A política da extrapolação do primeiro-damismo como um projeto particular
Jessé Souza*
Enquanto a criminalidade avança a um nível preocupante, somada a um crescimento assustador da imigração desordenada que infla a pobreza, a população de Roraima assiste, inerte, a efetivação máxima de uma política que sempre existiu desde o Brasil colonial, mas que floresceu muito bem por aqui, em que os políticos criam suas dinastias a fim de perpetuar o poder através de seus familiares, especialmente filhos e esposas.
São vários os exemplos de dinastias políticas, cujas mais recentes, já no tempo de Estado, foram bem representadas pelas famílias dos governadores Ottomar Pinto (já falecido) e Neudo Campos (enterrado politicamente), as quais foram devoradas pela dinâmica da política, sem deixar herdeiros. Atualmente, novas famílias chegaram ao poder, mas chama a atenção o movimento do governador Antonio Denarium, que vislumbrou a possibilidade de extrapolar o primeiro-damismo como um projeto de poder.
O projeto de poder familiar consiste em conseguir nomear a primeira-dama Simone Denarium como conselheira do Tribunal de Contas do Estado (TCE), cuja disputa tornou-se a maior queda de braço da política roraimense jamais vista, com desdobramentos impublicáveis. Quem conseguiu avançar em um projeto semelhante de indicar o filho deputado para conselheiro do Tribunal de Contas da União (TCU) foi o senador Mecias de Jesus, que também entrou na briga pela vaga do TCE, desta vez não para indicar um familiar, mas um aliado do grupo que almeja o Governo do Estado.
O caso da família Denarium surpreende, pois a esposa dele nunca quis assumir o papel de protagonista do primeiro-damismo da política brasileira, que é cuidar da política de assistência social da população mais pobre, a partir da qual costuma-se fazer uma escada própria na política partidária, como já ocorreu com as primeiras-damas Marluce Pinto, que chegou a senadora, e Sheridan Oliveira, que alcançou a Câmara Federal mais recentemente.
Simone Denarium nunca quis ficar indo a casa dos pobres para entregar cesta básica e ser abordada nos corredores e na porta de casa por pedidos dos mais diversos. Por isso, ela ficou apenas um mês à frente da Secretaria Estadual do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) e colocou a irmã no comando daquela pasta, que recentemente pôs os pobres na fila do peixe. Ela optou por um cargo não remunerado na Casa Civil onde tinha poderes ilimitados, com sala exclusiva, assessores e tudo.
Como esse cargo cheirava um ato ilegal, a saída foi o marido governador criar uma pasta só para ela, para chamar de sua, que não precisaria se misturar aos pobres: a Secretaria Estadual Extraordinária de Desenvolvimento Humano e Social (SEEDHS). E assim seguiu sua vida pública, fugindo do primeiro-damismo até surgir a disputa pela vaga de conselheiro do TCE, que se tornou um projeto de poder familiar do casal Denarium, sabe-se lá a que custo político, sabendo que no próximo ano haverá eleição municipal e, ainda, o governador tem planos de chegar ao Senado futuramente.
E assim se agem as dinastias locais, cuja vaga de conselheiro do TCE extrapolou as cercanias da Assembleia Legislativa (que é dona da indicação para a vaga) e do Palácio Senador Hélio Campos. Grandes empresários aliados do governo entraram na briga. E provavelmente o governador consiga executar seu projeto familiar, colocando a esposa em um cargo vitalício, pois o seu adversário mais forte é o deputado delegado Jorge Everton, ungido pela oposição e traidores, cujo maior feito foi ser conhecido como “xerife” por seus atos, digamos, ortodoxos, o que não agrada seus pares.
Enquanto tudo isso ocorre, a criminalidade amedronta a população, com assassinatos diários, estradas intrafegáveis, pobreza aumentando, saúde capengando, escolas fechadas…
*Colunista
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