Processo para terceirizar HGR é retomado sob um retumbante silêncio das autoridades
Jessé Souza*
Está muito difícil compreender a flagrante contradição do governador Antonio Denarium em relação à situação do Hospital Geral de Roraima (HGR), a maior e mais importante unidade de saúde do Estado. Em seus perfis nas redes sociais, o governador tem insistido em compartilhar elogios de internautas aprovando o serviço prestado no HGR, apontado como de alta qualidade.
Nas mais recentes postagens, foram compartilhados depoimentos de familiares de pacientes que por lá estiveram internados, os quais rendem fartos agradecimentos à estrutura do hospital e ao atendimento dos profissionais do HGR. Os comentários de internautas, a maioria servidores, também abrem um longo fio de elogios apaixonados a cada postagem, além do tradicional puxa-saquismo.
No entanto, contraditoriamente, o governador deu anuência para reiniciar o processo para terceirizar o HGR por meio da contratação de uma Organização Social de Saúde (OSS), sem licitação, apenas por análise de documentos por uma comissão especial. Vale ressaltar que a Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) tentou concluir tal contratação no apagar das luzes do ano passado, mas recuou.
Na tentativa de concluir logo o processo no último dia útil do ano passado, dia 30 de dezembro, não houve qualquer divulgação ou explicação por parte da Sesau, muito menos do Governo do Estado. No entanto, diante das críticas nas redes sociais e denúncias que circularam nos bastidores, uma vez que a imprensa também não deu muita bola para este fato, foi suspenso o processo.
Esta suspensão acabou por apontar que o processo não estava cercado de todas as garantias para que não fosse questionado na Justiça. Então, foi decidido que o Conselho Estadual de Saúde (CES) precisava dar o aval, quando foi aprovada uma resolução, em vigor desde o dia 4 passado, que autoriza a Sesau a realizar um chamamento público para a contratação de uma OSS.
Para quem ainda não sabe, OSS é uma entidade de direito privado que se autointitula sem fins econômicos, uma espécie de empresa privada boazinha que não quer lucro algum por seus duros trabalhos. A OSS a ser contratada terá ampla autonomia administrativa no HGR, o que jamais foi visto ou testado em Roraima, estando habilitada a receber recursos financeiros, contratar pessoal sem concurso e administrar toda estrutura do hospital, tanto pessoal, predial e equipamentos.
Logo, se o governador anda espalhando em suas publicações e institucionais que o HGR está bem estruturado e equipado, com bons profissionais e pacientes satisfeitos, então por que essa fixação em terceirizar o principal hospital do Estado?! E isto sabendo que, nos estados onde a saúde foi entregue a OSS, surgiram denúncias sobre irregularidades e insatisfação da população com a péssima qualidade dos serviços.
É necessário que as autoridades mostrem a cara e expliquem esta lógica direitinho. Pois, o que se sabe até agora é que atual gestão da Sesau vem sendo conduzida por pessoas que, em anos anteriores, foram acusadas de implantarem uma “indústria de compras sem licitação”, inclusive apontada pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Saúde.
Além disso, houve denúncia a respeito de um contrato de cerca de R$36 milhões com uma empresa do Rio Grande do Norte para fornecer alimentação, além de outra sobre o aumento de quase R$500 mil no contrato de uma UTI aérea com uma empresa de Goiânia. Fatos estes que não ganharam qualquer repercussão.
Importante ressaltar que o contrato desta OSS deverá custar aos cofres estaduais o valor de R$331,3 milhões por ano, com parcelas mensais de quase R$27 milhões, mais R$7,7 milhões para investimentos. E sabe-se que a especialidade de uma OSS é justamente não precisar realizar concurso público e muito menos promover licitação para compras e contratos.
Logo, alguém precisa dar uma explicação que seja satisfatória para a opinião pública. Porque, até aqui, reinou o silêncio absoluto e perturbador. Além das dúvidas sobre a qualidade da saúde pública, o que pode colocar a vida das pessoas em risco, é muito recurso público em jogo para pouca ou nenhuma explicação por parte das autoridades.
*Colunista