV Cultura.  

Conforme um dos autores do estudo, o pesquisador Bruno Antônio Manzolli, do Centro de Sensoriamento Remoto (CSR) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), ele atribui esse crescimento da quantidade de ouro ilegal minerado a três fatores: valorização do minério no mercado internacional, sucateamento de órgãos ambientais no atual governo e a negligência da Agência Nacional de Mineração (ANM), que distribui autorização de lavra sem os devidos critérios a fim de evitar fraudes ou que possa ser usada para “esquentar” a extração de ouro nos garimpos ilegais. 

O Ibama, por exemplo, não consegue mais sequer analisar os processos das autuações, as quais estão prescrevendo, e muito menos tem estrutura para fiscalizar o garimpo ilegal. Já a ANM emite autorização para  pesquisa até mesmo em terras indígenas, mesmo que a lei não permita o garimpo e a mineração nessas áreas. Sequer há uma rigorosa fiscalização ao garimpo ilegal, que inclusive se utiliza de aeronaves de empresas contratadas pelo Governo Federal para a saúde indígena, conforme fartas evidências mostradas nas investigações da Polícia Federal. 

Enquanto tudo isso ocorre, uma terceira matéria mostra o poderio dos novos “barões do ouro ilegal”. Conforme a  matéria em questão, a Justiça mandou prender o  “rei do ouro” por suspeita de garimpo ilegal na Amazônia. Não é a primeira vez que um empresário de garimpo milionário é alvo da PF. Eles passaram a ficar ricos a partir do avanço do garimpo ilegal, que de 2020 para 2021 subiu 44%; de 5,1 toneladas para 7,5 toneladas. Essa elite é mantida pela exploração da mão de obra de milhares de garimpeiros que se embrenham na floresta amazônica com a ilusão de que vão ficar ricos do dia para a noite, em um trabalho desumano que não apenas destrói o meio ambiente como também ameaça a vida dos povos indígenas e a deles própria. 

Como pode ser notado, não se pode falar em desenvolver a Amazônia sem frear essa sanha destruidora e o crime organizado que se instalou no garimpo ilegal e em outras atividades igualmente ilegais. A questão agora não é ser contra mineração, exploração de madeira e o agronegócio na Amazônia, e sim ser contra o crime organizado que se apossou da região e que faz surgir milionários com essas atividades criminosas, enquanto a pobreza aumenta e o meio ambiente sofre severas agressões que irão provocar sérias consequências para todos, indígenas e não indígenas. 

*Colunista