Jessé Souza

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O fim de mais de uma década de espera, mas ainda é preciso fazer uma desratização

Jessé Souza*

Finalmente, foi publicada ontem uma resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) reconhecendo o interesse estratégico das obras da linha de transmissão de Tucuruí, que interligará o Estado de Roraima à rede elétrica nacional a partir de Manaus (AM). Era o que faltava para garantir segurança jurídica para o consórcio Eletrobras e Alupar dar início às obras a partir de outubro, conforme prognóstico do Ministério de Minas e Energia.

O Linhão de Tucuruí, com 715Km de extensão entre Manaus e Boa Vista, foi leiloado há 11 anos, ainda no governo de Dilma Rousseff, espera esta que chegou ao fim somente quando foi assinado um acordo na Justiça Federal, na semana passada, entre União, Ministério Público Federal (MPF), a concessionária Transnorte Energia e a Associação Comunidade Waimiri Atroari  (ACWA), que representa os povos indígenas, cujo território será atravessado por 122Km do linhão.

Tucuruí é apontado pelos entusiastas como a redenção que irá proporcionar o esperado desenvolvimento do Estado de Roraima, garantindo energia confiável que possibilitará a instalação de indústrias e o fim dos apagões que tanto castigam o povo roraimense, especialmente para aqueles que moram no interior, onde os blecautes são constantes.

Para quem não vive de promessas de política partidária e não se empolga com anúncios entusiastas dos políticos, é bom lembrar que, em um passado não muito distante, os mesmos que se empolgam hoje com os discursos de Tucuruí eram os mesmos que alardeavam que o asfaltamento da BR-174 entre Manaus e Boa Vista seria a redenção do Estado. Pois, a rodovia hoje está asfaltada até a fronteira com a Venezuela, mas esse desenvolvimento dos sonhos não chegou.

Então, é bom não ficar caindo em seguidos contos do vigário e acreditando em prognósticos que saem da boca de políticos. Há ainda muito a ser feito em um Estado que não consegue sequer dar dignidade a famílias produtoras que moram em isoladas regiões onde vicinais ficam nos atoleiros e com pontes de madeira desabando. Isso só para citar um fato.

Obviamente que já avançamos muito. Mas não será do dia para a noite que iremos sair da economia do contracheque governamental, sistema este que os políticos querem roer o osso até o último momento, pois é a partir dessas transferências de recursos federais e de emendas parlamentares é que nasce a corrupção, esse sim o grande mal que é responsável pelas desgraças que vivemos até hoje, do qual precisamos nos livrar definitivamente.

Não podemos nos esquecer, jamais, das duras palavras contidas na publicação que o então secretário estadual de Saúde, Ailton Wanderley, compartilhou em seu perfil no Facebook, em abril de 2019, se despedindo ao se demitir da Sesau, afirmando textualmente que aquela pasta estava “mergulhada em um pântano de corrupção”. Embora tenha sido um desabafo sobre a situação da saúde pública, as palavras servem para todos os setores governamentais em todos os níveis.

Ele escreveu: “Enquanto forem permitidas empresas de deputados estaduais, federais e senadores vendendo serviços dentro da secretaria ; enquanto for permitido uma cooperativa distribuindo plantões a quem não trabalha; enquanto forem permitidas famílias com poder político vendendo serviços dentro da secretaria; enquanto forem permitidos médicos concursados vendendo serviços para a secretaria; enquanto forem permitidos judicializar procedimentos para beneficiar um grupo de pessoas; haverá corrupção no governo”.

Então, antes de comemorarmos algo antecipadamente, enchendo o peito de alegria pelo início das obras do Linhão de Tucuruí, é necessário lutar pelo fim da corrupção sistêmica que aniquilou o Estado: das prisões do esquema do DER, das “bolachas e bananeiras” da Codesaima, do caso dos “gafanhotos”, dos desvios de dinheiro do sistema prisional e do transportes escolar, da corrupção sistêmica da Sesau e de muitos outros que ocorreram desde a instituição do Estado.

Que venha o Linhão de Tucuruí! Mas essa importante obra não irá operar nenhum milagre se o Estado não for realmente desratizado. Aí, sim, poderemos começar a acreditar em novos tempos de verdade.

 *Colunista