Momento para provar que há um governo recém-convertido à política indigenista
Jessé Souza*
Já que o Governo do Estado está tentando acertar seus passos em relação à questão indígena, visando mostrar para a opinião pública que não é contra os povos tradicionais, então chegou a hora de comprovar esta posição na prática. A Comissão do Movimento Indígena, que reúne lideranças de comunidades e organizações indígenas, apresentou ontem uma carta com várias reivindicações ao governo, durante audiência no Palácio Senador Hélio Campos.
As principais cobranças direcionadas ao governo estadual dizem respeito à Educação, um setor que vem apresentando sérios problemas desde administrações passadas, os quais se ampliaram na atual gestão, empecilhos estes que vão da estrutura física das escolas a transporte escolar, além da questão pedagógica e administrativa, cuja mais recente polêmica diz respeito a uma bolsonarista declarada comandando o Departamento de Educação Escolar Indígena.
Como se sabe, o bolsonarismo não tem o menor apreço por tudo que diz respeito aos povos indígenas. Mas não só por isso. Esse importante departamento precisa estar nas mãos de professores indígenas especialistas, os quais vêm construindo uma educação indígena diferenciada e de referência para o país desde a década de 1990, apesar de todas as barreiras impostas pelos seguidos governadores apoiadores do garimpo e contrários aos direitos indígenas.
A construção de uma educação indígena de qualidade tem esbarrado em várias questões, as quais fazem parte da pauta de cobrança das lideranças entregue ao governo: obras de reforma de escolas, garantia de transporte escolar, contratação de mais professores concursados e realização de seletivo emergencial para professor de Língua Materna. E, obviamente, pedem também a nomeação para o Departamento de Educação Indígena de uma profissional indicada pelas lideranças e organizações indígenas.
Tudo o que está na pauta foi decidido na I Assembleia Unificada de Povos Indígenas, realizada em fevereiro no Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol, como os primeiros passos para começar um processo que visa criar um sistema próprio de Educação Escolar Indígena, vinculado ao Ministério dos Povos Indígenas.
O curioso é que o próprio governador Antonio Denarium, que está numa campanha para se mostrar amigo dos povos indígenas, não estava presente para receber a comissão de lideranças e professores indígenas. Mas lá estavam o secretário de Educação, Nonato Mesquita, e chefe da Casa Civil, Flamarion Portela, aos quais foram entregues as reivindicações. O que se espera é que realmente o governo esteja em novos tempos para se alinhar à questão indígena, a qual passa pela Educação.
No entanto, não se trata de uma questão fácil, pois o governo em quatro anos sequer conseguiu dar início a um ano letivo sem os repetidos problemas crônicos, como a falta de professores e de transporte escolar principalmente no interior do Estado e nas comunidades indígenas. No entanto, permitir que os professores indígenas especialistas no assunto possam gerir a educação indígena já será um passo para começar mudar esta realidade.
Sabe-se que muitas escolas indígenas estão há pelo menos 30 anos com suas estruturas físicas esquecidas pelo governo, o que por si só revela como os seguidos governantes tratam essa questão. Mas, com o despertar do atual governo para o tempo de uma nova política indigenista, acatar a pauta do movimento indígena, entregue ontem, já seria uma prova de que realmente há um governo querendo se comprometer com os povos indígenas, e não aquele que só pretende abrir as terras indígenas para o agronegócio e para o garimpo.
*Colunista