É preciso buscar o passado para explicar um movimento que beira o messianismo
Jessé Souza*
Qual é a surpresa no caso do empresário de posto de gasolina paraense que foi preso acusado de terrorismo, no Distrito Federal, e entregou todos os detalhes de forma bem rápida? Há quase dois meses, os golpistas estão agindo de cara limpa, em frente dos quarteis do Exército, sem qualquer temor porque se acham heróis de uma resistência bolsonarista.
Os manifestantes estão tomados por uma alucinação coletiva a ponto de acharem que o ainda presidente Jair Bolsonaro é mesmo um enviado celestial para salvar o país. É um messianismo esquizofrênico a ponto de, ao ver o seu mito, danam-se a rezar como se estivessem na frente de um predestinado. Essas pessoas passaram a viver em um mundo paralelo.
A prisão do empresário George Washington Sousa, que viajou do Pará até o Distrito Federal com seu carro abarrotado de armas e munições, para se juntar a outros manifestantes em frente do quartel, revelou o nível dessa loucura em verde e amarelo. Eles não temem revelar seus planos porque acham que realmente estavam fazendo o certo para salvar o país de um comunismo que eles enxergam em suas mentes, tão claro quanto a luz do dia.
E mais: estão crentes que os militares e as polícias estão a favor deles ou, no mínimo, torcendo por eles. A lavagem cerebral que os alimenta diariamente por grupos de WhatsApp dá como certo que algo vai acontecer no dia 31 de dezembro que irá provocar uma intervenção federal. Isso está em todos os grupos de Whats (das famílias, de amigos, de comunidades do interior, de trabalho e principalmente daqueles criados para alimentar o golpismo).
Vídeos que circulam nas redes sociais diariamente mostram como esses manifestantes acreditam piamente nas mentiras que eles mesmos criam, a exemplo de que algo vai acontecer nas próximas 72 horas – essa promessa vem sendo repetida desde o resultado do segundo turno; mesmo que nada tenha acontecido, essas pessoas ainda creem que realmente possa ocorrer alguma coisa em 72h.
Então, não se pode duvidar do que as lideranças desses movimentos são capazes, pois, afinal, tais elementos abduzidos por essa força de patriotada estão imbuídos de um propósito messiânico. E isso não é uma ironia. Buscando fontes históricas, é possível saber que o Brasil já passou por vários movimentos messiânicos. Um deles foi a Revolta dos Muckersem em 1874, no Rio Grande do Sul.
Assim como ocorre hoje com o bolsonarismo, em que as pessoas enxergam nele um predestinado, naquela ocasião um grupo de colonos alemães reconheceu Jacobina Mentz Maurer como Jesus Cristo e passaram a viver como ela e o marido ordenavam. Então surgiu uma seita que acabou por dividir a comunidade alemã, cujo final do enredo foi um banho de sangue depois que as tropas estaduais decidiram agir.
Hoje, no Brasil, os ingredientes estão todos aí, como um movimento que usa o lema Deus, Pátria e Família, incentivando o armamentismo e pregando o combate a um comunismo como instrumento diabólico. Eles não estão só. Apenas os mais extremistas e os mais suscetíveis a essa lavagem cerebral estão em frente dos quartéis. Mas tem muitos malucos por aí acreditando piamente em uma trama demoníaca que vai aniquilar o país.
A prisão do empresário paraense, que terá que explicar suas relações empresariais suspeitas, inclusive com atividade ligada ao garimpo ilegal, deixou tudo bem claro a respeito do que essas pessoas são capazes. E isso precisa ser combatido veemente para que os malucos voltem novamente para suas tumbas, os quais sentiram-se à vontade para sair à luz do dia nesses últimos quatro anos.
*Colunista